O cérebro usa compressão de dados no processo de tomada de decisões

7 de Junho 2022

Geralmente assume-se que o cérebro comprime informações para processar, de forma eficiente, o fluxo contínuo de dados sensoriais. Agora os cientistas descobriram que o cérebro também poderá estar a utilizar este processo de compressão para as funções cognitivas, foi divulgado esta segunda-feira.

“A ideia de que o cérebro maximiza o desempenho enquanto minimiza o custo usando a compressão de dados é comummente apresentada em estudos de processamento sensorial. No entanto, nunca foi realmente analisada em funções cognitivas”, disse o autor sénior Joe Paton, diretor do Programa de Neurociência da Champalimaud Research. “Usando uma combinação de técnicas experimentais e computacionais, demonstrámos que esse mesmo princípio se estende a uma gama muito mais ampla de funções, do que anteriormente se pensava.”

Os investigadores do estudo, publicado esta segunda-feira na revista científica Nature Neuroscience, usaram um paradigma de tempo. Em cada experiência, os ratinhos tinham que determinar se dois sons eram emitidos num intervalo maior ou menor do que 1,5 segundos. Os investigadores registaram a atividade dos neurónios dopaminérgicos enquanto os ratinhos realizavam a tarefa.

“É sabido que os neurónios dopaminérgicos desempenham um papel fundamental na aprendizagem do valor das ações”, explicou Christian Machens, investigador principal do laboratório de Neurociência Teórica da Fundação Champalimaud, em Portugal. “Então, se o ratinho estima erradamente a duração do intervalo num determinado teste, a atividade desses neurónios produz um ‘erro de previsão’ que vai depois ajudar a melhorar o desempenho em testes futuros.”

Asma Motiwala, a primeira autora do estudo, desenvolveu vários modelos computacionais de aprendizagem por reforço e testou qual seria o melhor para registar não apenas a atividade dos neurónios mas também o comportamento dos animais. Os modelos partilhavam alguns princípios comuns, mas diferiam na forma como representavam as informações que poderiam ser relevantes para a execução da tarefa.

A equipa de investigadores descobriu que apenas os modelos que representavam a tarefa de forma comprimida conseguiam explicar os dados. “O cérebro parece eliminar todas as informações irrelevantes. Curiosamente, parece também descartar algumas informações relevantes, mas não o suficiente para afetar, de forma considerável, a recompensa que o ratinho efetivamente recebe. Ele sabe claramente como ter sucesso neste jogo”, disse Machens.

Curiosamente, o tipo de informação representada não era apenas sobre as variáveis da tarefa em si. Foram também registadas as próprias ações do ratinho. “Trabalhos anteriores concentraram-se nas características do ambiente, independentemente do comportamento do indivíduo. Mas agora descobrimos que apenas representações comprimidas, que dependem das ações do animal, explicam os dados na sua totalidade. De facto, o nosso estudo é o primeiro a mostrar que a forma como as representações do mundo externo são aprendidas, especialmente em circunstâncias mais exigentes como é o caso desta tarefa, podem impactar de maneiras pouco usuais a forma como os animais escolhem agir”, explicou Motiwala.

Segundo os autores, esta descoberta tem amplas implicações para a Neurociência e para a Inteligência Artificial. “Embora o cérebro tenha claramente evoluído para processar informações com eficiência, os algoritmos de IA geralmente resolvem problemas mediante abordagens de ‘força bruta’: utilizando muitos dados e muitos parâmetros. O nosso trabalho fornece um conjunto de princípios com potencial para orientar estudos futuros sobre como as representações internas do mundo podem apoiar o comportamento inteligente no contexto da biologia e da IA”, concluiu Paton.

PR/HN/RA

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