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HealthNews (HN) – Qual considera ser a principal mais-valia deste Guia Prático de Doenças Respiratórias para os clínicos no seu dia a dia, nomeadamente no que diz respeito ao melhor acompanhamento das pessoas com doenças respiratórias?
A principal mais-valia deste guia é funcionar como uma orientação prática e atualizada para a abordagem das doenças respiratórias mais frequentes, não oncológicas. Oferece indicações claras sobre quando referenciar o doente para a especialidade de Pneumologia e como realizar o seguimento em consulta não especializada. É uma ferramenta útil não só para médicos de Medicina Geral e Familiar, mas também para pneumologistas e outras especialidades relacionadas, como Medicina Interna ou Imunoalergologia, onde a patologia respiratória se cruza frequentemente. A sua disponibilidade em formato digital e impresso garante que está acessível a todos os profissionais, em qualquer lugar e da forma que mais lhes convier.
HN – Como é que a estrutura do Guia, com as suas oito dimensões (definição, diagnóstico, tratamento, etc.), pode efetivamente melhorar a articulação entre os Cuidados de Saúde Primários e a Medicina Hospitalar?
A estrutura organizada em oito dimensões permite uma consulta rápida e eficiente quando surgem dúvidas específicas durante a prática clínica, facilitando a identificação do local onde procurar a informação. Se o profissional desejar uma leitura sequencial de um capítulo, a informação é apresentada de forma lógica e estruturada, promovendo a aprendizagem. Uma melhor informação dos médicos não pneumologistas sobre como investigar, monitorizar e tratar as doenças respiratórias, dentro das suas competências, melhora o atendimento ao doente e a qualidade da informação partilhada no pedido de referenciação para a consulta hospitalar, otimizando todo o processo.
HN – Enquanto pneumologista, que aspetos específicos sobre as diferentes patologias abordadas considera mais relevantes incluir num guia dirigido a médicos de outras especialidades, como Medicina Geral e Familiar?
Para a asma, é crucial incluir o início do tratamento, a monitorização e os critérios de referenciação, bem como o conceito de asma grave e as novas terapêuticas biológicas. Na síndrome de apneia do sono, importa dar a conhecer os critérios de referenciação, os sinais de alerta e como realizar a monitorização e o retorno à consulta hospitalar quando necessário. Nas infeções respiratórias, o guia aborda o tratamento atualizado, condições subjacentes e estratégias de prevenção. Para as doenças pulmonares intersticiais, destaca-se a sua relação com doenças sistémicas e exposições ocupacionais. Relativamente à DPOC, o guia revê o diagnóstico, monitorização, tratamento das exacerbações e a gestão na fase estável. Inclui ainda um capítulo sobre meios complementares de diagnóstico, explicando a sua utilidade e interpretação, outro dedicado à tosse crónica e, por fim, um capítulo sobre comorbilidades, sublinhando a relação bidirecional entre as doenças pulmonares e outras patologias, fechando o círculo da multidisciplinaridade necessária na medicina atual.
HN – De que forma é que a padronização de critérios de referenciação e de retorno, proposta no Guia, pode contribuir para uma gestão mais eficiente e com melhor qualidade para os doentes com patologias respiratórias crónicas?
A padronização contribui para uma gestão mais eficiente em dois aspetos principais. Em primeiro lugar, o médico referenciador tem orientações precisas sobre quando referenciar o doente e que investigação inicial deve realizar, chegando à consulta hospitalar com a informação necessária para justificar o pedido. Em segundo lugar, o médico hospitalar que faz a triagem consegue, com base numa informação mais completa e relevante, decidir com maior precisão sobre a substancialidade da consulta, o enquadramento mais adequado do doente (por exemplo, numa subespecialidade como asma ou DPOC) e atribuir a prioridade correta à referenciação. Isto agiliza todo o circuito do doente.
HN – Como é que a abordagem multidisciplinar do Comité Científico que desenvolveu o Guia se reflete no conteúdo dedicado a patologias respiratórias?
O objetivo dos mentores do guia foi criar uma ferramenta de abordagem prática e descomplicada, sem comprometer o rigor científico e o estado da arte. Um ponto fundamental foi facilitar a referenciação e orientar a gestão das patologias nos Cuidados de Saúde Primários. Para alcançar este equilíbrio, o guia foi escrito em conjunto por médicos da especialidade de Pneumologia e por médicos de Medicina Geral e Familiar, garantindo que responde às necessidades de ambas as partes e promovendo uma visão partilhada e integrada do doente.
HN – Qual é o papel prático de ferramentas como este Guia na monitorização a longo prazo de doentes com doenças respiratórias, assegurando a continuidade de cuidados?
O maior beneficiário desta ferramenta é o doente. Quando o médico sabe o que fazer, o que pedir e quando referenciar, o doente tem maior probabilidade de ser observado na especialidade correta e no tempo adequado. Por outro lado, face a recursos limitados na medicina hospitalar, é fundamental que os doentes estáveis possam ser acompanhados com confiança nos Cuidados de Saúde Primários. O guia fornece as bases para que o médico hospitalar possa referenciar o doente de volta para o seu médico de família com a segurança de que este terá o conhecimento necessário para gerir a patologia de forma consciente. Esta confiança mútua no conhecimento partilhado é tranquilizadora para todos os intervenientes e garante a continuidade de cuidados.
HN – Que impacto espera que esta iniciativa tenha na uniformização de práticas clínicas e na literacia sobre doenças respiratórias em Portugal?
Espera-se que esta iniciativa tenha um impacto muito positivo. A saúde pulmonar é por vezes descurada, normalizando-se sintomas que podem ser atribuídos erroneamente ao envelhecimento, e outros órgãos podem suscitar mais interesse. A saúde deve ser entendida de forma holística. Se o guia tiver a divulgação adequada e suscitar o interesse dos profissionais, estes estarão mais aptos a tratar os seus doentes e a educá-los sobre a importância da saúde respiratória. Ao consultarem o guia perante dúvidas e seguirem as suas orientações, nomeadamente nos critérios de referenciação bidirecional, contribuirão para uma maior uniformização de práticas clínicas. Mesmo que não se atinja uma uniformização total, este guia representa um passo muito importante na direção certa.
Entrevista MMM



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