Financiamento é fundamental para combater pandemias e quem não cumpre deve ser penalizado

14 de Dezembro 2021

Vários especialistas mundiais em respostas de emergência consideraram esta terça-feira o financiamento determinante para combater pandemias, tendo um responsável da Aliança Global de Vacinas (GAVI) defendido que os orçamentos nacionais devem custear os programas e os Estados incumpridores ser penalizados.

John-Arne Røttingen, Embaixador para a Saúde Global no Ministério dos Negócios Estrangeiros norueguês e um dos elementos da Aliança Global de Vacinas e Imunização (GAVI), falava durante o fórum virtual de aprendizagem da Fundação Bill & Melinda Gates “Preparados para Responder: Lições da covid-19 para a próxima Emergência de Saúde”.

Este fórum decorre em paralelo com a primeira Conferência Internacional sobre Saúde Pública em África (CPHIA, sigla em inglês para Conference of Public Health in África), que começa hoje e decorre até quinta-feira.

Røttingen, que está envolvido na preparação de um projeto mundial para responder a pandemias, começou por lamentar que, atualmente, não exista um mecanismo que obrigue os países a cumprir com todos os compromissos que assumirem, nomeadamente ao nível do financiamento de organizações como a Organização Mundial da Saúde (OMS), que trabalha na resposta a emergências, como pandemias.

“Estão a decorrer discussões sobre a tutela da OMS, nomeadamente à possibilidade de se criar um novo acordo que esteja ligado à constituição da OMS e de como é que se pode assegurar que os países cumpram com as suas obrigações”, afirmou.

Defendeu ainda “incentivos e maneiras de punir os países que não cumpram as suas obrigações”, sublinhando a importância de os Estados partilharem também “informações, amostras biológicas e dados de sequenciação genómica”, para que “todos os países possam tirar partido das tecnologias desenvolvidas e todos possam partilhar e beneficiar dos mecanismos de partilha”.

Nesse novo acordo que está a ser discutido, prosseguiu, o mecanismo de financiamento terá de ficar definido, mas nessa área John-Arne Røttingen reconheceu que está “cético”, posicionando-se a favor do cofinanciamento por parte dos Estados através da sua integração nos orçamentos nacionais.

“É preciso aumentar o investimento a nível interno e o apoio internacional. É necessário o envolvimento total da sociedade, uma preparação pela parte de todos face a pandemias futuras – comunidades, sociedade civil – para que possamos impedir doenças que já existem e outras desconhecidas”, referiu.

E acrescentou: “É preciso tratar os doentes. O grande desafio que enfrentamos no domínio de preparação é evitar o que não conhecemos. É preciso mobilizarmo-nos para enfrentar o desconhecido, o que passa despercebido”.

Diane Stewart, do Fundo Global de luta contra a sida, tuberculose e malária, recordou que esta mecanismo cumpre agora 20 anos, percorridos com muitas lutas, mas também muitos ganhos, e que foi criado numa altura em que a grande emergência era outro vírus: o Vírus da Imunodeficiência Humana (VIH).

“Na altura em que foi criado, não antecipávamos que, passados 20 anos, estaríamos numa pandemia sem precedentes”, disse, referindo-se à Covid-19.

Para Diane Stewart, o financiamento da luta contra o VIH fez, e continua a fazer, toda a diferença, nomeadamente entre a vida e a morte.

Alguns dos progressos alcançados pelo Fundo Global regrediram devido à pandemia de Covid-19, mas respondeu com algumas adaptações que permitiram a recuperação de alguns ganhos.

A especialista disse que, devido à pandemia, os testes ao VIH diminuíram 22% e o acesso aos serviços de tuberculose 11%. Por seu lado, os testes à tuberculose multirresistente baixaram 18%, o que “é uma pena de morte”, afirmou.

“As reduções dos acessos aos serviços de prevenção foram significativas, o que entendemos no âmbito do desvio da atenção para a realização dos testes de diagnóstico à covid-19”, referiu.

Segundo Diane Stewart, a resposta do Fundo passou por aumentar a intensidade dos programas em curso, como os que estão no terreno contra a malária, aumentando em 70% a distribuição dos antipalúdicos e das redes mosquiteiras.

“Aumentámos os nossos programas e tentámos que as pessoas continuassem as suas vidas e os tratamentos. Algumas ações foram mudadas e adicionámos mais quatro milhões de dólares para inovações rápidas, como a distribuição de fármacos e terapêuticas para vários meses”, disse.

Nas zonas com maior incidência de tuberculose, o Fundo prestou apoio para que o teste ao VIH e à tuberculose fosse feito em simultâneo com o da Covid-19.

Uma estratégia que o Fundo quer continuar a aplicar e a ampliar – a realização de testes a múltiplos patogénicos.

Marie-Ange Saraka-Yao, diretora-geral de Mobilização de Recursos, Parcerias do Setor Privado e Finanças Inovadoras da GAVI, referiu-se neste fórum virtual à distribuição de vacinas contra a Covid-19 como “a maior operação de distribuição da história”.

Contudo, reconheceu que “é preciso triplicar os investimentos. É preciso reforçar a resposta. A crise atual demonstrou que os financiamentos funcionam”.

A pandemia mostrou “um novo pensamento – África deve reforçar as suas capacidades e criar capacidades de produção de vacinas, suplementos médicos e fármacos”, disse.

“Existem 1,2 mil milhões de pessoas em África e apenas 1% das vacinas é que são produzidas em África. A grande novidade para o setor privado é que essa transformação pode ocorrer e já está a ocorrer”, acrescentou Marie-Ange Saraka-Yao.

E exemplificou com a vacina da febre-amarela, que já é produzida no Senegal.

Também a meningite A é atualmente produzida de uma forma adequada à realidade e circunstância africana, com a possibilidade de ficar fora da cadeia de frio durante 14 dias.

“Infelizmente, tivemos de chegar a este ponto para que todos percebessem que a saúde é um bem público e é um bem de todos”, lamentou.

LUSA/HN

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