Diretor dos Serviços Sociais de Lisboa defende “verdadeira municipalização” da saúde

7 de Setembro 2025

Rui Julião, diretor clínico dos Serviços Sociais de Lisboa, critica o atual modelo de transferência de competências para as autarquias, considerando-o limitado. Defende que a gestão dos profissionais de saúde deve estar nas câmaras municipais.

O diretor clínico dos Serviços Sociais da Câmara Municipal de Lisboa, Rui Julião, apelou a uma “verdadeira municipalização” da saúde, argumentando que o atual quadro legal de transferência de competências para as autarquias é demasiado limitado. Em declarações à agência Lusa, o responsável defendeu que o modelo das clínicas de proximidade da capital pode servir de exemplo para uma “revolução tranquila” no setor.

Rui Julião, que gere as duas clínicas de proximidade de Lisboa num projeto que envolve os serviços sociais e a empresa municipal Gebalis, considerou que o decreto-lei que transfere competências de saúde do Estado central para os municípios “é muito limitativo relativamente às câmaras”. “Põe-nos a tomar conta da frota, dos jardins, dos elevadores, das condições do edifício, mas falta-lhe a essência, que é a gestão das pessoas da saúde”, afirmou.

O objetivo, esclareceu, não passa por “criar mini-serviços nacionais de saúde”, mas antes “dar alguma abertura a que se melhore, quer do ponto de vista do horário, quer do ponto de vista da escolha dos profissionais de saúde”. Julião defendeu que, podendo as clínicas de proximidade resolver 90% das situações, não faz sentido que as pessoas tenham de sobrecarregar o Serviço Nacional de Saúde (SNS), onde o acesso é difícil, sobretudo para quem não tem médico de família. “Sou um adepto desde sempre da municipalização da saúde, porque acho que os municípios são como se fosse um patamar intermédio antes de recorrer aos hospitais centrais”, explicou.

Questionado sobre o alargamento previsto pelo Governo das Unidades de Saúde Familiar (USF) modelo C, geridas por privados ou pelo setor social, a áreas com baixa cobertura, Rui Julião propôs uma alternativa: a realização de “projetos-piloto” com as autarquias. “O modelo C é ir buscar profissionais de saúde que não estejam ligados ao SNS nos últimos três anos, quer médicos, quer enfermeiros, e dar médico de família a quem não tem”, explicou, sublinhando que se se avançasse com as autarquias “todos tinham a ganhar”.

A propósito da clínica da Alta de Lisboa, onde mais de metade dos utentes não tem médico de família, afirmou: “Retira-se carga da urgência e melhora-se a qualidade de vida das pessoas. E este é o nosso grande objetivo”.

Sobre a falta crónica de profissionais no SNS, o diretor clínico contrariou a narrativa habitual: “Contrariamente àquilo que normalmente se ouve, que os médicos e os enfermeiros andam sempre atrás de dinheiro, não é verdade. Aos profissionais de saúde interessa-lhes fundamentalmente um projeto. A seguir ao projeto, as condições para o desenvolvimento desse projeto, porque isso é importante. E, por último, o vencimento”.

Revelou mesmo ter médicos disponíveis para integrar a unidade de saúde, atraídos pelo projeto das clínicas de proximidade, incluindo um que “trabalha no privado”. Para qualquer novo modelo, como o modelo C, defendeu que é crucial escolher autarquias para projetos-piloto e selecionar entidades gestoras com experiência comprovada na área da saúde. “Têm que ser pessoas que sejam detentoras de conhecimento e com experiência na área da saúde”, concluiu.

NR/HN/Lusa

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