Conferência 71 minutos Pela Saúde marcada pela discórdia e ataques ao Ministério da Saúde

18 de Novembro 2020

Decorreu na manhã desta quarta-feira a conferência 71 minutos Pela Saúde, que fica marcada pelo discurso de António Ferreira e pelos sucessivos ataques e criticas à ação do Ministério da Saúde no combate à pandemia, que se rege por “manuais que já ninguém percebe”.

Entre os ataques mais comuns estão o “caos informativo” criado pelo Ministério da Saúde, a mira à vacina como “a solução milagrosa” e a falta de medidas de quimioprofilaxia. Ficou a faltar o contraponto de Marta Temido, cuja participação na conferência estava pendente de confirmação.

Foi o discurso de António Ferreira, médico internista e professor na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, que serviu de base à discussão. O professor universitário começou por defender que não é “negacionista” no que diz respeito à pandemia de Covid-19 embora discorde das medidas de combate à pandemia tomadas em Portugal e na maioria dos países da Europa, e fez das medidas de quimioprofilaxia a grande bandeira do seu discurso, apoiado pela maioria dos convidados.

“São inúteis”, disse o professor da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto sobre medidas como o uso de máscaras e luvas descartáveis e confinamento e recolher obrigatório.

Segundo o médico, a “redução da afluência aos cuidados de saúde causa o aumento da mortalidade extra-hospitalar. Estes dados reproduzem-se no Reino Unido e nos Estados Unidos”, disse referindo-se a um aumento da mortalidade na ordem dos 6%. “Isto não se resolve fechando a sociedade […]. A cura é pior do que a maleita”.

“Não faz sentido planearmos uma estratégia à espera da vacina. Existem estudos que comprovam que fármacos como a hidroxicloroquina são seguros e têm de ser utilizados no combate à pandemia”, concluiu referindo exemplos como a Índia, onde, segundo o próprio, o fármaco tem sido utilizada para combater a Covid-19.

Manuel Carvalho foi outro dos convidados da conferência. O jornalista e diretor do jornal Público começou por salientar a “divergência” a que o país chegou, “um enorme problema para que a sociedade consiga absorver informação”, e criticou avidamente a estratégia de comunicação da DGS que definiu como “caos informativo”.

“Estamos a chegar a um ponto em que a fadiga nos leva a desconfiar do sistema”, disse o jornalista.

Ana Paula Martins, Bastonária da Ordem dos Farmacêuticos, focou o seu curto tempo de antena nas vacinas em desenvolvimento para combate à Covid-19 e juntou-se ao leque de palestrantes que concorda com António Ferreira, reforçando que “as vacinas não são a solução milagrosa da pandemia”.

A bastonária acusou mesmo as autoridades de saúde de apontarem a vacina como a solução da pandemia, uma medida que classificou como “irresponsável, porque não é equilibrada”. “Uma coisa é termos uma vacina, que é importante, mas é irresponsável e é não insistirmos de forma clara nas medidas que efetivamente são as medidas chave para controlarmos a pandemia e a sua taxa de incidência”, defendeu a bastonária antes de acrescentar que “continuamos a seguir escrupulosamente manuais que já ninguém percebe”.

“Somos maltratados porque temos uma voz diferente e discordante. A ciência não é a preto e branco”, concluiu.

João Almeida Lopes foi outro dos convidados que saudou o discurso de António Ferreira. O presidente da APIFARMA assumiu assinar a petição lançada pelo professor universitário e salienta que “não haver qualquer tipo de profilaxia é não dar esperança às pessoas”.

“O que temos estado a fazer até agora na Europa não está a correr bem”. “Para mim os políticos percebem pouco de medicamentos e por isso não faz sentido descredibilizar Bolsonaro ou Trump [dois dos defensores do uso do fármaco], mas sim olhar para os números”, disse quando perguntado se as iniciativas de ambos os líderes descredibilizavam a aplicação do fármaco no contexto da Covid-19.

