Alterações climáticas estão a exacerbar as desigualdades em África

14 de Agosto 2021

O climatologista moçambicano Isidine Pinto alertou hoje que as alterações climáticas estão a exacerbar as “grandes desigualdades” em África, mas “existirá sempre alguém que vai dizer que o clima não está a mudar”, como “existem indivíduos que não acreditam em vacinas”.

Izidine Pinto é climatologista e um dos autores do relatório do Painel Intergovernamental das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (IPCC), divulgado na segunda-feira, e que é “uma espécie de último aviso para a humanidade”, uma vez que concluiu que “é indiscutível que as atividades humanas estão a causar mudanças climáticas, tornando eventos climáticos extremos mais frequentes e mais severos”.

Em entrevista à agência Lusa, o investigador na Universidade da Cidade do Cabo, África do Sul, reconheceu que, apesar das evidências científicas explanadas no documento, “existirá sempre alguém que vai dizer que o clima não está a mudar, como atualmente existem indivíduos que não acreditam em vacinas”.

“Perante as evidências científicas e o mais recente relatório do IPCC, não há como negar a participação humana no processo de aquecimento global”, referiu.

E explicou: “A mudança climática já esta a afetar quase todas as regiões do mundo, contribuindo para muitas das mudanças observadas nos eventos extremos do tempo e clima. Alguns destes eventos extremos incluem ondas de calor ou frio, cheias, secas, ciclones tropicais que poderão ser mais frequentes e intensos no futuro, de acordo com o último relatório do IPCC. A mitigação e adaptação a essas mudanças é um grande desafio”.

Izidine Pinto sublinha que, tal como o relatório indicou, “a menos que haja reduções imediatas, rápidas e em grande escala nas emissões de gases de efeito de estufa e o limite do aquecimento a 1.5ºC abaixo dos níveis pré-industriais esses eventos extremos vão continuar e com resultados catastróficos”.

Segundo o climatologista, o continente africano é “um dos mais afetados pelos efeitos das mudanças climáticas, por causa da sua fraca capacidade de adaptação e resposta aos eventos extremos do clima”.

O relatório do IPCC, para o qual Izidine Pinto trabalhou no capítulo sobre “Clima e eventos climáticos extremos num clima em mudança”, indica que as ondas de calor e secas na região da África Austral irão ser mais frequentes e os ciclones tropicais de categoria 4-5 vão aumentar.

“Essas mudanças terão um efeito negativo nos países que geralmente são afetados por estes fenómenos, como é o caso de Moçambique”, país de origem de Izidine Pinto. Com um aumento de temperatura de 2ºC acima dos níveis pré-industriais, as consequências poderão ser mais severas, especialmente no setor agrícola e hídrico por exemplo.

Isso deve-se à “localização geográfica e à capacidade de adaptação de alguns países, influenciada por vários fatores, como o nível de desenvolvimento económico, de educação e a fraca capacidade de prevenção de eventos extremos”.

Izidine Pinto considera que, em matéria climática, ser um país rico ou um país em desenvolvimento faz toda a diferença na resposta a estes fenómenos, “por causa da capacidade de adaptação, prevenção e resposta a eventos extremos nesses países”.

“Os países em África são maioritariamente não desenvolvidos e isso faz com o que a vulnerabilidade às mudanças climáticas seja maior e a capacidade de adaptação baixa, em comparação a países desenvolvidos”, adiantou.

Por outro lado, prosseguiu, “a localização geográfica de alguns países – como por exemplo Moçambique e Madagáscar – faz com estes estejam expostos a ciclones tropicais que são afetados quase todos os anos”.

“O aumento da temperatura e mudanças nos padrões de eventos extremos irá afetar vários setores socioeconómicos sensíveis ao clima, causando assim um abrandamento do desenvolvimento sustentável”.

Para o climatologista, “as alterações climáticas estão também a exacerbar as grandes desigualdades já existentes nos países em África” e por isso recomenda que os governos tomem “medidas urgentes para combater e responder à pressão adicional das alterações climáticas e seus impactos”.

Izidine Pinto identifica “grandes lições” que se podem tirar da pandemia de covid-19, as quais “podem ser usadas no combate e adaptação às mudanças climáticas”.

E justifica: “Após os diagnósticos dos primeiros casos de contaminação pelo vírus, as autoridades competentes dos países adotaram políticas, medidas e protocolos de prevenção. Existem políticas, medidas e protocolos semelhantes, que podem ser implementados para o combate e adaptação às mudanças climáticas”.

“O estímulo financeiro para apoiar no combate e prevenção da pandemia pode ser formulado de modo a abordar, em simultâneo, as alterações climáticas”, defendeu, referindo que “as mudanças climáticas têm um impacto negativo no meio ambiente e na biodiversidade, o que também é um fator que multiplica o risco de pandemias”.

LUSA/HN

0 Comments

Submit a Comment

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

ÚLTIMAS

Joana Bordalo e Sá diz que, com ou sem Direção Executiva, nunca se vai conseguir uma reforma correta sem os recursos humanos

Joana Bordalo e Sá também já reagiu à demissão da DE-SNS: “mostrou ser uma estrutura pouco funcional e bastante pesada”, disse ao HealthNews. Nas ULS, por exemplo, “há uma grande desorganização” que a DE-SNS não ajudou a resolver. Daqui para a frente, com ou sem Direção Executiva, nunca se vai conseguir uma reforma correta sem resolver o problema dos recursos humanos. É a opinião da presidente da FNAM.

Nuno Rodrigues: “O SIM espera que a saída do Professor Fernando Araújo não prejudique o desenvolvimento da reforma estrutural em curso”

Em reação à demissão do diretor-executivo do SNS, Nuno Rodrigues disse hoje ao HealthNews que certamente não foi uma decisão tomada de ânimo leve, que espera que a saída de Fernando Araújo não prejudique o desenvolvimento da reforma estrutural em curso e que o Sindicato Independente dos Médicos estará sempre disponível para o diálogo e para tentar encontrar as melhores soluções.

DE-SNS sai após relatório exigido pela ministra

Fernando Araújo anunciou hoje a demissão da Direção Executiva do SNS e, em comunicado de imprensa, esclareceu que irá ainda assim apresentar o relatório solicitado pela ministra da Saúde, do qual teve conhecimento “por email, na mesma altura que foi divulgado na comunicação social”.

DE-SNS demite-se em grupo (EM ATUALIZAÇÃO)

Fernando Araújo e a equipa por si liderada vão apresentar a demissão à ministra da Saúde, Ana Paula Martins, foi hoje anunciado. A “difícil decisão” permitirá que a nova tutela possa “executar as políticas e as medidas que considere necessárias, com a celeridade exigida”, justificou a Direção Executiva do SNS.

EHSAS Summer University estimula colaboração interprofissional na saúde

 A 1.ª Edição da EHSAS Summer University, com o tema “Shaping Europe’s Healthcare Future – The Workforce of Tomorrow”, decorre entre os dias 28 de julho e 2 de agosto em Braga, na Universidade do Minho. O programa educacional conta já com confirmações por parte da Direção-Geral da Saúde, da Direção Executiva do SNS, da Organização Mundial da Saúde e da Agência Europeia de Medicamentos.

Portugal com 20 casos confimados de sarampo

Portugal tem 20 casos confirmados de sarampo, revelou esta terça-feira a diretora-geral da Saúde, Rita Sá Machado, que realçou as “elevadas taxas de cobertura nacionais” na vacinação contra esta doença.

MAIS LIDAS

Share This
Verified by MonsterInsights