“Nos casos de poliúria noturna, responsável por 60-80% dos episódios de noctúria, o tratamento de primeira linha é a utilização de desmopressina oral”, assinala António Pedro Carvalho, coordenador de Urologia no Grupo Trofa Saúde.
HealthNews – A abordagem da noctúria deve começar pelo aconselhamento comportamental?
António Pedro Carvalho – Realmente, após a verificação de noctúria devemos iniciar o nosso tratamento dos doentes pelo aconselhamento comportamental. Estes cuidados consistem em abstinência da ingestão de líquidos 4-5 horas antes de ir dormir, inclusive a sopa ao jantar não deve ser passada e comida com garfo; modificação da dieta evitando bebidas alcoólicas e com cafeína; alterar a toma de diuréticos da noite para meio da tarde; evitar a utilização de bloqueadores de canais de cálcio para tratamento da HTA; drenagem de edemas posturais durante o dia; urinar sempre antes de ir para a cama e esperar o tempo necessário até a bexiga estar completamente vazia.
Em que casos estão recomendados os anticolinérgicos e alfa-bloqueantes? Nos doentes com bexiga hiperativa e hiperatividade vesical?
Após a recolha da história clínica, o gold standard na avaliação de um doente com noctúria, caso seja possível, é o preenchimento do diário miccional. A sua interpretação permite identificar uma bexiga hiperativa quando os volumes miccionais são persistentemente inferiores a 200 ml. Neste caso, a utilização de anti-colinérgicos e beta 3 agonistas permite aumentar o volume de cada micção, espaçando o tempo até nova ida ao WC. Existem também doentes com sintomas urinários de esvaziamento, como jato fraco e enfraquecido, hesitação e sensação de esvaziamento incompleto. Nestes, o número de vezes que urinam, para além de estar relacionado com esvaziamento incompleto, também tem relação com a descompensação vesical (hiperatividade vesical) que o deficiente esvaziamento condiciona nas paredes da bexiga. Os alfa bloqueantes são os medicamentos indicados para tratar a noctúria nos doentes com esta sintomatologia associada, pois permitem um esvaziamento vesical mais eficaz, por um lado, e a redução do número de episódios de noctúria, por outro.
A desmopressina oral constitui uma opção de primeira linha nos doentes com noctúria causada por poliúria noturna? O que revelam os estudos?
Como referi anteriormente, a avaliação do diário miccional permite-nos diagnosticar uma poliúria noturna quando o volume urinado durante a noite é superior a 20% do volume total de urina nas 24 h (33% nos doentes acima de 65 anos). Esta poliúria noturna é causada pela secreção inapropriada da hormona anti-diurética (vasopressina). A desmopressina é um análogo químico dessa hormona e que, ao ser tomada ao deitar, vai mimetizar os efeitos da hormona, reduzindo a produção de urina durante o período da noite, diminuindo assim o número de vezes que o doente se levanta para urinar. Fica assim bastante óbvio, que nos casos de poliúria noturna, responsável por 60-80% dos episódios de noctúria, o tratamento de primeira linha é a utilização de desmopressina oral. Os estudos revelam isso mesmo, logo na primeira semana de tratamento e demonstram que os alfa bloqueantes somente melhoram os episódios de noctúria em menos de 30% dos doentes.
Quais as vantagens da nova formulação da desmopressina oral, administrada por via sublingual?
A utilização de desmopressina por via sublingual, para além da eficácia na redução do número de episódios de noctúria, ao evitar a toma com água, vai ao encontro do que se pretende: não ingerir líquidos antes de deitar. Por outro lado, a desmopressina não tem efeitos secundários cardiovasculares como a vasopressina.
O único efeito lateral importante é a hiponatrémia, com maior incidência nos indivíduos com mais de 65 anos. Esta nova formulação oral está principalmente dirigida para este tipo de doentes, pois reduz o risco de hiponatrémia para menos de 5%. Invariavelmente, a hiponatrémia aparece na primeira semana de tratamento, havendo necessidade de rastrear estes doentes no início de tratamento. Em doentes mais novos não há necessidade de controlar o sódio durante o tratamento, pois a incidência de hiponatrémia é igual à do placebo.
A dosagem é diferente nos homens e nas mulheres? E também varia em função da idade?
A afinidade da desmopressina para os recetores responsáveis pela concentração urinária e retenção do sódio, é diferente nos homens e nas mulheres, sendo cerca de duas vezes mais no sexo feminino. Por essa razão, a dose necessária para tratamento das mulheres é 25ug, metade da dose utilizada nos homens. Relativamente à idade, com esta nova formulação normalmente não é necessário o acerto da dose, pois está especialmente dedicada à utilização em doentes maiores de 65 anos.
O tratamento adjuvante com desmopressina também pode ser considerado em indivíduos com hiperplasia benigna da próstata em que a noctúria constitui um problema clínico importante?
Há muitos doentes com hiperplasia benigna da próstata com sintomas urinários de enchimento e esvaziamento. Se conseguirmos tratar esses sintomas com a utilização de alfa bloqueantes e, eventualmente, a associação com anti-colinérgicos e beta 3 adrenérgicos, há doentes que mesmo assim mantêm a noctúria. Estes doentes muito provavelmente também têm poliúria noturna, tornando-se assim candidatos à associação de desmopressina às outras terapêuticas já iniciadas. Pode-se, portanto, concluir que existem doentes mais complicados com noctúria de etiologia mutifatorial, que necessitam de terapêutica múltipla para uma melhoria clínica completa.
HealthNews
É FABULOSO ESTE MÉDICO.