Este projeto foi lançado pelo Governo para começar a colmatar “uma grave falha” no Serviço Nacional de Saúde (SNS), que há 40 anos deixou de fora a medicina dentária, e que visava dar reposta à população mais desfavorecida, com um leque de tratamentos restringido, segundo a Ordem dos Médicos Dentistas (OMD).
O despacho criado pelo então secretário de Estado da Saúde, Fernando Araújo, deu “um alento e uma esperança muito grande ao SNS, a todos os profissionais de saúde e aos médicos dentistas para, de uma vez por todas, se reestruturar o SNS, e poder haver a oportunidade de integrar os cuidados de saúde oral e a medicina dentária no SNS”, disse à agência Lusa o bastonário da OMD, Miguel Pavão.
O principal objetivo era ter pelo menos um dentista em todos os agrupamentos dos centros de saúde e chegar a 2020 com 265 profissionais integrados e com a possibilidade de se criar uma carreira para os dentistas que integrariam os cuidados de saúde primários, além da oportunidade de se reformar e reorganizar as unidades de saúde oral.
Contudo, “o objetivo falhou quase em toda a linha”, defraudando as expectativas de doentes e profissionais: “Aquilo que era uma proposta bem desenhada, ficou apenas uma expectativa e uma mera promessa de campanha eleitoral na altura do partido do Governo, do Partido Socialista”, afirmou Miguel Pavão.
“Ainda que o nome tenha mudado para Programa de Saúde Oral para Todos, os moldes mantêm-se. Na prática, continuam a ser projetos-piloto, apenas para quem tem grande carência económica e embora seja de saudar o número de tratamentos e intervenções já realizados, que seguramente mudaram a vida dos doentes, a verdade é que as limitações continuam a ser enormes”, declarou.
O bastonário denunciou também as condições precárias em que os profissionais trabalham e que levou a que nenhum dos médicos dentistas se mantivessem no projeto-piloto.
No seu entender, esta situação demonstra “a fragilidade de todo este processo”, a rotatividade dos profissionais, e “o Governo reforçar situações completamente ilegais de manter médicos dentistas contratados por empresas”.
“A maioria dos médicos dentistas são contratados por empresas, através de contratos de prestação de serviços de 12 meses, sem subsídio de férias nem de Natal, sem direito a apoio no desemprego e sem qualquer hipótese de serem integrados nos quadros do Estado”, criticou.
Esta situação faz com que o Governo com contratos precários de menos de um ano consiga “preencher os gabinetes instalados de medicina dentária”, mas não dando sustentabilidade a uma “valência muito importante”, a saúde oral.
Segundo Miguel Pavão, há dentistas no SNS a ganhar cinco euros à hora, o que classificou de “contraproducente, ilegítimo, e que mostra a fragilidade de todo este processo”.
“Enquanto não houver uma reforma que consubstancia os médicos dentistas no SNS, nós vamos ter apenas uma pretensão de posicionar a medicina dentária no SNS, mas verdadeiramente ela não está efetivada, porque não se criando carreiras e condições os médicos dentistas rapidamente se desvinculam”, alertou.
Perante esta situação, Miguel Pavão considerou ser fundamental olhar para este projeto-piloto, mostrar o que realmente correu mal, o que ficou por fazer e “torná-lo definitivo após cinco anos”.
Há a possibilidade de o Plano de Recuperação e Resiliência, que tem “verbas avultadas para reforma dos cuidados de saúde primários”, e tem uma ambição de “modificar as estruturas do SNS e melhorá-las”, mas, disse ter o receio de que “nada venha a ser feito e fique por cumprir esta experiência de cinco anos e, certamente, vai-se perder uma nova oportunidade”.
NR/HN/LUSA
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