Cientistas detetam partículas microplásticas em copos de papel

23 de Novembro 2020

A ingestão de bebidas quentes em copos de papel representa riscos para a saúde, de acordo com um estudo do Instituto Indiano de Tecnologia (IIT) em Kharagpur.

“Nos 15 minutos que leva para o café ou chá (quente) ser consumido, a camada microplástica do copo degrada-se e liberta 25.000 partículas do tamanho de 25.000 mícrones na bebida quente”, diz Sudha Goel, autora principal do estudo e professora assistente no Instituto Indiano de Tecnologia (IIT) em Kharagpur.

“Uma pessoa média que bebesse três chávenas normais de chá ou café diariamente, num copo ou chávena de papel, acabaria por ingerir 75.000 minúsculas partículas microplásticas que são invisíveis a olho nu”, acrescenta a investigadora.

Globalmente, cerca de 264 mil milhões de copos de papel foram produzidas em 2019 para consumir alimentos e bebidas tais como chá, café, chocolate, refrigerantes e sopas, de acordo com o Imarc Group, uma empresa internacional de pesquisa de mercado.

De acordo com a Imarc, os consumidores utilizam copos de papel devido a estilos de vida agitados e horários muito preenchidos. A procura é estimulada pela tendência crescente de serviços de takeaway e alimentos prontos a consumir em todo o mundo. Os copos de papel também não requerem limpeza e podem ser facilmente descartados após a sua utilização.

Mas os investigadores do IIT dizem que a conveniência tem um preço. “Os microplásticos atuam como portadores de contaminantes como iões, metais pesados tóxicos como paládio, crómio e cádmio, assim como compostos orgânicos que são hidrofóbicos (repelentes de água) e podem ser transferidos para o reino animal”, explica Sudha Goel. “Quando ingeridos regularmente ao longo do tempo, as implicações para a saúde podem ser graves”.

A equipa de Sudha Goel deitou água ultra-pura (MilliQ) a 85-90 graus Celsius em copos de papel e deixou-a assentar durante 15 minutos antes de a analisar com um microscópio de fluorescência para microplásticos. Os revestimentos plásticos foram examinados separadamente quanto a alterações nas propriedades físicas, químicas e mecânicas.

Os resultados foram assustadores, diz a investigadora. “Conseguimos confirmar a libertação na água ultra-pura MilliQ de partículas microplásticas, bem como partículas de tamanho sub-mícron, utilizando um microscópio eletrónico de varrimento – um copo de papel descartável exposto a líquido quente durante 15 minutos terá aproximadamente 10,2 mil milhões de partículas de tamanho sub-mícron”.

Além disso, utilizando a cromatografia iónica, os investigadores observaram a transferência iónica para a água dos copos de papel, confirmando que os microplásticos podem ser libertados em bebidas quentes.

“Este estudo mostra que é necessária uma cuidadosa consideração antes da promoção de substitutos para produtos bio-perigosos e poluentes ambientais. Temos sido rápidos a substituir copos de plástico por copos descartáveis de papel”, declarou a diretora do IIT-Kharagpur, Virendra Tewari, que sugere um regresso às tradicionais taças descartáveis de terracota que ainda são utilizadas em muitas zonas da Índia.

De acordo com Sudha Gorl, a conveniência das chávenas de papel é tal que é difícil encontrar um substituto adequado, especialmente nos modernos ambientes de escritório onde os copos de papel estão sempre presentes nas máquinas de venda de café.

“Há definitivamente um fator de pressão das empresas que instalam e mantêm máquinas de venda automática de café ou chá que são omnipresentes nos escritórios”, diz Goutham Y, chefe da Ecolife, uma empresa constituída por um grupo de empresários ambientais com a missão de substituir os produtos derivados do petróleo por produtos biodegradáveis e amigos do ambiente e da saúde.

“Para além de ingerir microplásticos, como mostra  o estudo do IIT, os copos de papel deixam para trás plásticos finos que contaminam o ambiente”, diz Goutham. “Os copos de papel descartáveis não se decompõem num aterro sanitário e não podem ser reciclados, pelo que existe uma procura contínua e crescente dos mesmos que só pode ser satisfeita através de uma maior desflorestação”.

Goutham diz que a Ecolife está a investigar filmes à base de plantas, que podem ser utilizados para revestir copos de papel, tais como o polibutileno succinato, que são biodegradáveis, mas admite que os copos amigos do ambiente são duas vezes mais caros do que os que são atualmente usados.

Segundo Goutham, as bancas de chá e café na Índia têm normalmente margens tão pequenas nas vendas que servem as suas bebidas nos recipientes mais baratos possível, muitas vezes forrados com cera, o que pode ser ainda mais perigoso para os consumidores do que os forros de plástico.

“A única forma de levar as pessoas a utilizar materiais mais seguros é o governo ser pro-ativo e reduzir os impostos sobre o fabrico de copos de papel e talvez até subsidiá-los, dado os prejuízos que podem causar à saúde de populações insuspeitas”, diz Goutham.

Este estudo deverá ser publicado em fevereiro de 2021 no “Journal of Hazardous Materials”, mas já se encontra disponível online.

NR/HN/Adelaide Oliveira

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