Gaza enfrenta legado macabro sob os escombros

11 de Outubro 2025

Zaher al-Waheidi, responsável pelo registo de mortos em Gaza, afirma que cerca de 7.000 corpos permanecem sob os escombros. O cessar-fogo permitiu o acesso a novas áreas, mas a falta de meios dificulta os resgates

O número de vítimas mortais em Gaza, já avassalador, enfrenta agora uma contabilidade sombria e complexa. De acordo com Zaher al-Waheidi, diretor da unidade do Ministério da Saúde de Gaza responsável pelo registo de óbitos, estima-se que pelo menos 7.000 corpos permaneçam soterrados nos escombros por toda a Faixa. A cifra, avançada à agência EFE, desdobra-se num puzzle de dor: aproximadamente 3.600 são pessoas formalmente dadas como desaparecidas pelas suas famílias.

Mas a tragédia, na sua frieza burocrática, esconde uma camada ainda mais silenciosa. Al-Waheidi indicou existir um número semelhante de mortos que nem sequer constam das listas de desaparecidos. A explicação é um retrato da devastação: a ofensiva israelita terá eliminado famílias inteiras, não restando ninguém para procurar os seus ou reportar o seu paradeiro. Dados do Governo de Gaza referem que mais de 2.700 famílias, num total que excede 8.500 pessoas, foram integralmente apagadas do registo civil.

O cenário no terreno é de uma sobrecarga profunda. Para além da contabilidade dos que estão por debaixo do cimento, as morgues dos hospitais confrontam-se com outro problema: 600 corpos, já recuperados das ruínas e das ruas bombardeadas, aguardam identificação. Um processo que se adivinha lento e, em muitos casos, talvez impossível.

A trégua em vigor desde sexta-feira trouxe um frágil alívio operacional. Com a deslocação das tropas israelitas para posições de retirada, os equipamentos de resgate da Defesa Civil de Gaza conseguiram finalmente aceder a zonas que estavam inacessíveis. Apenas no primeiro dia do cessar-fogo, as equipas recuperaram 99 corpos em várias áreas do território. Trabalham contra o tempo, numa corrida que é também contra a putrefação e a falta de meios.

Contudo, a dimensão do desafio logístico persiste. Muitos cadáveres estão sepultados sob montanhas de destroços que exigiriam maquinaria pesada para serem removidos. Neste momento, explicam os serviços de emergência, não existem recursos para tais operações, adiando a recuperação de um número incerto de vítimas. Esta geografia da destruição, que redefine a paisagem de Gaza, torna-se assim o cemitério improvisado para milhares.

O conflito foi desencadeado pelos ataques de 7 de outubro de 2023, liderados pelo Hamas contra o sul de Israel, que resultaram na morte de cerca de 1.200 pessoas e no sequestro de 251. A ofensiva militar israelita de retaliação, que se seguiu, provocou, de acordo com as autoridades locais controladas pelo Hamas, mais de 67 mil mortos e uma destruição quase total das infraestruturas, criando o palário de destroços onde hoje se procuram os últimos.

NR/HN/Lusa

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