Entrevista ao Dr. Eugénio Vicente sobre o da Vinci Xi: “Os doentes estão cada vez melhor informados e sabem que a cirurgia robótica não é algo do futuro”

01/04/2021
Parece do futuro, mas a cirurgia robotizada é uma coisa do presente. Controlada por médicos especializados e treinados para o efeito, o da Vinci Xi é a mais avançada ferramenta de cirurgia robotizada

O Dr. Eugénio Vicente, Especialista Clínico da Excelência Robótica, é um deles, a quem foi incutida a missão de monitorizar dezenas destes procedimentos. Para o especialista, o futuro passa pela mesma linha de máquinas operadas por profissionais de saúde, nunca autónomas, mas o presente é cada vez mais promissor com máquinas mais baratas, mais fáceis de utilizar e cada vez mais versáteis. Em Portugal estão instalados três destes sistemas em centros de saúde privados como os hospitais da Luz de Lisboa e Arrábida, bem como duas em unidades públicas, a Fundação Champalimaud e o Hospital Curry Cabral.

HealthNews – O sistema de cirurgia robótica da Vinci é descrito como o mais avançado do mundo. Quais são as caraterísticas que tornam este sistema melhor que os outros, ou pelo menos o favorito da maioria dos médicos?
Dr. Eugénio Vicente – Atualmente, o sistema da Vinci Xi é a plataforma cirúrgica robótica mais avançada que existe. As vantagens que o tornam o favorito para os cirurgiões, em todo o mundo, são principalmente três: a precisão, a visão e a ergonomia.

Precisão, porque todos os movimentos que o cirurgião com assistência robótica efetua com os comandos da Vinci são traduzidos, com precisão milimétrica, no campo cirúrgico, filtrando tremores involuntários. Os instrumentos robóticos da Vinci Endowrist têm a vantagem de ter um punho, tal como a mão humana. Esta articulação possibilita-lhes uma rotação de 540° de movimento, o que lhes permite um enorme alcance de movimentos e de liberdade de ação.

A visão da câmara robótica da Vinci é de alta definição e em 3D, com uma ampliação de até 10 vezes, melhorando a nitidez, sendo, portanto, superior à visão humana, o que permite ao cirurgião melhor visualizar todas as estruturas a trabalhar, o que, em conjugação com a precisão dos instrumentos da Vinci permite uma disseção mais precisa e controlada com maior preservação de tecido saudável do paciente, assim como um maior controlo de quaisquer perdas hemáticas que possam ocorrer decorrentes da disseção.

A ergonomia da consola da Vinci, onde o cirurgião trabalha e executa todos os movimentos, permite-lhe o controlo de todo o sistema robótico assistido da Vinci, com a vantagem de poder trabalhar sentado, confortável, concentrado nos movimentos intraoperatórios e com os instrumentos da Vinci orientados com a sua linha de visão. Garante-lhe, assim, que opera todos os seus pacientes mais comodamente e com menos fadiga. Naturalmente que todas estas vantagens e benefícios para o cirurgião e equipa cirúrgica se traduzem em benefícios para os doentes.

HN – Cirurgia robótica parece algo do futuro, mas é algo bem presente, tendo o primeiro robot sido lançado em 1999. Desde quando é que a da Vinci acompanhou este percurso e como tem contribuído ao longo dos tempos para o avanço e introdução da cirurgia robótica em Portugal?
EV – A cirurgia robótica assistida com o sistema da Vinci da Intuitive- representado em Portugal pela Excelência Robótica – desde o início que se destacou globalmente liderando todo o processo de desenvolvimento e evolução destas plataformas robóticas na área cirúrgica. Todos os avanços, tanto a nível de hardware como de software, têm vindo das mentes criativas do departamento de desenvolvimento da Intuitive em comunicação constante com os próprios cirurgiões, com base nas suas necessidades, opiniões e ideias, tendo sempre como objetivo melhorias que se traduzam em benefícios para os pacientes.

