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O TiR que vai bater de frente contra o Ministério da Saúde
É inevitável que aconteça.
No já longínquo ano de 2009, sentava-me com o Nuno1 numa esplanada junto à praia de Carcavelos, para começar a traçar a estratégia de lançamento de um DDP4 associado à metformina. O objectivo era algo que fizesse a diferença para o doente diabético tipo2 através do seu Médico de Família.
O conceito que fizemos, “24 horas por dia com diabetes”2, focava a importância da variabilidade glicémica, porque para nós na altura, através de tudo o que interpretávamos do que estava publicado, a HbA1c 2 vezes por ano, já não chegava; queríamos comunicar a importância de o doente estar dentro do controlo, o maior nº de horas de um dia.
Com a ajuda de alguns clínicos, observaram-se 10 diabéticos tipo 2, durante 24 horas e obteve-se um perfil da variabilidade glicémica e do tempo dentro de alvo; levantou-se a necessidade de ser mais agressivo na abordagem ao doente diabético tipo 2, porque apesar de haver valores da glicémia dentro dos parâmetros, numa grande parte das 24 horas, o doente não estava dentro dos níveis de controlo.
Passados 12 anos, no dia 12/2/21 leio no Health News a entrevista ao Dr. José Silva Nunes: “O TiR é uma óptima métrica e dá muita mais informação do que a HbA1c”. Segundo o autor, “o Time in Range, Tempo no Alvo, é uma métrica de monitorização do controlo glicémico mantido ao longo das 24 horas, que permite verificar a percentagem de tempo que o doente permanece com a glicemia dentro dos limites superior e inferior recomendado”.
Continuando, “Se tivermos uma visão mais apurada de como é o grau de controlo glicémico, conseguimos ter informação concreta que nos ajude a evitar o desenvolvimento das complicações agudas e tardias da doença.”
“Neste momento, unicamente indicado para pessoas que têm diabetes tipo 1 ou pessoas com diabetes tipo 2 (que fazem múltiplas administrações de insulina). Portanto, actualmente o Time in Range não pode ser utilizado na generalidade da população diabética”.
O TiR não pode ser utilizado na generalidade da população diabética!
O não pode, tem mais a ver com o Estado não querer pagar, num manifesto exercício de poder, onde a Medicina já não decide por si. É o Estado a controlar o saber e a prática médica, de modo a poder alcançar objectivos financeiros, através da cativação diabética.
Não vou discutir o tema da comparticipação da inovação, mas numa época em que os doentes estão mais informados, logo mais exigentes, o Estado com esta atitude, coloca em risco a relação de confiança entre o doente e o médico e até entre o médico e o Estado.
O modelo de Estado Social em que vivemos, tem como objectivo o bem-estar dos cidadãos, salientando em particular o objectivo da saúde, pelo que não compreendo que o TiR não possa estar ao serviço de todos os diabéticos.
Começo a acreditar que a atitude do Estado neste tipo de comparticipação, não será apenas por questões financeiras, mas provavelmente por questões ideológicas. Sem querer fazer demagogia, se evitar o desenvolvimento das complicações agudas e tardias da diabetes, não estaremos dessa forma a economizar muito dinheiro ao Estado? Ou o problema está em auditar as terapêuticas, a gestão da doença e o comportamento do doente?
Para quem conhece a contratualização dos CSP e os indicadores da Diabetes, percebe que o objectivo não se foca nos resultados clínicos, muito menos nas co-morbilidades do doente diabético tipo 2, que em conjunto, podem tornar o custo para o Estado muito superior ao custo da TiR.
Será que ideologia que preside à contratualização, visa atingir a liberdade do médico, com o simples objectivo de regular a prática clínica, atribuindo aos ideólogos do Estado e não à Ciência, à investigação e à evidência, a definição e a auditoria das políticas médicas?
É inevitável que aconteça. Um dia deste haverá um TiR que vai bater de frente contra o Ministério da Saúde. Quem estará ao volante? Médicos, doentes?
- Nuno Silva, Product Manager Merck Serono
- Livro “24 horas por dia” escrito em co-autoria, edição limitada, 2009
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