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O anúncio do Ministério da Saúde de avançar com convenções para Médicos de Família do setor privado foi recebido com cautela pela Associação Portuguesa de Médicos de Família Independentes (APMF). A organização, que representa estes profissionais no sector privado, lembra que a medida já constava do Plano de Emergência da Saúde como prioritária, mas sofreu um “protelamento” injustificável, dado o tempo que o executivo teve para preparar a legislação.
Num comunicado divulgado esta sexta-feira, a APMF recorda que, numa reunião a 15 de julho com a ministra da Saúde, foram abordados três pontos: a comparticipação pelo SNS de meios de diagnóstico e tratamento (MCDT) prescritos por médicos privados, as convenções (por capitação ou por consulta) e as Unidades de Saúde Familiares (USF) de Modelo C. Sobre estas últimas, a associação é perentória: os concursos para 40 USF Modelo C anunciados sucessivamente nunca chegaram a materializar-se. A justificação apontada prende-se com as condições financeiras oferecidas pela Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), que se revelaram insuficientes “nem para pagar os vencimentos dos profissionais”, levando a que se antevisse concursos desertos – situação que a APMF espera não se repita com as convenções.
A associação defende que o valor de referência para estas convenções não deverá ser inferior ao estabelecido no acordo com o Hospital de Cascais para consultas a 75 mil utentes sem médico de família, celebrado ao abrigo da Resolução do Conselho de Ministros n.º 131/2024, de 30 de setembro. Na apresentação dessa resolução, foi referida uma poupança de 20% face ao custo para o SNS. Contudo, a APMF sublinha a discrepância entre a ambição inicial e a realidade: dos 75 mil utentes previstos, apenas 3.500 foram efectivamente abrangidos.
Este cenário ecoa a promessa eleitoral do primeiro-ministro, Luís Montenegro, de dar “uma resposta de medicina familiar a todos os utentes de Portugal” até final de 2025. No entanto, a APMF salienta que mais de 1,5 milhões de portugueses continuam sem médico de família, muitos há mais de uma década, “completamente abandonados, deixados para trás”. Este abandono, argumenta a associação, traduz-se na falta de acesso a cuidados preventivos, acompanhamento e tratamentos atempados, sobrecarregando as urgências hospitalares com situações de doença já avançada. Um problema que, por acontecer “no anonimato”, parece não constituir uma prioridade governamental.
Perante isto, a APMF considera que a medida mais imediata e eficaz para aliviar o problema, sem custos extra para o Orçamento de Estado, passaria por permitir que os médicos de família privados – mais de mil, segundo a associação – possam requisitar MCDT comparticipados pelo SNS. Esta medida beneficiaria os utentes sem médico no SNS e, paralelamente, abriria vagas no sistema público para quem mais precisa. A associação recorda a evolução histórica que foi a abertura do receituário do SNS aos médicos privados, há 35 anos, e expressa a expectativa de que o governo cumpra agora a promessa, já antiga, de estender essa lógica aos meios de diagnóstico.
No fundo, a APMF questiona a razão pela qual este milhão e meio de portugueses, para além de privados de um médico de família, são ainda “castigados com a perda do seu direito constitucional” de aceder a meios de diagnóstico comparticipados.
PR/HN



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