A investigação, conduzida pela psicóloga Maria de Jesus Candeias no âmbito do seu doutoramento em Psicologia Clínica no ISPA – Instituto Universitário, envolveu 900 jovens da Área Metropolitana de Lisboa, com uma média de idades de 15 anos. O estudo procurou compreender a prevalência dos comportamentos autolesivos e suicidários na adolescência, bem como os fatores que podem contribuir para o seu desenvolvimento e prevenção.
Os resultados indicam que mais de metade dos adolescentes apresenta níveis moderados de ideação suicida, e 18% afirmam pensar diariamente em morrer. Entre os principais fatores de risco identificados estão a ideação suicida, a sintomatologia de perturbação da personalidade borderline, a impulsividade e o contexto familiar.
A investigação destaca ainda que o funcionamento familiar tem um papel decisivo. Famílias marcadas por baixa coesão, rigidez, ausência de afeto e fraca comunicação contribuem para que os jovens se sintam emocionalmente desamparados e desconectados. Tanto a negligência afetiva como o excesso de rigidez dificultam a expressão emocional e o desenvolvimento de estratégias saudáveis para lidar com a dor psíquica.
Os comportamentos autolesivos referidos incluem práticas como cortes, queimaduras, pancadas auto-infligidas, ingestão de substâncias ou exposição intencional ao risco, com ou sem intenção suicida. Estes gestos, explica a investigadora, são frequentemente uma forma de lidar com sofrimento emocional intenso, agravado pela dificuldade em verbalizar o que se sente e pela ausência de apoio.
Segundo o estudo, muitos destes sinais são desvalorizados ou confundidos com a turbulência típica da adolescência, o que leva os próprios jovens a subestimarem a gravidade do seu estado emocional. Esta banalização contribui para o silêncio e o isolamento, perpetuando o sofrimento e agravando os riscos associados.
Maria de Jesus Candeias sublinha que os comportamentos autolesivos têm vindo a aumentar de forma significativa nas últimas duas décadas, acentuando-se no período pós-pandemia. O estudo aponta para uma tendência de agravamento progressivo destes comportamentos, tanto em frequência como em severidade, podendo culminar em tentativas de suicídio ou mesmo em suicídios consumados.
A investigadora alerta para a urgência de desenvolver programas terapêuticos integrados, direcionados especificamente para adolescentes com este tipo de comportamentos, incluindo o apoio à família e a articulação com instituições especializadas. Defende ainda que escolas, famílias e comunidade devem assumir-se como espaços seguros, capazes de reconhecer os sinais de alarme e agir preventivamente.
Apesar da importância atribuída ao papel das escolas, o estudo encontrou dificuldades significativas no acesso a estabelecimentos de ensino durante o trabalho de campo, o que é interpretado como reflexo do estigma persistente em torno da saúde mental na adolescência.
A autora do estudo defende que o silêncio social e institucional não protege os adolescentes — apenas os isola. Neste sentido, apela à melhoria da comunicação dentro das famílias e a uma maior vigilância por parte da comunidade educativa.
O estudo reforça a necessidade de uma resposta integrada e preventiva, assente na promoção do diagnóstico precoce, na disponibilização de apoio psicológico e na construção de redes de suporte emocional efetivas.
Contactos de apoio e prevenção do suicídio:
SOS Voz Amiga 213544545, 912802669, 963524660
Conversa Amiga 808237327, 210027159
SNS 24 Serviço Nacional de Saúde 808242424
lusa/HN
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