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Um estudo internacional liderado pela McMaster University demonstrou que a espironolactona, fármaco comum no tratamento da hipertensão e insuficiência cardíaca, não reduz o risco de morte cardiovascular ou hospitalizações em doentes com insuficiência renal a fazer diálise. Os resultados, publicados a 14 de agosto na revista The Lancet e apresentados no ERA Congress 2025, contrariam expectativas geradas por estudos anteriores de menor dimensão.
A investigação, denominada ACHIEVE, recrutou 2.538 participantes de 143 centros de diálise em 12 países, constituindo o maior ensaio clínico até à data sobre este medicamento na população em diálise. Todos os participantes estavam em tratamento dialítico há pelo menos três meses e tinham mais de 45 anos, ou mais de 18 anos com diabetes.
Michael Walsh, investigador principal do estudo e cientista sénior do Population Health Research Institute (PHRI) — instituto conjunto da McMaster University e Hamilton Health Sciences — explicou a motivação: “Em pessoas com função renal normal, a espironolactona reduz eventos cardiovasculares. Mas os doentes em diálise podem não responder da mesma forma a tratamentos eficazes na população geral. Lançámos o estudo ACHIEVE para determinar a segurança e eficácia da espironolactona na insuficiência renal terminal”.
Os investigadores testaram uma dose diária baixa (25 mg) para bloquear a aldosterona, hormona associada a remodelação cardíaca, fibrose e aumento do risco cardiovascular. “A aldosterona tem um papel nocivo na doença cardíaca, e os seus níveis tendem a ser elevados em doentes em diálise. Daí pensarmos que a espironolactona poderia ajudar”, acrescentou Walsh.
Contudo, o fármaco não só não revelou benefícios cardiovasculares, como aumentou o risco de hipercaliemia grave — elevação perigosa dos níveis de potássio no sangue, que pode causar arritmias cardíacas ou morte. Walsh sublinhou: “Estudos anteriores sugeriam benefícios, mas eram pequenos e com seguimento curto, ao contrário do amplo estudo ACHIEVE”.
O ensaio, iniciado em 2018 e concluído em dezembro de 2024, foi interrompido antecipadamente por “futilidade” após análise de um comité independente, que verificou ausência de benefício clínico significativo. Entre os resultados:
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Morte cardiovascular/hospitalização por insuficiência cardíaca: 258 casos no grupo da espironolactona vs. 276 no grupo placebo (diferença estatisticamente insignificante).
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Hipercaliemia grave: Afetou 6,6% dos doentes sob espironolactona contra 4,5% no placebo. “Isto representa uma preocupação de segurança séria num grupo já vulnerável”, alertou Walsh.
Os dados sugeriram uma possível diferença de género nos resultados (163 homens vs. 201 no placebo; 95 mulheres vs. 75 no placebo), embora sejam necessárias mais investigações para a confirmar.
Globalmente, cerca de 2,5 milhões de pessoas recebem diálise, sendo as doenças cardíacas a principal causa de morte (cerca de 40% dos óbitos). “Esperávamos que a espironolactona fizesse a diferença nestes doentes. Apesar de os resultados não serem os desejados, trazem clareza necessária. Este estudo aproxima-nos de tratamentos eficazes e seguros para quem deles precisa urgentemente”, concluiu Walsh.
Referências: Study title: Spironolactone versus placebo in patients undergoing maintenance dialysis (ACHIEVE): an international, parallelgroup, randomised controlled trial. Authors: Michael Walsh, David Collister, Martin Gallagher, Patrick B Mark, Janak R de Zoysa, Jessica Tyrwhitt, Karthik Tennankore, Gilmar Reis, Denis Xavier,
Wen J Liu, Li Zuo, Amanda Y Wang, Camilo Félix, Laura Sola, Mustafa Arici, Russell Villanueva, Vivekanand Jha, Dalton Précoma,
Christian G Rabbat, Sheik Sulthan Alavudeen, Atiya R Faruqui, Mavel López-Flecher, Lonnie Pyne, Ron Wald, Fei Yuan, Kumar Balasubramanian,
Shun Fu Lee, Alena Kuptsova, Courtney Christou, P J Devereaux, for the ACHIEVE Investigators
NR/HN/AlphaGalileo10



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