Crise na AIMA: partidos apontam responsabilidades e falta de recursos

29 de Outubro 2025

Passados dois anos desde a criação da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), os principais partidos portugueses reconhecem que os objetivos da instituição não foram alcançados, atribuindo responsabilidades distintas conforme a orientação política. A AIMA, que resultou da fusão das funções do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) e do Alto-Comissariado das Migrações, herdou cerca de 400 mil processos pendentes, sobretudo relacionados com manifestações de interesse, um mecanismo que permitia a regularização de estrangeiros que entravam em Portugal com visto de turismo.

O deputado social-democrata António Rodrigues lembrou que a criação da AIMA ocorreu num contexto difícil, marcado pela “terrível forma” como o SEF terminou, com uma agonia administrativa e incapacidade para tomar decisões efetivas. Salientou que não existia uma máquina administrativa capaz de lidar com a dimensão do problema, pelo que a agência teve de resolver pendências e “correr atrás do prejuízo”. Apesar de reconhecer a importância da AIMA na vida das pessoas, Rodrigues considerou que a agência tem uma imagem negativa por ter “nascido torta”.

O Chega também admite problemas na AIMA, mas destaca a insuficiência da fiscalização e defende o fortalecimento da vertente de controlo dos imigrantes, propondo a criação de um órgão com poderes de fiscalização migratória. O partido pede ainda a revisão dos critérios de reagrupamento familiar e uma melhor articulação institucional com dotação adequada de meios humanos, tecnológicos e logísticos para a agência.

Do lado do PS, Pedro Delgado Alves afirmou que o Governo nunca conseguiu resolver os problemas herdados, referindo que a AIMA foi penalizada pelo processo acidentado da sua criação, feita no rescaldo da pandemia e com um enorme volume de pendências provenientes do SEF. Acrescentou que medidas recentes do atual Governo tornaram a situação ainda menos gerível, faltando recursos humanos e financeiros para responder adequadamente aos imigrantes. Como exemplo, apontou o surto de pedidos na sequência do fim da prorrogação automática dos documentos de imigrantes regulares.

Rui Rocha, deputado do Iniciativa Liberal, considerou que Portugal viveu “duas bancarrotas”, financeira e migratória, e que a AIMA foi criada com uma herança pesada que não conseguiu reverter. Apontou ainda que o país tem legislações mais restritivas, num contexto de problemas administrativos e judiciais, com mais de 130 mil processos nos tribunais administrativos devido à incapacidade de resposta. Criticou a falência do sistema administrativo da AIMA, que não responde a chamadas, não faz atendimentos e deixa os imigrantes num limbo.

Paulo Muacho, do Livre, destacou que a criação da AIMA tinha um objetivo positivo, ao separar as questões administrativas das criminais, mas que a reforma foi feita sem os meios necessários, humanos ou técnicos. Alertou para as últimas alterações legais, como as leis da nacionalidade e de estrangeiros, que prejudicam o crescimento económico e dificultam o sucesso da AIMA. Salientou que o país tem fechado canais para a imigração legal, mesmo necessitando de mão-de-obra, o que pode levar ao recurso à imigração irregular e ao risco de tráfico de seres humanos.

Por fim, o PCP recordou que foi contra a extinção do SEF e considerou a criação da AIMA um processo atabalhoado e prolongado no tempo, sem assegurar os meios e recursos adequados. O partido afirmou que a criação da agência não melhorou o serviço público, apontando atrasos na regularização dos imigrantes e a inoperância dos serviços, que conduzem à “desumanização total” do serviço público. Criticou ainda a recusa do Governo em adotar soluções para garantir um serviço público de qualidade, eficaz e célere.

Até ao momento, não houve resposta do Governo ou da AIMA para entrevistas solicitadas pela agência Lusa por ocasião do segundo aniversário da instituição

lusa/HN

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