Lançado em 1999 a nível mundial, contando até à data com mais de 5.500 sistemas instalados, o primeiro sistema cirúrgico robótico assistido da Vinci chegou a Portugal em 2010. Neste momento existem cinco sistemas da Vinci ativos, a nível nacional. Três em sistemas de saúde privada- no Hospital da Luz Lisboa, no Hospital da Luz Arrábida e no Hospital CUF Tejo- um na Fundação Champalimaud e um no Hospital Curry Cabral, o primeiro hospital público a dispor de um sistema da Vinci e que completou este novembro, com sucesso, um ano de intervenções cirúrgicas com assistência robótica da Vinci.

 

HN – Precisamente porque parece algo do futuro, existe ainda algum estigma por parte de doentes menos informados quanto à cirurgia robótica, ou os mais simples argumentos são capazes de convencer os doentes mais céticos?
EV – Pelo contrário, os doentes estão cada vez melhor informados e sabem que a cirurgia robótica não é algo do futuro mas sim uma tecnologia do presente. Vivemos hoje numa sociedade altamente competitiva e a população, com acesso a cada vez mais informação, tem conhecimento que os principais centros cirúrgicos mundiais realizam cirurgia roboticamente assistida há 20 anos, com resultados comprovados e publicados em mais de 21.000 artigos científicos. Os doentes conhecem e procuram, por isso, esse nível de excelência.

Quando se enfrentam situações de saúde complexas, qualquer argumento que se reflita em benefício para o doente, por mínimo que seja, é relevante e, nestes casos, estes argumentos de mínimo têm pouco. Falamos, por exemplo, em prostatectomias em que a cirurgia roboticamente assistida da Vinci permite ao cirurgião uma excisão da próstata mais controlada, preservando a continência urinária e potência sexual do doente. Em nefrectomias poderá preservar-se a parte funcional do rim e evitar uma nefrectomia radical.

No caso de lobectomias pulmonares ou segmentectomias permite a disseção mais controlada do pulmão, e na excisão de tumores baixos do reto possibilita maior preservação dos músculos que controlam o esfíncter podendo evitar a realização de um estoma definitivo ao doente. Já em ginecologia disponibiliza maior precisão e controlo em cirurgias de endometriose, ou na realização de linfadenectomia para-aórtica.

Também na cirurgia de cabeça e pescoço, em tumores da base da língua por via transoral, evita o acesso extremamente invasivo, doloroso e moroso de recuperação através da mandíbula.

HN – Se percebi como funciona a cirurgia robótica, o robot não faz tudo sozinho. Até que ponto é crucial a presença humana no processo robotizado, e que skills especiais são necessários para um cirurgião que faça parte destes processos?
EV – Exato, o sistema robótico da Vinci não é um sistema autómato. Necessita sempre do controlo do cirurgião na consola e essa presença é crucial e continuará a sê-lo. Não existem skills particulares necessários para que um cirurgião se possa tornar um cirurgião robótico. Como em toda a sua prática médica, necessita dos conhecimentos clínico-cirúrgicos e de dedicação.

Na formação, a maior vantagem dos sistemas cirúrgicos robóticos da Vinci, quando comparados com outras técnicas, é apresentarem uma curva de aprendizagem francamente menor. A adaptação ao sistema é bastante intuitiva, o que significa que para atingir um patamar de excelência cirúrgica precisará de menos tempo.

O processo de formação é, aliás, uma das nossas prioridades. Neste processo o cirurgião pratica num simulador virtual da Vinci, observa vídeos de cirurgias roboticamente assistidas da Vinci realizadas por cirurgiões experientes, pratica com pinças reais em modelo endotrainer e as primeiras cirurgias são acompanhadas por um proctor, ou seja, um cirurgião tutor de referência em cirurgia robótica da Vinci na especialidade correspondente.

Além do cirurgião, toda a equipa cirúrgica, nomeadamente os enfermeiros, auxiliares de ação médica e serviços de processamento e esterilização de dispositivos médicos, são formados de modo a contribuir para o sucesso do projeto de cirurgia roboticamente assistida da Vinci. Todo este processo é acompanhado por nós, na Excelência Robótica.

