Carcinoma hepatocelular custará 370 milhões e 6.600 vidas em cinco anos

14 de Outubro 2025

Estudo nacional prevê que o carcinoma hepatocelular cause mais de 6.600 mortes até 2027. A carga económica ultrapassará os 370 milhões de euros, com a prevalência da doença a aumentar de forma sustentada, onerando o sistema de saúde.

A sombra do carcinoma hepatocelular vai alongar-se sobre Portugal nos próximos anos, prevê um estudo nacional que traça um retrato austero da doença. As estimativas apontam para que este tipo de cancro do fígado, responsável por nove em cada dez casos de cancro primário do órgão em adultos, seja causa de morte para cerca de 6.600 pessoas no quinquénio que termina em 2027. Uma média de 1.200 óbitos anuais que, no seu somatório trágico, representam a perda de mais de 120 mil anos de vida na população portuguesa.

O trabalho, uma colaboração entre a Associação Portuguesa para o Estudo do Fígado, a Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia e a Exigo Consultores, com apoio da Roche, calcula que o número de pessoas a viver com a doença subirá de 4.151 em 2023 para 4.851 em 2027. Um crescimento que, longe de ser um mero exercício estatístico, se traduz em sofrimento individual e num peso económico avassalador. Os custos totais atribuídos ao carcinoma hepatocelular deverão escalar de aproximadamente 70 milhões de euros para 77 milhões no mesmo período, acumulando uma despesa de 370 milhões de euros.

É um fardo que o sistema de saúde terá de carregar. Quase metade desse montante, 44,3%, está destinado ao tratamento sistémico, enquanto o transplante hepático consome 29,0% dos recursos. Os investigadores admitem, contudo, que estes números poderão estar já desajustados por baixa. A introdução de novas terapias desde 2022, data em que o estudo foi realizado, provavelmente inflacionará a fatura final, tornando-a ainda mais salgada.

Uma das chaves para inverter esta trajetória reside no momento do diagnóstico. A realidade atual é crua: mais de metade dos doentes, precisamente 51,2%, só descobre a doença em fases avançadas. Apenas 29,5% são identificados numa fase inicial, onde as hipóteses de sucesso terapêutico são significativamente maiores. Esta deteção tardia não é um detalhe menor; condensa num único dado um dos maiores fracassos na abordagem à patologia, selando destinos e onerando os cofres do Estado.

Os autores do estudo, ciente das limitações de um modelo hipotético, argumentam que as suas conclusões oferecem uma bússola preciosa para os decisores políticos. Acreditam que uma estratégia que aposte forte na prevenção, no rastreio de populações de risco e no diagnóstico precoce pode mitigar o cenário agora projetado. O caminho, sugerem, passa por identificar e tratar a doença hepática crónica – o solo onde o carcinoma mais frequentemente germina.

As causas para o desenvolvimento deste cancro são um conhecido rol de males contemporâneos. As hepatites B e C mantêm-se como fatores de risco preponderantes, mas o consumo excessivo de álcool, a obesidade, a diabetes e a esteatose hepática não-alcoólica, vulgarmente designada por fígado gordo, ganharam um protagonismo inquietante. Neste outubro, Mês da Consciencialização para o Cancro do Fígado, a mensagem dos especialistas é clara: travar a epidemia silenciosa que corrói o fígado dos portugueses exige uma ação concertada que começa muito antes do aparecimento do tumor.

PR/HN

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