Comidas ricas em Antioxidantes podem aumentar o risco de certos tipos de cancro

31 de Julho 2020

Ficámos espantados por ver até que extensão os microbiomas afetam as mutações no cancro – em alguns casos mudando inteiramente a sua natureza”. Olhando para o futuro, aqueles que estão em alto risco de cancro colorretal podem querer monitorizar a sua flora intestinal mais frequentemente e pensar duas vezes sobre as comidas que digerem, antioxidantes e não só.

É um facto que tem deixado médicos sem explicação: o cancro no intestino delgado é bastante raro, mas o cancro colorretal, um órgão vizinho embora muito mais pequeno, é uma das principais causas de morte por cancro em homens e mulheres. O que é que se passa no cólon, que parece “atrair” o cancro?

Para responder a esta pergunta, o professor Yinon Bem-Neriah do Centro de Investigação Lautenberg para a Imunologia e para o Cancro da Universidade Hebraica de Jerusalém (HU), e a sua equipa liderada pelo Dr. Eliran Kadosh descobriram que as mutações no cancro não são necessariamente prejudiciais. De facto, em certos microambientes como o intestino, estas mutações podem ajudar o corpo a combater o cancro, e não a espalhá-lo. Ainda assim, a microbiota intestinal produz altos níveis de metabolitos, como aqueles encontrados em certas bactérias e alimentos ricos em antioxidantes como o chá preto ou o chocolate quente, que age assim como um ambiente particularmente hospitaleiro para os genes mutados que vão acelerar o crescimento em cancros intestinais.

professor Yinon Bem-Neriah do Centro de Investigação Lautenberg

 

As suas descobertas foram publicadas na Nature Magazine. Bem-Neriah e a sua equipa mantiveram a microbiota intestinal em mente enquanto prestavam mais atenção aos cancros gastrointestinais, e podem ter encontrado a razão pela qual apenas 2% dos cancros criam raízes no intestino delgado, enquanto 98% dos cancros acontecem no cólon. Uma das maiores diferenças entre estes órgãos são os seus níveis de bactérias no intestino: o intestino delgado contém poucas, enquanto o colón alberga um multiplicidade das mesmas. “Os cientistas estão a começar a prestar mais atenção ao papel da microbiota intestinal na nossa saúde: tanto os seus efeitos positivos, neste caso, como o seu papel promiscuo na ajuda à doença”, explicou Bem-Neriah.

Um pouco de contexto. O TP53 é um gene encontrado em todas as células. Ele produz uma proteína chamada p53 que age como a barreira da célula, suprimindo as mutações genéticas na célula. Ainda assim, quando a p53 se danifica ela deixa de proteger a célula. Pelo contrário, ela conduz o cancro e ajuda os tumores na sua expansão e crescimento.
Para testar a sua teoria de que a flora intestinal estaria em jogo, os investigadores introduziram p53 com mutações no intestino. De forma espantosa, o intestino delgado reagiu ao converter a p53 mutada em p53 normal, tornando-a num super supressor, que se tornou melhor a suprimir o crescimento do cancro do que as proteínas saudáveis p53.

Ainda assim, quando mutada a p53 foi introduzida no cólon sem qualquer troca, mas permaneceu fiel à sua natureza de condutor do cancro e promoveu o seu alastramento. “Ficámos rebitados pelo que vimos (…) A bactéria intestinal tinham um efeito Jekyll e Hyde nas proteínas p53 mutadas. No intestino delgado elas mudaram completamente de direção e atacaram as células cancerígenas, enquanto no cólon promoveram o crescimento do cancro”.

Para testar melhor a sua teoria de que a flora intestinal era um fator importante no fato de as p53 mutadas estarem a atuar como bloqueadores do tumor no intestino delgado, os cientistas administraram antibióticos para matar a flora intestinal do cólon. Uma vez que o fizeram, a p53 mutada não foi capaz de seguir o seu efeito promovedor do cancro.
O que está nesta flora que faz o cancro do cólon espalhar-se tão rapidamente? Uma análise mais próxima identificou o culpado: a flora intestinal que produz metabolitos, também conhecida por “antioxidantes”, que são encontrados em grandes concentrações em alimentos como o chá preto, o chocolate quente, frutos secos e bagas.

De forma reveladora, quando os cientistas alimentaram ratos com uma dieta rica em antioxidantes, a sua fauna intestinal acelerou a faceta condutora de cancro da p53. A descoberta é de preocupação particular para os pacientes com um historial familiar de cancro colorretal.

“Falando cientificamente, este é território novo. Ficámos espantados por ver até que extensão os microbiomas afetam as mutações no cancro – em alguns casos mudando inteiramente a sua natureza”, partilhou Bem-Neriah. Olhando para o futuro, aqueles que estão em alto risco de cancro colorretal podem querer monitorizar a sua flora intestinal mais frequentemente e pensar duas vezes sobre as comidas que digerem, antioxidantes e não só.

 

NR/HN/João Daniel Ruas Marques

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