Inovação farmacológica: Um composto, três alvos terapêuticos

9 de Outubro 2024

Investigadores do Instituto de Biomedicina da Universidade de Barcelona desenvolveram uma ferramenta farmacológica inovadora capaz de administrar simultaneamente três medicamentos baseados em oligonucleótidos, cada um atuando contra um alvo terapêutico diferente dentro da célula

Legenda da imagem: Da esquerda para a direita, Ariadna Vila-Planas, Marçal Pastor-Anglada, Montserrat Terrazas, Sandra Pérez-Torras e Aida Mata-Ventosa

 

Uma equipa de investigadores do Instituto de Biomedicina da Universidade de Barcelona (IBUB) alcançou um avanço significativo no campo da farmacologia, desenvolvendo uma nova ferramenta capaz de administrar simultaneamente três medicamentos baseados em oligonucleótidos, cada um direcionado a um alvo terapêutico distinto dentro da célula. Este estudo inovador, publicado na prestigiada revista Bioorganic Chemistry, apresenta uma prova de conceito deste composto de triplo direcionamento, que foi aplicado com sucesso em células de cancro da mama.

O estudo foi liderado pela Professora Montserrat Terrazas, do Departamento de Química Inorgânica e Orgânica da Faculdade de Química, e por Sandra Pérez-Torras, docente no Departamento de Bioquímica e Biomedicina Molecular da Faculdade de Biologia e investigadora no Centro de Investigação Biomédica em Rede de Doenças Hepáticas e Digestivas (CIBEREHD) e no Instituto de Investigação Sant Joan de Déu (IRSJD). O Professor Marçal Pastor Anglada também participou no estudo, juntamente com a investigadora pós-doutoral Aida Mata-Ventosa e a investigadora pré-doutoral Ariadna Vila-Planas, como primeiras autoras do artigo científico.

Esta nova abordagem representa uma estratégia promissora contra a resistência aos medicamentos, um desafio significativo no tratamento de doenças complexas como o cancro. As patologias multifatoriais ou complexas, como o cancro, resultam da ação conjunta de múltiplos fatores no organismo, que ativam diferentes vias de sinalização tumoral. Esta multiplicidade de sinais torna as células cancerígenas resistentes a alguns tratamentos, pois quando o medicamento bloqueia a via de sinalização primária, as vias de sinalização secundárias do tumor são ativadas.

Os investigadores explicam que as combinações de fármacos de moléculas pequenas são frequentemente utilizadas para abordar estes problemas, mas muitas das terapias combinadas aprovadas até agora têm várias limitações, como a dificuldade de interagir com proteínas-alvo com conjuntos de ligação mal definidos ou problemas de toxicidade devido à interação entre fármacos de natureza química diferente.

Para enfrentar este desafio, a equipa da UB desenvolveu uma ferramenta farmacológica que administra três medicamentos oligonucleotídeos antisense (ASOs). Estes são cadeias curtas de ácidos nucleicos concebidas para se ligarem a ARN mensageiros específicos, bloqueando assim a função-chave desta molécula na síntese de proteínas nas células.

Este composto de triplo medicamento foi aplicado com sucesso em células de cancro da mama para inibir a expressão de três proteínas específicas (Akt, Hsp27 e HER2), que contribuem para um mau prognóstico do cancro da mama e resistência aos medicamentos. Os resultados do novo estudo mostram que a toxicidade desta terapia inovadora sobre as células cancerígenas é superior à combinação dos três medicamentos do tipo ASO administrados independentemente. Além disso, a especificidade dos alvos escolhidos permite atacar células tumorais com estas alterações sem afetar células não tumorais, acrescentam os investigadores.

A ativação do novo medicamento combinado no interior da célula é mediada pela enzima RNase H, que se encontra naturalmente no citoplasma celular. Esta enzima reconhece a parte central do constructo (um híbrido de ARN e ADN) e cliva o seu componente de ARN, que atua como uma ligação de união entre os três medicamentos. Como resultado, os três ASOs são libertados simultaneamente e podem desempenhar as suas funções inibitórias.

Embora a prova de conceito tenha sido realizada em células de um tipo específico de cancro da mama, os especialistas salientam que esta nova ferramenta poderá ser utilizada no futuro para administrar múltiplas combinações de ASOs que poderiam ser direcionadas para múltiplas combinações de alvos terapêuticos, não apenas para diferentes tipos de cancro, mas também aplicáveis a outras doenças complexas, como a diabetes.

Esta inovação representa um avanço significativo na abordagem terapêutica de doenças complexas, oferecendo uma nova estratégia para superar a resistência aos medicamentos e potencialmente melhorar a eficácia dos tratamentos. A capacidade de direcionar simultaneamente múltiplos alvos terapêuticos com um único composto abre novas possibilidades no desenvolvimento de terapias mais eficazes e personalizadas.

À medida que a investigação nesta área continua a avançar, é provável que vejamos mais desenvolvimentos e aplicações desta tecnologia inovadora, não apenas no campo da oncologia, mas também noutras áreas da medicina onde as doenças complexas representam desafios significativos no tratamento.

Bibliografia:

Mata-Ventosa, Aida; Vila-Planas, Ariadna; Solsona-Pujol, Aina; de la Dueña, Jordi; Torrents, Maria; Izquierdo-García, Eduardo; Pastor-Anglada, Marçal; Pérez-Torras, Sandra; Terrazas, Montserrat. «RNase H-sensitive multifunctional ASO-based constructs as promising tools for the treatment of multifactorial complex pathologies». Bioorganic Chemistry, September, 2024. DOI: 10.1016/j.bioorg.2024.107595.

NR/HN/Alphagalileo

 

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