Crise no Sudão obriga crianças a trabalhar longas horas e a saltar refeições

22 de Dezembro 2021

A organização Save the Children alertou esta quarta-feira que a crise económica e humanitária no Sudão está a obrigar as crianças a trabalhar longas horas e saltar refeições, tendo elevado em 50 mil o número de crianças com malnutrição.

Em comunicado, a organização não-governamental com sede em Londres relata o caso de Montaser, um rapaz de 14 anos que vende doces no mercado em Cartum todas as tardes, às vezes até às 22:00, para ajudar a sustentar a família.

Tudo o que o rapaz ganha, normalmente o equivalente a dois ou três euros, entrega à sua mãe, Ihasan, para contribuir para alimentar a família.

“Todos os dias depois da escola vou para o mercado vender doces. Sinto-me muito cansado. Venho para casa às 22:00 depois do trabalho. A minha mãe tem de me acordar de manhã. Não tenho tempo para mais nada além do trabalho e da escola. Nunca brinco”, disse Montaser, citado no comunicado.

Segundo a Save the Children, a situação de Montaser é apenas um exemplo das dificuldades que enfrentam as crianças no Sudão, onde as tensões políticas e económicas fizeram aumentar os níveis de fome.

Números do Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA) revelam que o número de crianças que sofrem de malnutrição severa aguda aumentou de 522 mil em 2020 para 570 em 2021, um aumento de quase 10 por cento.

Montaser e a família – a mãe Ihasan, o irmão Moayad, 12 anos, as irmãs Arig, 6 anos, e Ibtihaj, 25 anos, e os três filhos de Ibtihaj vivem na capital do Sudão desde que se mudaram há 23 anos em busca de melhor qualidade de vida e acesso à saúde.

As suas vidas complicaram-se após a morte do pai de Montaser há sete anos e desde o início da crise financeira que elevou a inflação para os níveis mais altos do mundo.

Parceiros humanitários da ONU estimam que cerca de 14,3 milhões de pessoas (um terço da população) precisem de assistência humanitária em 2022 – o maior número numa década, e um aumento de 800.000 pessoas face a 2021.

Ihasan, 42, e a filha Ibtihaj tentam apanhar todos os trabalhos ocasionais que conseguem, mas muitas vezes só conseguem dinheiro para uma refeição por dia e não se podem dar ao luxo de outras coisas essenciais como fazer reparações na casa, comprar roupa ou material para a escola.

Montaser e o seu irmão Moayad recebem refeições na escola como parte de um programa da Save the Children apoiado pelo Programa Alimentar Mundial (PAM).

“No próximo ano, quase 10 milhões de pessoas no Sudão enfrentarão uma luta diária para terem comida suficiente, entre eles mais de cinco milhões de crianças”, alertou o diretor da Save the Children no país, Arshad Malik, citado no comunicado.

“A situação é crítica. Famílias como a de Montaser precisam de mais e melhores programas de proteção social para terem comida na mesa, educação de qualidade e empregos seguros e gratificantes para os pais”, apelou o responsável, que apelou ao Governo sudanês para que forneça mais programas de proteção e à comunidade internacional para que apoie financeiramente estes programas.

Segundo o comunicado, a Save the Children tem estado a trabalhar em parceria com o PAM e o Governo do Sudão para fornecer refeições escolares às crianças em todo o país.

Estes programas têm um papel crucial no desenvolvimento das futuras gerações e na redução das disparidades, ao facilitar o acesso à educação, e na recuperação pós-pandemia.

LUSA/HN

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