HN – Por enquanto a cirurgia robótica é ainda residual face ao número de procedimentos cirúrgicos efetuados em Portugal. Por onde passa o futuro da cirurgia robótica em termos de áreas de cirurgia e qual é a previsão para a proliferação da robótica na cirurgia em Portugal?
EV – 
Falando concretamente da plataforma da Vinci, o futuro passará por abranger cada vez mais procedimentos, não só oncológicos como também benignos nas áreas cirúrgicas onde já está estabelecida – como a urologia, ginecologia, colorretal, obesidade, hérnias da parede abdominal, pulmonar e cabeça e pescoço- tornando a cirurgia cada vez mais verdadeiramente minimamente invasiva e acessível a todos os cirurgiões.

O estigma que ainda existe em relação à cirurgia robótica é a de que tem mais custos, principalmente o investimento inicial na aquisição da plataforma. Esta noção vem de quando esta técnica ainda se estava a iniciar no mercado mundial e não é correta atualmente. De momento, a Excelência Robótica, em parceria com as administrações hospitalares, dispõe de soluções adequadas e eficientes face às suas necessidades e preocupações.

O impacto financeiro e social nos países onde a cirurgia roboticamente assistida da Vinci se encontra estabelecida está bem estudado e documentado, e verifica-se que tem um impacto social positivo e inclusivamente financeiro, que se traduz em menores custos.

As vantagens já mencionadas traduzem-se em benefícios para o doente, nomeadamente: melhor e menor tempo de recuperação pós-operatória, menos dor e um regresso mais rápido à sua vida social e laboral, o que por sua vez se traduz também em benefícios para a sociedade e numa melhor gestão de recursos para o hospital. A redução dos dias de estância hospitalar e da taxa de complicações representam menos custos para o sistema de saúde.

Para um hospital público a adoção do sistema robótico da Vinci permite também a retenção de talentos no que concerne aos cirurgiões e equipas cirúrgicas, em quem se apostou na formação durante anos, e que decidem sair em definitivo para outros hospitais, sejam nacionais ou estrangeiros, onde têm acesso à melhor tecnologia, que lhes permita evoluir e melhor tratar os seus doentes.

Atualmente, para a gestão do capital humano, retenção e captação dos melhores talentos, os hospitais necessitam de estratégias definidas para os motivar e comprometer. Neste contexto, um programa de cirurgia robótica da Vinci pode representar uma vantagem competitiva para esse hospital.

Em Portugal, tanto pelo contato que os cirurgiões mantêm com os seus pares estrangeiros em congressos da especialidade, em que observam as vantagens da cirurgia robótica, como pelos gestores hospitalares que analisam e verificam a gestão de hospitais públicos de outros países e o impacto positivo que daí advém, acredito estar para breve uma mudança de mentalidade que permitirá uma maior presença do sistema robótico cirúrgico da Vinci nos hospitais públicos, em especial em hospitais centrais com responsabilidade de ensino e hospitais que tratam, por natureza, de casos muito complexos como é o exemplo dos IPO.

HN – Podemos esperar um modelo de cirurgia robótica 100% automatizado, ou isso não é algo que esteja nas previsões próximas?
EV – Atualmente, o sistema robótico da Vinci conta com a tecnologia Firefly que, por meio de luz infravermelha e aplicação de uma substância de contraste, permite identificar, através da perfusão sanguínea, tecidos e estruturas críticas com muita precisão. Possui também instrumentos avançados de selagem e sutura, tanto de energia bipolar quanto de sutura mecânica, que ao combinar hardware e software permitem ao cirurgião realizar as etapas fulcrais da cirurgia, não só com enorme precisão como principalmente com maior segurança.

A evolução passará, também, pela realidade aumentada. Esta tecnologia permite a visualização de modelos 3D interativos baseados na imagiologia do doente que se sobreponham em tempo real à imagem cirúrgica, assim como o desenvolvimento de marcadores específicos que permitam a visualização de margens cirúrgicas em diferentes espetros de luz.

Estes avanços estão principalmente focados na cirurgia navegada por imagens assim como em outros recursos técnicos e melhorias de software, para uma cirurgia ainda mais precisa para o cirurgião e cada vez mais segura para o paciente.

Entrevista João Marques/HN

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