Falta de resultados coloca OMS sob forte pressão política

9 de Março 2021

Mais de um ano depois de os primeiros casos de Covid-19 terem sido diagnosticados, a Organização Mundial da Saúde (OMS) não apurou a origem do novo coronavírus e enfrenta pressão política dos Estados Unidos.

Críticos daquela agência da ONU dizem que esta não reagiu com rapidez ou assertividade, durante os estágios iniciais do surto do novo coronavírus em Wuhan, no final de 2019, limitando-se a repetir a narrativa das autoridades chinesas.

Apesar de as evidências de que as autoridades chinesas esconderam a gravidade da crise durante semanas e silenciaram médicos que tentaram alertar para a doença, a OMS elogiou Pequim pela sua resposta rápida.

A organização foi particularmente criticada por uma mensagem difundida através da rede social Twitter, na qual afirmou não haver registo de transmissão do vírus entre seres humanos.

“Investigações preliminares conduzidas pelas autoridades chinesas não encontraram evidências de transmissão entre seres humanos do #coronavirus (2019-nCoV), identificado em #Wuhan, #China”, lê-se.

A mensagem remonta a 14 de janeiro do ano passado, dez dias antes de a China colocar Wuhan sob quarentena e ordenar o confinamento de centenas de milhões de pessoas em todo o país.

No entanto, outros analistas apontaram que a pandemia revelou a falta de mecanismos que permitam à OMS pressionar os Estados.

Elogiar a China, incluindo por ter compartilhado rapidamente o sequenciamento genético do vírus e adotado medidas drásticas de quarentena e confinamento, foi a melhor forma de conseguir que o país cooperasse. Apontar os erros teria antes servido para alienar Pequim, defendem.

A anterior administração dos Estados Unidos, no entanto, acusou a OMS de “má gestão” da pandemia e suspendeu a contribuição do país para o orçamento da organização.

O novo executivo em Washington, agora liderado por Joe Biden, voltou atrás com aquela decisão, mas foi crítico da visita realizada recentemente por especialistas da organização a Wuhan, acusando a China de omitir informações consideradas essenciais para determinar a origem do vírus.

No mês passado, a equipa encarregada de investigar as origens da pandemia passou duas semanas em Wuhan, a cidade chinesa onde foram detetados os primeiros casos, mas não obteve resultados conclusivos ou mesmo pistas.

“A equipa está a trabalhar até sair [da China]. Este é apenas o início do caminho, com muito trabalho a ser feito”, afirmou o britânico Peter Daszak, membro da missão, na rede social Twitter.

Daszak admitiu que a equipa teve de realizar as suas investigações num ambiente de pressão política.

Os especialistas apontaram duas teorias preliminares sobre as origens do vírus: através de um animal que serviu de hospedeiro intermediário para humanos ou através de algum alimento congelado. Esta segunda teoria tem sido defendida pela China repetidamente, nos últimos meses, após a deteção de vestígios do vírus em alguns produtos congelados importados pelo país asiático.

A possibilidade de o vírus ter escapado do Instituto de Virologia de Wuhan, sugerida pela administração do ex-Presidente dos Estados Unidos Donald Trump foi, no entanto, descartada pela missão, que foi formada por especialistas de 10 países, incluindo Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha e Rússia.

Os Estados Unidos manifestaram “grande preocupação” com estes primeiros resultados da investigação e pediram a Pequim para fornecer mais informações.

Em causa está a recusa das autoridades chinesas em fornecer aos investigadores da OMS dados brutos e personalizados sobre os primeiros casos de Covid-19, importantes para determinar como e quando o novo coronavírus começou a alastrar-se na China.

A OMS tinha pedido anteriormente dados sobre os 174 casos de Covid-19 identificados na fase inicial do surto em Wuhan.

Os funcionários e cientistas chineses forneceram os seus próprios resumos e análises dos dados relativos a estes casos. Eles forneceram também dados agregados e análises sobre registos médicos realizados nos meses anteriores à doença ter sido oficialmente diagnosticada, apontando que não encontraram evidências de que o vírus estivesse a circular antes de dezembro.

No entanto, a equipa da OMS não teve permissão para visualizar os dados em bruto desses estudos, o que permitiria que desenvolvessem as suas próprias análises, admitiram alguns membros da equipa, citados pela imprensa internacional.

“A interpretação desses dados torna-se mais limitada”, afirmou o microbiologista australiano, Dominic Dwyer, citado pelo jornal Wall Street Journal.

A recusa das autoridades chinesas em fornecer dados brutos e personalizados sobre os 174 casos iniciais e outros casos suspeitos, como pacientes com pneumonia, detetados nos meses anteriores a dezembro de 2019, levou a discussões entre a equipa da OMS e os seus colegas chineses, disse.

“Por vezes, as emoções estavam ao rubro”, descreveu Thea Fischer, epidemiologista dinamarquesa que participou também na missão da OMS. “Eu sou cientista e confio nos dados. Eu confio em evidências documentadas com base em dados, não confio apenas no que as pessoas me dizem”.

LUSA/HN

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