São cada vez mais frequentes as notícias que retratam a crise que se vive nos serviços de urgência hospitalares. Tornou-se num assunto noticioso muito atual.
Mas esta não é uma realidade apenas de Portugal. Outros países sentem ou sentiram esta pressão e procuraram soluções para, por um lado, encontrarem respostas noutras tipologias de cuidados de saúde (cuidados de saúde primários) para reduzir a procura indevida e desnecessária do Serviço de Urgência hospitalar(SU) e, por outro, garantirem que as pessoas que se dirigem ao SU possam ter uma assistência oportuna e com a adequada e a necessária qualidade.
E o que fizeram a Austrália, Canadá, Estados Unidos, Inglaterra, entre outros países?
Desde há muitos anos (alguns países já têm esta prática implementada há mais de 20 anos) passaram a integrar fisioterapeutas nas equipas de urgência. Sim, fisioterapeutas! E porquê?
A fisioterapia nas equipas de urgência hospitalar
Cerca de 25% da procura dos SU reporta-se a queixas musculosqueléticas , manifestando-se por dor e/ou dificuldade de mover partes do corpo devido a problemas musculares, articulares e/ou ósseos. Uma parte significativa envolve dores nas costas (região lombar e região cervical).
Interessante notar que, segundo Childs e col. (2005) , na gestão das condições musculosqueléticas, os fisioterapeutas especializados nesta área são profissionais com um muito bom desempenho nos testes de conhecimento, apenas ultrapassados pelos médicos ortopedistas, apresentando resultados superiores aos fisioterapeutas não especialistas nesta área, aos estudantes de licenciatura em fisioterapia, aos estudantes de fisioterapia de nível de mestrado, e, todos estes, com resultados superiores às restantes categorias de médicos e médicos de outras especialidades.
A investigação nesta área demonstra que a integração de fisioterapeutas naqueles serviços, seja como primeiro contacto (triagem), seja como segundo contacto (intervenção por referenciação), fez melhorar o desempenho daqueles serviços, com redução de tempo de espera para atendimento, redução de visitas repetidas ao SU, melhoria das queixas, melhor acompanhamento, maior satisfação dos doentes e redução de custos de serviço, libertando os recursos médicos para o atendimento de outras queixas urgentes.
Impacto nos custos de saúde
– Estudos demonstram que os serviços de fisioterapia no SU dirigidos ao atendimento de pessoas com lesões musculosqueléticas traduzem-se em resultados clinicamente equivalentes, quando comparados aos médicos, por um custo equivalente ou inferior , .
– O acesso a fisioterapeutas no SU traduz-se numa intervenção mais atempada e diminui o uso futuro de serviços de saúde.
– Um plano de alta adequado implementado pelo fisioterapeuta do SU, facilitando o acesso a outros serviços de saúde e a gestão eficaz da condição que motivou a ida à urgência, reduz a taxa de retorno ao Serviço de Urgência .
Soluções também a montante?
Como se pode verificar, uma parte relevante da solução reside na gestão dos próprios Serviços de Urgência.
Mas existe uma solução a montante que necessita ser implementada.
Vários estudos referem o elevado número de urgências desnecessárias e identificam como fator importante para esta realidade a resposta insuficiente nos cuidados de saúde primários – a pessoa não encontra a resposta adequada para a sua condição e, não vendo melhoria, recorre à urgência…
Aqui, de novo, a utilização do fisioterapeuta na gestão de muitas condições de saúde que afetam a mobilidade e a funcionalidade humana é fundamental. Uma proporção importante da utilização dos cuidados de saúde primários está relacionada com as condições crónicas de saúde e a sua agudização. Dois grupos importantes de condições contribuem para uma elevada carga total de doença: as lombalgias (dores nas costas) e as cervicalgias (dores no pescoço). Estas e outras condições que se acumulam no conjunto das condições crónicas carecem de intervenção de fisioterapia e é necessário dotar os Cuidados de Saúde Primários de recursos de fisioterapia, de modo a tornar o sistema de saúde mais sustentável e melhorar os indicadores de saúde do país.
Estando o Estado português a investir tanto na formação de fisioterapeutas de qualidade e vendo muitos destes profissionais partirem para outros países que os acolhem facilmente, porque não implementa uma política de recursos humanos mais eficiente, visando ganhos em saúde e promovendo a sustentabilidade do SNS?
Ficariam a ganhar os portugueses, ficaria a ganhar o SNS e ficariam a ganhar todos os profissionais de saúde com a mobilização destas sinergias.
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