André Martins, Enfermeiro Especialista em Enfermagem Médico-Cirúrgica, mestre em Enfermagem à Pessoa em Situação Crítica e Professor Assistente Convidado da ESEL

Unidades Básicas de Urgência, o Elo Perdido na reforma para o atendimento de urgência em Portugal

04/01/2023

O atendimento em situação de urgência ou emergência, pelas características específicas do contexto, exige uma organização sistemática e hierarquizada de comunicação, transporte e de prestação de cuidados A criação de uma rede de Urgências, no sentido de melhorar a qualidade da assistência urgente e emergente, a acessibilidade, a equidade e a racionalização dos recursos, permitiu uma melhoria na eficiência e na eficácia do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

Até abril de 1974, a prestação de cuidados de saúde em Portugal era sobretudo de índole privada, cabendo ao Estado apenas a assistência aos pobres e só em 1968 foram, pela primeira vez, uniformizados os hospitais e a sua organização sendo que só em 1976 foi expresso na constituição o direito à proteção da saúde, bem como o dever de a defender e promover, efetivado pela criação de um SNS universal, geral e (entretanto revisto) tendencialmente gratuito.

As sucessivas tentativas de reforma do SNS nos últimos 40 anos, têm introduzido mudanças e melhorias nas diferentes áreas de cuidados, contudo os problemas económicos que o país atravessou e atravessa (nomeadamente com 2 resgates financeiros) têm-nas deixado incompletas, não sendo percetível uma estratégia nacional com uma definição clara de prioridades e de alocação de recursos na área da saúde.

Se por um lado as Reformas Hospitalares do final do século 20 procuraram dar resposta ao aumento da população resultante dos processos de descolonização, nos últimos 20 anos verificaram-se, entre outras, 3 reformas da Rede Hospitalar de Urgência e Emergência, sem a devida correlação, na criação de pontos não-hospitalares com recursos humanos e técnicos relevantes que permitam aproximar os cidadãos dos cuidados de saúde urgentes, sem assoberbar os serviços de Urgência Hospitalares.

As dificuldades de implementação de reformas estruturais dos centros de saúde que permitam um plano de saúde preventiva diminuindo assim as necessidades de cuidados de urgência, promoveram assimetrias na equidade de acesso a cuidados médicos, dando origem ao aparecimento de serviços de urgência com diferentes nomenclaturas e orientações amorfas entre si: o Centro de Atendimento Permanente (CAP), o Atendimento Permanente (AP), o Serviço de Atendimento Permanente/Serviço de Urgência (SAP/SU), o Serviço de Atendimento de Situações Urgentes (SASU), o Serviço de Atendimento de Doentes Urgentes (SADU) ou o Centro de Atendimento e Tratamentos Urgentes (CATUS).

Apesar de prevista, no fim da década de 90 do século passado, uma profunda restruturação dos CS e dos seus serviços de atendimento não programado, esta ainda não foi concluída, nem tem prazo previsível.

Desta reforma salienta-se a criação das Unidades Básicas de Urgência, unidades de cariz não-hospitalar, mas articulados com a Rede Hospitalar de Urgência/Emergência (RHUE) que dariam resposta de proximidade a situações de doença aguda, tendo uma área de influência para uma população de 40.000 habitantes, e estariam dotadas nomeadamente de equipamentos de imagiologia simples e patologia química.

Acontece que estas unidades nunca foram criadas, ou as poucas que existem são insuficientes para uma real resposta às necessidades das populações, o que imprime nos cidadãos uma ideia de ineficiência e de atraso no diagnóstico, empurrando-os para a estrutura hospitalar, assoberbando-a.

Mais do que uma nova reforma, e necessário revisitar a legislação e regulamentação existente e implementá-la de forma efetiva (num período temporal exequível), com a devida atualização aos meios tecnológicos entretanto desenvolvidos e permitam uma rentabilização dos recursos económicos do país diminuído a despesa em transportes físicos, e na realização de exames complementares de diagnóstico redundantes e/ou desnecessários.

Não dar ênfase às unidades de urgência não-hospitalar, nomeadamente pela não alocação de meios complementares de diagnóstico, e pela não-interligação digital com a rede hospitalar, confundindo-os com os cuidados de saúde primários não dignifica uns nem valoriza os outros, e fortalece este ciclo de desconfiança no SNS, que em última análise só beneficia um sistema privado de saúde, com todos as implicações que isso tem e terá para as gerações futuras.

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