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A longa história da medicina do trabalho é marcada por séculos de evolução, fundada nos seus primórdios e concepções por Aristóteles e Hipócrates, chegando a Bernardino Ramazzini considerado o “pai da medicina do trabalho”, pela publicação em 1700 da sua obra fundamental, “As Doenças dos Trabalhadores”.
Depois com a Revolução Industrial, a medicina do trabalho tornou-se uma necessidade para proteger os trabalhadores das condições perigosas do seu exercício.
Mais tarde, já em 1919 com a criação da Organização Internacional do Trabalho (OIT), percebeu-se a nova centralidade no seu desenvolvimento, orientada para o que hoje dizemos promoção da saúde e segurança dos trabalhadores.
Por outro lado, enquanto a medicina não comportava ou se repartia por especialidades, havia uma natural abordagem holística do ser humano, tendo sempre em vista o “bem” finalístico da cura.
Mas com a complexificação das abordagens e o enriquecimento científico acumulado, a medicina foi-se subdividindo por exigência de campos específicos do conhecimento, associado aos avanços tecnológicos, ensaios clínicos e sua validação, escolas médicas, investigação científica, computação, organismos de regulação e responsabilização judicial em amplo senso.
Criou-se assim o especialista, uma figura sobejamente conhecida e invocada que, contudo, perde a noção do conjunto.
A Medicina do Trabalho, focada no cenário da relação trabalho-saúde, tem-se vindo a afirmar e evoluir enquanto exigência legal no contexto empresarial, no seu conjunto, pese embora o tremendo falhanço do Estado Português que, sendo o fiscalizador desta necessidade no contexto do mercado de emprego, é o primeiro incumpridor face aos seus trabalhadores na Administração Pública.
Como diria alguém, “uma vergonha!”
O facto de, ao médico do trabalho não caber tratar e, em consequência, curar o trabalhador, não o pode desresponsabilizar de acompanhar esse processo e de, na avaliação da capacidade física do trabalhador, propôr, intervir, mediar e negociar a continuação ou não do respectivo percurso profissional.
Mas que não haja dúvida, não existe o objecto finalístico da cura na actuação do médico do trabalho.
Contudo e assim, fica bem sublinhado a importância do profissional médico do trabalho não poder, nem dever, estra afastado ou deixar de conhecer suficientemente bem a realidade da empresa, pública ou privada, para a qual directa ou indirectamente trabalha e é responsável pela emissão das fichas de aptidão dos trabalhadores correspondentes.
Por outras palavras, uma medicina do trabalho exercida em consultório médico, externo e dissociado do cenário de emprego de origem das pessoas avaliadas, serve e apenas, para a realização dos exames clínicos vinculados a contratos de trabalho e legalmente previstos, os designados exames de admissão, periódicos ou ocasionais, estes muitas vezes de feição e carácter pericial.
Talvez por este argumento, em Portugal, muitos dos especialistas em Medicina do Trabelho, tenham outra ou outras especialidades e competências, muitas delas sobretudo vocacionadas para áreas de medicina preventiva.
A mensagem importante é que, o programa de formação da área de especialização de Medicina do Trabalho estabelecido pela Portaria n.º 307/2012, de 8 de outubro, não ignore e cumpra verdadeiramente o que o preâmbulo da mesma enuncia:
– “As crescentes exigências e responsabilidades postas no exercício das atividades médicas e cirúrgicas especializadas, incrementadas pela livre circulação de profissionais na União Europeia, requerem elevados níveis de formação pós-graduada.”
As ciências da saúde, na área dos especialistas em Medicina do Trabalho, também se fundam, reforçam e cruzam na Saúde Pública e Preventiva, bem como em domínios e competências Sociais, Culturais, do Direito, Económicas, do Ambiente, Tecnológicas e Comunicacionais, não tão científicas eventualmente, mas que consolidarão o papel que a Lei lhes atribui e os Cidadãos esperam deles.
Na celebração dos 40 anos da especialidade de Medicina do Trabalho, em 2019, o Prof. António de Sousa Uva escreveu:
– “Esperamos que não sejam precisos outros quarenta anos para que a Medicina do Trabalho seja mais do que uma exigência legal e que o seu conteúdo se sobreponha à sua forma.”
Já passaram mais 6 anos.
E a Medicina do Trabalho, em especial pelo seu Colégio na Ordem dos Médicos, tem de prosseguir, sem tibiezas, o louvável esforço de revitalização, de rejuvenescimento e reivindicação da dignificação e participação activa junto da cidadania portuguesa!


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