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O peso das doenças oncológicas em Moçambique traduz-se em números que deixam pouco espaço para ilusões. Por ano, o país regista perto de vinte e seis mil novos diagnósticos de cancro, um fardo que culmina em mais de dezassete mil óbitos. As estatísticas, avançadas pelo secretário permanente do Ministério da Saúde, Ivan Manhiça, pintam um retrato sanitário preocupante, onde a malignidade se tornou a segunda principal causa de morte na faixa etária dos 15 aos 49 anos. Acima dos 50, assume mesmo a dianteira trágica.
Falando na abertura da reunião anual do Programa Nacional do Controlo do Cancro, em Maputo, Manhiça não se limitou aos números frios. Especificou que os cancros com maior incidência são os do colo do útero, da mama, da próstata, o sarcoma de Kaposi, os pediátricos e outros associados ao HIV/Sida. Mas a verdadeira ferida, sugere, está no diagnóstico que chega tarde. “O desconhecimento das manifestações iniciais e a não procura regular dos serviços de saúde para o rastreio do cancro estão entre as causas de diagnóstico tardio da doença, resultando em perda de vidas humanas”, afirmou, num reconhecimento claro de uma batalha que se perde muitas vezes antes de ser travada.
O panorama diferencia-se por género. Nos homens, as principais ameaças com maior letalidade são o sarcoma de Kaposi, seguido pelos cancros da próstata, fígado, linfoma de Hodgkin e esófago. Para as mulheres, o colo do útero e a mama representam os maiores riscos de morte. E as crianças não são poupadas: a oncologia pediátrica regista anualmente cerca de 1.648 novos casos, um número que impõe uma reflexão própria.
Apesar de o país contar já com uma rede de pelo menos 1.700 unidades sanitárias capacitadas para rastreio, o cenário é de contrastes. Há uma expansão reconhecida da rede e um número crescente de profissionais especializados, sem esquecer a adoção de novas técnicas de tratamento. No entanto, o Governo moçambicano admite, sem rodeios, que os obstáculos permanecem sólidos. “Temos plena consciência dos desafios. Persistem desigualdades no acesso ao diagnóstico precoce, lacunas no tratamento em determinadas regiões, e um fardo emocional e económico que pesa sobre milhares de famílias”, detalhou Manhiça, acrescentando ser “nossa responsabilidade transformar estas fragilidades em oportunidades de ação”.
O apelo lançado às autoridades e profissionais de saúde é, por isso, duplo. Por um lado, exige uma aposta firme na disseminação de informação que promova a prevenção. Por outro, implica um fortalecimento concreto da rede de cuidados em todo o território, assegurando que nenhum cidadão fica para trás. O futuro, concluiu o secretário permanente, passará obrigatoriamente pelo investimento em investigação e inovação. “O futuro da luta contra o cancro será cada vez mais determinado pelo conhecimento científico, pela tecnologia e pela capacidade de transformar descobertas em soluções acessíveis”, projetou. Um caminho longo, onde a informação parece ser, para já, a primeira linha de defesa.
NR/HN/Lusa



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