Investigadores desvendam como canais iónicos “memorizam” e contribuem para a aprendizagem

19 de Maio 2025

Cientistas suecos descobriram como canais iónicos nos neurónios possuem uma “memória molecular” que influencia a formação e manutenção de memórias ao longo da vida, abrindo portas a novos tratamentos para doenças neurológicas.

Investigadores da Universidade de Linköping, na Suécia, revelaram um mecanismo inovador pelo qual canais de cálcio do tipo CaV2.1, presentes nos neurónios cerebrais, são capazes de “lembrar” estímulos eléctricos anteriores, desempenhando um papel fundamental nos processos de aprendizagem e memória. O estudo, publicado na Nature Communications, demonstra que estes canais, localizados nas sinapses – pontos de comunicação entre neurónios –, actuam como verdadeiros guardiões da transmissão neuronal, controlando a libertação de neurotransmissores em resposta a sinais eléctricos.

Quando a actividade eléctrica é prolongada, o número de canais CaV2.1 disponíveis para abrir diminui, reduzindo a libertação de neurotransmissores e enfraquecendo a mensagem recebida pelo neurónio seguinte. Este fenómeno, conhecido como plasticidade sináptica, é essencial para a adaptação do cérebro, permitindo que as ligações entre neurónios se fortaleçam ou enfraqueçam ao longo do tempo, formando assim memórias duradouras.

O estudo identificou que o canal CaV2.1 pode assumir quase 200 conformações diferentes, consoante a intensidade e duração do estímulo eléctrico. Esta complexidade estrutural permite que, após muitos sinais eléctricos, a maioria dos canais entre num “estado de memória”, tornando-se temporariamente indisponíveis para abrir. Esta “memória” molecular, que pode durar apenas alguns segundos em cada molécula, acumula-se e desencadeia alterações duradouras na comunicação neuronal, levando à eliminação de sinapses enfraquecidas e à consolidação de memórias a longo prazo.

Além do impacto na compreensão dos mecanismos da memória, esta descoberta tem implicações clínicas relevantes. Várias variantes do gene CACNA1A, responsável pela produção do canal CaV2.1, estão associadas a doenças neurológicas raras e graves. O mapeamento preciso das regiões do canal envolvidas neste processo de “memória” poderá orientar o desenvolvimento de novos fármacos, mais eficazes e direccionados, para tratar estas patologias.

Este avanço representa um passo crucial na compreensão de como memórias se formam e persistem no cérebro, e abre novas perspectivas para intervenções terapêuticas em doenças neurológicas de base genética.

Referência: A rich conformational palette underlies human CaV2.1-channel availability, Kaiqian Wang, Michelle Nilsson, Marina Angelini, Riccardo Olcese, Fredrik Elinder and Antonios Pantazis, (2025), Nature Communications, published on 23 April 2025, doi: https://doi.org/10.1038/s41467-025-58884-2

NR/HN/AlphaGalileo

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