Bebés desaparecidos em hospitais e violência contra mães mobilizam associações em Moçambique

13 de Outubro 2021

Leila deu à luz em agosto, mas os hospitais moçambicanos que a assistiram dizem que o bebé morreu, sem nunca lhe entregarem o corpo, e depois de num deles ter sido maltratada, denunciou na terça-feira com associações locais.

O caso serviu para ilustrar, em conferência de imprensa, as queixas de 40 organizações contra vários casos de violência em maternidades do país e suspeitas de tráfico de bebés.

Leila deu entrada no Hospital Provincial da Matola, arredores de Maputo, para ter o seu bebé, mas disse ter sido abandonada por enfermeiras “num quarto com cortinas fechadas e luz apagada”.

“Elas insultaram-me. Chamaram-me porca, apagaram a lâmpada, fecharam a porta, isolaram-me. Depois de um tempo comecei a sangrar e pensei que era o bebé a nascer, então peguei num ferro e bati na maca, pedindo socorro porque já não conseguia falar”, contou na conferência de imprensa.

Leila foi sedada e acordou noutra unidade, no Hospital Central de Maputo, o maior do país.

Os médicos disseram-lhe que havia perdido o bebé no Hospital Provincial da Matola, mas o corpo nunca foi entregue à família.

“Segundo os médicos, no dia em que dei entrada, não houve nenhum óbito”, sublinhou.

“Eles não me querem entregar o bebé, até hoje”, lamentou Leila, ao terminar a declaração num pranto e ser retirada da sala.

O caso de Leila corre na justiça, assim como outros três, de um total de sete, registados no Hospital Provincial da Matola entre março e julho deste ano, relacionados com violência psicológica, física e cobranças ilícitas, relataram as associações.

A Lusa tentou obter reações do Hospital Central de Maputo e do Hospital Provincial da Matola, mas as tentativas de contacto foram infrutíferas.

As 40 associações moçambicanas denunciaram casos de violência pré-natal, no parto e pós-parto em unidades hospitalares no país, apelando para uma investigação e responsabilização dos profissionais de saúde envolvidos.

“Nós como organizações e movimentos de mulheres estamos a denunciar esta situação de violência que continua a chegar até nós”, disse Quitéria Guirrengane, presidente da rede de associações Mulheres Jovens Líderes.

Só em Maputo foram apresentadas às organizações 15 denúncias de maus-tratos e abusos, no último trimestre, “protagonizados por profissionais de saúde contra gestantes, parturientes e puérperas”, além de alguns casos, não contabilizados, de desaparecimento de bebés nos hospitais.

As organizações pedem uma “investigação e instauração de processos disciplinares e criminais” contra os infratores e uma “investigação profunda a uma potencial rede de tráfico de bebés” nas unidades hospitalares.

Exigimos a “responsabilização exemplar dos profissionais de saúde envolvidos e a provisão de assistência e indemnização para as vítimas”, referiu Camila Fanheiro, do movimento Saber Nascer.

Depois de “anos tenebrosos de denúncias e suspeição” acerca de “mortes materno-infantis por negligência e de tráfico de crianças nas maternidades”, as associações recusam-se a aceitar que as entidades que têm o dever de proteção “permaneçam no silêncio”, sublinhou.

De acordo com o último censo populacional, o rácio de mortes maternas é de 452 por 100.000 nados vivos, o que continua a colocar Moçambique entre os países onde as mulheres têm elevado risco de morte durante a gravidez, parto e período pós-parto.

LUSA/HN

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