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O Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV) deu o pontapé de saída para um debate alargado que pretende redefinir o seu lugar no xadrez institucional português. A sessão oficial de abertura dos Estados Gerais da Bioética decorreu na Sala do Senado, num ambiente que mesclou a solenidade do hemiciclo com um reconhecido sentido de urgência. Estiveram presentes o Presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco, para além de presidentes e vice-presidentes das comissões parlamentares e deputados de vários quadrantes partidários.
Esta iniciativa, que se estenderá por onze meses e percorrerá o país de norte a sul, é vista como um exercício de introspeção sem paralelo. A presidente do CNECV, Maria do Céu Patrão Neves, não se coibiu de traçar um panorama desafiante. “Ao longo dos últimos 35 anos, o conhecimento científico avançou, derrubando sucessivamente novas fronteiras e acedendo a realidades antes inimagináveis; a inovação tecnológica acelerou vertiginosamente, ultrapassando a ficção científica”, afirmou, sublinhando como as sociedades se tornaram mais heterogéneas e os consensos, mais difíceis de alcançar, ainda que mais prementes. A ideia de fundo é que o Conselho tem de encontrar um novo fôlego para acompanhar este ritmo alucinante.
Perante os deputados, agrupados na sua “dupla condição” de legisladores e representantes dos cidadãos, Patrão Neves desfiou alguns dos valores que têm pautado a intervenção do organismo: a dignidade humana, a justiça social e os direitos humanos numa expressão mais lata. Mas o discurso não se ficou por generalidades. Há uma perceção clara de que o atual modelo pode estar a ficar aquém das necessidades. A necessidade de “uma maior diversidade temática” e de “maior agilidade para os seus pronunciamentos” foi explicitamente assumida como meta deste processo de reflexão, que ambiciona capacitar o CNECV para uma intervenção mais próxima dos vários setores da sociedade.
No fundo, os Estados Gerais, que gozam do Alto Patrocínio da Presidência da República e da Assembleia da República, visam produzir uma proposta concreta de revisão do regime jurídico do Conselho. O caminho desenha-se através de duas vias complementares: uma dinâmica interna, que vai esmiuçar a história e o funcionamento do organismo em diálogo com o poder político, e outra externa, voltada para a sociedade civil, com sessões a decorrer em parceria com instituições locais. É um projeto que, se calhar, espelha a complexidade dos temas que ele próprio se propõe a analisar. O CNECV, criado em 1990, quer agora escrever um novo capítulo na sua história, consciente de que o mundo já não é o mesmo e a ética pública não pode ficar para trás.
PR/HN



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