Dr. Nuno Correia Advogado

Testamento Vital

05/13/2020

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Testamento Vital

13/05/2020 | Consultório

A problemática do Testamento Vital (“Living Will”) surgiu nos anos 90 do século passado nos EUA quando uma mulher chamada Terri Schiavo sofreu uma paragem cardíaca que lhe impediu a adequada oxigenação do cérebro e consequentemente ficou em estado vegetativo.12 A partir desse facto, travou-se uma batalha jurídica protagonizada, por um lado, pelo marido que pretendia que fosse retirada a sonda que alimentava a sua esposa, e por outro lado a família biológica que queria mantê-la artificialmente viva. Um dos argumentos que o marido de Terri usou em tribunal foi o facto desta, ainda em vida, lhe ter confidenciado que não queria permanecer num estado idêntico aquele em que se encontrava. Finalmente, 15 anos depois terminou as querelas jurídicas que opunham as duas partes, tendo sido proferida a decisão final no sentido de ser autorizada a retirada da referida sonda de alimentação, tendo Terri morrido alguns dias mais tarde. No que ao nosso ordenamento jurídico diz respeito, surgiu em 2012 a lei que cria Regime das Directivas Antecipadas de Vontade (DAV).3 Com esta lei quis o legislador regular as DAV nomeadamente através do Testamento Vital (TV), bem como a nomeação do Procurador de Cuidados de Saúde, criando em simultâneo o respectivo Registo Nacional do Testamento Vital (RENTEV). Com a referida lei, é dada a possibilidade de uma pessoa, de forma consciente, livre e esclarecida, manifestar a sua vontade relativamente aos cuidados de saúde que deseja ou não receber quando se encontrar, por qualquer razão, numa situação em que esteja incapaz de expressar a sua vontade de forma pessoal e autónoma. Destarte, esta nova lei veio trazer um novo paradigma na forma de actuação médica perante um paciente incapaz de dar o seu consentimento informado, uma vez que o profissional de saúde está obrigado a respeitar a vontade e autodeterminação daquele. Contudo, convém desde já esclarecer que as DAV têm limites, nomeadamente não podem ser contrárias à lei ou à ordem pública e o seu cumprimento não pode levar a uma situação que não seja a de morte natural. Assim, as DAV concretizam-se através da outorga do Testamento Vital, documento escrito feito por pessoa capaz e maior de idade. Este documento tem a validade de 5 anos, sendo sucessivamente renovável mediante declaração de confirmação, podendo ainda ser revogável ou modificável a todo o tempo. Para que este documento (TV) tivesse eficácia prática e acessível aos profissionais de saúde, houve necessidade da criação do RENTEV. Este registo centraliza todos os testamentos vitais e é de consulta obrigatória para todos aqueles profissionais antes de qualquer actuação médico-cirúrgica a pessoa inconsciente ou incapaz de dar o seu consentimento informado. Paralelamente, a referida lei também prevê a possibilidade de qualquer pessoa, maior de idade e capaz, nomear um Procurador de Cuidados de Saúde (PCS), atribuindo a este poderes representativos, através de uma procuração, sobre os cuidados de saúde que quer ou não receber quando se encontra incapaz de prestar o respectivo consentimento informado. As decisões do PCS devem ser respeitadas na mesma medida em que as DAV também o são. A procuração também é revogável a todo o momento pelo outorgante e também se extingue por renúncia do procurador. Refira-se ainda que caso o outorgante tenha dúvidas sobre a elaboração das DAV e do TV, o legislador aprovou um modelo que poderá ser utilizado, embora não tenha carácter obrigatório.4 Estamos em crer na boa vontade do legislador em criar estas linhas orientadoras, no entanto parece-nos algo insuficientes. Servirão certamente para um ponto de partida e de reflexão por parte do outorgante mas não poderá este, na nossa óptica, ficar-se apenas pelas situações que constam da mesma por as mesmas serem redutoras, dando a entender um certo facilitismo na outorga de um documento desta importância. A reforçar esta ideia está também presente o facto da mesma não necessitar de qualquer acompanhamento médico, o que leva a que um leigo em matéria de saúde possa não ter a consciência e alcance dos actos médicos que constam da mesma e as suas reais consequências, correndo o risco de se estar a subscrever um documento sem estar devidamente esclarecido.

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