Impacto das notícias da guerra aumenta perturbações psiquiátricas, ansiedade e depressão

19 de Março 2022

O presidente eleito da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental (SPPSM) alertou hoje que o impacto das noticias sobre a guerra na Ucrânia na saúde mental dos portugueses já se está a sentir na prática clínica.

“Ainda não há dados concretos, mas estamos a observar na prática clínica uma repercussão a esta exposição, nomeadamente nas questões relacionadas com a ansiedade e é importante, dentro da nossa comunidade, amizades e seio familiar, estar atento ao impacto nas pessoas”, disse à Lusa João Bessa.

O especialista lembrou que estudos feitos durante os dois anos da pandemia, que trouxe igualmente um elevado grau de exposição a notícias negativas, sensação de risco e incerteza na população mostraram o efeito negativo na saúde mental.

“Estudo nacionais e internacionais mostraram um aumento prevalência de perturbações psiquiátricas, ansiedade e depressão”, disse o responsável, acrescentando: “o facto de se estar agora a reviver uma situação de risco, agora relacionada com um conflito como esta guerra, vem trazer novamente essa carga e isso preocupa-nos”.

Esta situação “preocupa-nos e é importante tomar medidas para ajudar a população e para ajudar uma previsível vaga de refugiados que já começaram a chegar ao país e que vão precisar também de respostas concretas no apoio a sua saúde mental”, disse.

João Bessa destacou a necessidade de medidas a três níveis: as estratégias de comunicação usadas pelas autoridades para informar a população sobre o que está a acontecer, a necessidade de recomendações – à semelhança do que aconteceu com a pandemia – das autoridades de saúde sobre o tempo que cada pessoa passa a ver noticias e a importância de as pessoas manterem as suas rotinas diárias os seus objetivos e os seus desejos.

Defendeu também ser essencial que as autoridades passem a perceção de que está a haver uma gestão de risco e de contextualizarem a comunicação à população.

“Devem alertar, mas não devem induzir a um receio relativamente ao que se está a passar. É preciso saber falar do risco no contexto e no momento certo para não induzir a imprevisibilidade sentida por todos, que é o mais difícil de gerir”, afirmou.

João Bessa considerou ainda que autoridades como a Direção-Geral da Saúde e as Administrações Regionais de Saúde “têm um papel importante na comunicação de algumas normas e recomendações”, dando o exemplo dos conselhos sobre como as pessoas se devem atualizar em termos informativos.

“O conflito não deve interferir com as rotinas diárias (…). Tal como aconteceu na pandemia, não se trata só da gravidade da informação que vimos, mas da frequência com que vimos”, afirmou.

O presidente eleito da SPPSM disse ainda que cada pessoa pode adotar estratégias de defesa como “não suspender as atividades, não abandonar rotinas, objetivos, carga laboral e até a vivência familiar em função do que se está a viver”.

As estratégias a adotar, segundo o responsável, passam também por uma “vigilância acrescida” em relação a estas questões e uma maior atenção ao outro.

“O que está a ser vivido pode induzir sofrimento psíquico que, se perdurar no tempo e trouxer disfuncionalidade à pessoa, deve haver referenciação para cuidados de saúde mental”, alertou ainda.

Sobre o impacto no outro, chamou a atenção, em particular, para o efeito nas crianças e para a importância da forma como se faz a gestão da informação

A este propósito, a Ordem dos Psicólogos publicou no início do mês um manual, dirigido a pais e cuidadores de crianças e jovens, sobre como explicar a guerra aos mais novos.

O especialista chamou ainda a atenção para a necessidade de organizar resposta na área da saúde mental para os refugiados que estão a chegar a Portugal e que incluem muitas crianças: “Este tipo de eventos tem um impacto muito significativo no desenvolvimento pessoal e no aumento da prevalência de perturbações psiquiátricas associadas à exposição precoce a situações traumáticas”.

“Esta vaga de refugiados tem necessidades específicas que devem ser acauteladas pelas equipas que os recebem”, disse o responsável, sublinhando a necessidade de respostas não só ao nível da habitação, alimentação e educação, mas também de cuidados relacionados com o impacto do conflito na saúde mental.

Sobre a onda de solidariedade que se gerou na sociedade civil, considerou que a participação neste tipo de iniciativas pode trazer um grau de satisfação pessoal, por se ajudar diretamente, sublinhando igualmente o facto de a pessoa sentir que é uma parte ativa na resolução do problema.

LUSA/HN

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