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O Centro de Congressos da Alfândega do Porto transformou-se, durante dois dias, no epicentro de um debate urgente: como é que sociedades pensadas para vidas curtas se preparam para cidadãos que viverão até aos cem anos? O NEXii Longevity Congress 2025, nos dias 8 e 9 de outubro, juntou mais de duas centenas de participantes internacionais sem uma resposta única, mas com uma convicção partilhada – a de que o envelhecimento populacional é mais uma oportunidade económica do que uma ameaça.
“A realização de um congresso científico de alto nível na cidade do Porto representa uma oportunidade ímpar para afirmar a excelência académica e clínica da região”, notou, na sessão de abertura, o Prof. Doutor Pedro Barata, do Centro Hospitalar Universitário. A sua visão projetou o nome da cidade no panorama europeu da inovação, um tema que depois se desdobrou em múltiplos painéis.
A medicina do futuro, segundo o Dr. Shai Efrati, do Centro de Medicina Hiperbárica e Pesquisa de Sagol, não pode esperar que as pessoas adoeçam. “A verdadeira inteligência está em evitar o problema antes que ele surja”, defendeu, criticando a inércia dos sistemas de saúde atuais. A sua intervenção, no painel dedicado à Medicina 4P, sublinhou o potencial da prevenção do declínio cognitivo, um investimento que ainda esbarra em paradigmas antiquados.
Nos domínios da economia, o debate ganhou contornos práticos. César Rafael García Morales, diretor-geral da AVU I.A.P. e especialista em economia prateada do IFC/World Bank, revelou que está a apoiar o governo português na criação de um programa de liderança para a Silver Economy, seguindo um modelo semelhante ao espanhol. “Portugal pode ter um papel central entre os países de língua portuguesa, se conseguir reunir inovação global e aplicá-la estrategicamente”, observou. A força, insistiu, está na colaboração entre governos, empresas e terceiro setor.
George Vradenburg, chairman da Davos Alzheimer’s Collaborative, trouxe uma perspetiva contundente. “Estamos a investir biliões em inteligência artificial, mas esquecemos de investir na nossa inteligência humana. A verdadeira economia do futuro será a economia do cérebro”, afirmou, durante o painel sobre saúde pública, cérebro e saúde mental.
Longe dos holofotes nacionais, a Madeira constrói silenciosamente o que ambiciona ser o primeiro ecossistema de longevidade do país. Ana Clara Silva, diretora regional para as políticas públicas integradas e longevidade do Governo Regional, detalhou os contornos de uma estratégia que cruza saúde, mobilidade, emprego e turismo. “Exigiu inovação, colaboração intersectorial, utilização inteligente de dados públicos e uma governação orientada para resultados”, admitiu, referindo-se aos desafios de erguer este projeto num contexto pós-pandemia.
O embaixador Luis Gallegos, chairperson do congresso, alertou que os sistemas atuais – da segurança social ao desenho das cidades – foram concebidos para uma realidade demográfica que já não existe. “Viver mais é uma conquista da humanidade, mas também um desafio que nos obriga a repensar o sentido da vida em sociedade”, refletiu. Gallegos está a propor um tratado de direitos humanos e envelhecimento, um sinal de que a questão ultrapassa a economia.
O ecossistema de startups mostrou a sua força num painel moderado por Marcos Leal, da KOMPASSIUM. Empresas como a portuguesa Fetalix, a suíça Chōka ou a alemã Epigenycs apresentaram soluções que vão da alimentação à monitorização de saúde com recurso a sensores e inteligência artificial. “O objetivo é torná-las acessíveis a mais pessoas, mais rapidamente. É assim que podemos transformar saúde e longevidade em algo real para todos”, frisou Leal.
Joana Caldeira, CEO e cofundadora da Fetalix, testemunhou o valor prático do evento. “Estar num congresso como o NEXii permitiu-nos apresentar o nosso trabalho a um público focado nesta temática, estabelecer parcerias, captar investimento e abrir novas oportunidades”, disse.
O setor, atualmente avaliado em 7,36 mil milhões de euros e com projeções de ultrapassar os 18,4 mil milhões até 2030, atrai olhares de investidores. O painel sobre investimento estratégico salientou a necessidade de integrar a longevidade biológica, financeira e o impacto social, com apostas em saúde, infraestrutura digital e alimentação regenerativa.
No final, ficou a sensação de que Portugal está a tentar posicionar-se num mapa global. O país, com a sua demografia, aposta na inovação e nas parcerias para transformar o envelhecimento numa alavanca. A próxima edição do congresso está marcada para 2026, novamente no Porto, prometendo aprofundar um diálogo que mal começou.
PR/HN



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