O presidente da APIFARMA aproveitou ainda para se debruçar um pouco sobre a ação dos hospitais e dos profissionais de saúde durante o combate à pandemia afirmando que “estamos a deixar pessoas para trás em termos de terapêuticas e rastreios. Temos que encontrar soluções”.

Quanto às afirmações de “excesso de mortalidade” tecidas por António Ferreira, Fernando Araújo, Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de S. João no Porto, rejeitou a sugestão de que os hospitais nacionais tenham entrado num cenário de catástrofe e salientou os dois desafios essenciais da segunda vaga: assistir os doentes não-covid e a gestão dos profissionais de saúde, mais cansados e ausentes devido a infeções por Covid-19. “São duas questões diferentes, o aumento da procura e limitação da resposta”, explicou

“Nalgumas patologias, o pior ainda está para vir”, afirmou Fernando Araújo relativamente aos doentes não-covid que não se têm dirigido aos hospitais.

Já Óscar Gaspar, presidente da APHP, defendeu que nunca houve nenhuma ambiguidade face aos hospitais privados que, desde março, se mostraram totalmente disponíveis a participar no combate à pandemia segundo os termos do Ministério da Saúde. Termos esses que decretaram o afastamento dos hospitais privados da chamada “linha da frente de combate à Covid-19”, pelo que estes se organizaram para dar resposta a outras patologias.

De acordo com Óscar Gaspar, “mais de 600 camas de hospitais privados estão afetas a hospitais públicos, e 86 são para doentes Covid”. A transferência de doentes já começou e cerca de 500 camas estarão já prontas para receber estes doentes transferidos do serviço publico para o privado.

António de Sousa Pereira foi o único que procurou conter o entusiasmo face ao discurso de António Ferreira ao afirmar que “alguns dos dados que o Prof. Ferreira apresentou são passiveis de ser discutidos com argumentos igualmente válidos”.

No discurso de encerramento da conferência, Sousa Pereira defendeu que “a pandemia tem demasiados reflexos em demasiados setores para ser deixada aos epidemiologistas, unicamente”, e que “faz falta um fórum onde os vários intervenientes na saúde possam participar e dar a sua opinião pelas autoridades, algo que não está a acontecer”.

A conferência 71 minutos pela saúde e contou com um representante de vários parceiros do Ministério da Saúde. O objetivo foi ouvir diferentes perspetivas quanto à pandemia vigente de Covid-19.

O nome e a duração do programa – 71 minutos – são uma referência a cada uma das 71 associações de doentes que integram a Convenção Nacional da Saúde.

Na reunião estiveram presentes António Ferreira, Médico Internista no Centro Hospitalar de São João, Porto, e Professor na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, Miguel Guimarães, Bastonário da Ordem dos Médicos e Chairman da Convenção Nacional da Saúde, Ana Paula Martins, Bastonária da Ordem dos Farmacêuticos, Francisco Miranda Rodrigues, Bastonário da Ordem dos Psicólogos, Miguel Pavão, Bastonário da Ordem dos Médicos Dentistas, João Almeida Lopes, Presidente da APIFARMA – Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica e Presidente do Conselho Estratégico Nacional da Saúde da CIP, Fernando Araújo, Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de São João no Porto, Óscar Gaspar, Presidente da Associação Portuguesa de Hospitalização Privada (APHP), Germano de Sousa, Médico Patologista Clínico e Administrador e Fundador do Grupo Germano de Sousa, Manuel Carvalho, Jornalista e Diretor do jornal Público, Ana Sampaio, Presidente da APDI – Associação Portuguesa da Doença Inflamatório do Intestino e António de Sousa Pereira, Reitor da Universidade do Porto e Presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas.

Eurico Castro Alves, o Presidente da Comissão Organizadora da Convenção Nacional da Saúde, e a ministra da Saúde Marta Temido estavam no programa, mas acabaram por não comparecer.

HN/João Ruas Marques

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