Hiperplasia Benigna da Próstata

20 de Julho 2021

Tiago Rodrigues Urologia Hospital Particular do Algarve, Joaquim Chaves Saúde

A próstata é um órgão que se situa logo abaixo da bexiga abraçando completamente a primeira parte da uretra do homem. A próstata é mais conhecida do público masculino pelo seu crescimento e pelo frequente aparecimento de sintomas urinários. Estes sintomas surgem com o avançar da idade, habitualmente em homens com mais de 50 anos, e têm associados a eles a carga psicológica do envelhecimento.

Na HBP (Hiperplasia Benigna da Próstata) o crescimento da próstata é benigno, acontece na porção central da glândula, e a sua importância deve-se exclusivamente aos sintomas que provoca. Estes sintomas têm origem nas alterações à micção que a obstrução da primeira parte da uretra provoca. Nesta condição releva o grau de obstrução criado e não o tamanho da próstata. Um crescimento ligeiro, mas exclusivamente para dentro, provocará muito mais sintomas que um grande crescimento para fora.

A complexidade dos sintomas urinários no homem vai para além do dito grau de obstrução. A força contráctil da bexiga, o diâmetro da uretra, a posição relativa do colo vesical, a interação com o sistema nervoso central, a personalidade do doente e fatores externos, como o tipo de trabalho exercido, a quantidade e qualidade dos líquidos ingeridos, contribuem para a frequência e o tipo de sintomas vivenciados pelo homem.

Os sintomas provocados pelo crescimento da próstata dividem-se em três tipos:

  • De armazenamento, ou seja, a forma como o doente contém a urina;
  • De esvaziamento – a forma como urina, e pós-micionais; a forma como se sente após urinar. Os sintomas de armazenamento incluem a necessidade de ir muitas vezes à casa de banho; levantar-se à noite várias vezes para urinar; incapacidade de controlar a vontade de urinar ou mesmo a perda de algumas gotas. Os sintomas de esvaziamento são os jatos fracos ou em leque, a incapacidade para fazer um jacto contínuo, a necessidade de fazer força, o demorar a começar a urinar ou demorar muito até acabar.
  • Sintomas pós-micionais – a sensação de esvaziamento incompleto e o gotejo no fim de urinar.

O diagnóstico da HBP começa, como sempre na medicina, pela história médica, onde são abordados os sintomas urinários, a altura do seu aparecimento e a sua intensidade e é feito o despiste de outras doenças. O exame físico completará a consulta e permite obter alguns dados importantes, incluindo uma avaliação rude do tamanho da próstata através do toque rectal. Seguidamente poderão ser solicitados mais exames, de onde se destacam a análise do PSA (antigénio específico da próstata), da função renal e a pesquisa de infeções urinárias. A avaliação funcional do aparelho urinário, realizada através do diário miccional (um registo de todas as micções, volumes urinados e sintomas associados), ecografia vesical com avaliação do resíduo pós-miccional, ecografia prostática e a fluxometria (avaliação não invasiva do jacto urinário), complementam a avaliação inicial. Outros exames mais complexos também poderão fazer parte da marcha diagnóstica, como os estudos pressão-fluxo e a uretrocistoscopia, embora estejam habitualmente reservados para situações concretas.

A HBP é uma doença que tem a sua enorme importância assente em duas características: a sua elevada prevalência, com uma tendência a aumentar com a idade (classicamente é aceite que 90% dos homens com 90 anos sofre de HBP) e o seu enorme impacto na qualidade de vida dos doentes. Assim, embora se trata de uma patologia benigna, é mandatório tratar os sintomas, aliviando o transtorno criado no dia-a-dia dos homens.

O tratamento inicial passa pela alteração de alguns hábitos de vida, como a alteração do padrão de ingestão de água ao longo do dia. Idealmente deverá ser mantida a ingestão de uma boa quantidade de água por dia (mais do que 1-1,5 litros) mas esta deverá ser distribuída evitando os períodos antes de reuniões, longas viagens de carro ou o deitar para dormir. A evicção de alguns alimentos ou bebidas; o urinar sentado e o esperar na casa de banho para esvaziar completamente a bexiga poderão ter um forte impacto nos estádios iniciais da doença. Segue-se o tratamento farmacológico, onde se destacam, de forma clara, os alfa-bloqueantes, que têm como objetivo diminuir a obstrução à saída da urina. Outros fármacos poderão ser úteis para debelar sintomas específicos e em certas situações, como a urgência miccional sem obstrução marcada. Devido à necessidade de toma diária de medicamentos e aos seus efeitos adversos, nomeadamente as alterações na ejaculação, têm surgido técnicas cirúrgicas minimamente invasivas que visam diminuir a obstrução sem condicionar a ejaculação. Estas técnicas, apesar de promissoras, obrigam a alguma cautela na sua escolha e, sobretudo, a ter sempre presente que são soluções que durarão poucos anos.

Por último temos a solução cirúrgica.

Existem múltiplas cirurgias atualmente disponíveis, desde a abordagem clássica com uma incisão na metade inferior do abdómen passando pela cirurgia laparoscópica ou robótica até à cirurgia endoscópica, ou seja, através da uretra e sem necessidade de nenhuma ferida operatória (conhecida como raspagem). Poderíamos ainda discutir as diversas técnicas endoscópicas, o tipo de energia, o tipo de laser, a remoção em fragmentos ou em bloco, mas o mais importante é ter sempre presente que o objetivo das intervenções é a diminuição da obstrução, o que implica a remoção ou destruição de uma quantidade considerável de tecido da próstata. O princípio é o de remover uma quantidade (pelo menos percentual) grande de tecido prostático para permitir a existência de uma uretra inicial (prostática) de grande calibre e, por definição, não obstrutiva.

A HBP é uma doença para a qual existe hoje um muito extenso arsenal terapêutico, desde fármacos com mais de 30 anos até cirurgias com poucas dezenas de meses. É importante perceber que é possível melhorar a qualidade de vida dos doentes com sintomas urinários; que pode não ser um caminho fácil e linear; que a solução de hoje poderá não ser a solução de amanhã; que a fórmula certa para um pode não resultar noutro, mas o facto de existirem soluções é um triunfo da Medicina moderna.

tr@tiagorodriguesurologia.pt

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