Assim, esta deve ser uma das propostas a ser levada à consideração dos ministros da Saúde da CPLP, que deverão reunir-se em fevereiro próximo, em Luanda, admitiu Fernando Cupertino, à Lusa, no final do seminário “De Alma-Ata a Astana: a trajetória dos cuidados de saúde primários nos países da CPLP”, organizado pelo Instituto de Higiene e Medicina Tropical da Universidade Nova de Lisboa.
Para o médico brasileiro que coordenou a iniciativa, “tem de haver”, antes de mais, “um compromisso dos governos dos Estados-membros da CPLP de que a saúde é um direito humano indisponível”.
E “então que se comprometam a dar a prioridade política necessária para que os seus sistemas de saúde possam desenvolver-se de modo a responder satisfatoriamente às necessidades da população”, acrescentou.
Porque, os desafios que o setor enfrenta nos próximos tempos são muitos e só serão ultrapassados se houver igualdade no acesso aos cuidados primários de saúde e investimento, em estruturas e recursos humanos, o que exige vontade política.
Segundo Fernando Cupertino, ficou “muito claro” no seminário que “de nada serve investir em estruturas se não se investir em recursos humanos para o setor da saúde”.
“É preciso que haja investimento nos dois sentidos e que haja uma sincronia de ações que permitam que esses recursos humanos, formados e retidos, tenham a possibilidade da educação permanente, porque os conhecimentos mudam”, frisou.
Além disso, para que esses recursos humanos possam trabalhar também “há necessidade de ter salários pagos, de ter estruturas e equipamentos para poderem trabalhar, o que nem sempre é a realidade”, sublinhou.
E um dos “problemas graves” que o setor enfrenta, nos países da CPLP, “é o da retenção de recursos humanos”, indicou.
Por isso é necessário envolver os profissionais de saúde e da própria sociedade e criar “meios para formar e reter recursos humanos, um problema muito grave, sobretudo em África, mas não apenas”, vincou.
Para o médico brasileiro outro dos desafios é a estabilidade governativa, “para que ações de médio e longo prazo possam ser implementadas” no setor.
Além destes, realçou ainda “o grande desafio que é integrar os cuidados de saúde primários nos outros níveis de atenção à saúde, como as especialidades e ao nível hospitalar”.
Classicamente, explicou há um desenho piramidal, em que os cuidados primários “estão na base e a atenção hospitalar especializada no topo”.
Esta é, na opinião do médico, uma representação que “não é correta e não ajuda”, porque “dá a impressão que o objetivo final a alcançar é terciário”, quando “a grande maioria das pessoas precisam é do cuidado primário”.
Então, no entender dos intervenientes do seminário internacional, os cuidados primários “deveriam estar no centro de uma rede de cuidados de saúde”.
“É essa inversão de lógica que a gente pretende, ao analisar os contributos dos diferentes países e ao propor uma nova forma de organização desses serviços, que respondam também a um outro desafio, ligado aquele, as doenças e condições ligadas ao envelhecimento populacional”, referiu.
Em África “estão muito presentes os desafios das doenças transmissíveis e da mal-nutrição”. Porém, “o desafio das doenças crónicas já é muito premente”, sublinhou, referindo-se à diabetes e problemas cardiovasculares.
Então, ali, defendeu, “é necessário que os cuidados primários consigam-se organizar para enfrentar as duas coisas, mas com um peso preponderante, que é crescente, das condições crónicas de saúde”.
Assim, “os países africanos, tal como o Brasil”, vão ter de enfrentar uma luta em duas frentes.
Para o médico Fernando Cupertino, há ainda “um elemento comum”, nos países da CPLP, que transcende a área da saúde, “o das desigualdades”.
“Então se não houver um combate sistemático comum das desigualdades, a área da saúde isoladamente jamais conseguirá vencer todos esses desafios”, afirmou.
“A prioridade a meu ver é criar condições para que se combatam as desigualdades, criar condições para que os sistemas de saúde respondam com equidade às necessidades de saúde da polução”, acrescentou.
E isso significa “dar mais a quem mais necessita” e implica dar mais atenção e “investir mais recursos naquelas camadas mais vulneráveis da população”, conclui.
Agora, aos organizadores do seminário compete construírem “uma síntese destes elementos e apresentar uma proposta de ação para que os senhores ministros da Saúde [da CPLP], que irão também reunir-se, possivelmente no mês de fevereiro”, explicou.
Para que possam “fazer com que os países se comprometam a fortalecer os cuidados de saúde primários e a favorecer a sua articulação com os demais níveis de atenção” na saúde.
Na sessão de abertura da conferência, o secretário executivo da CPLP defendeu que os Estados da organização precisam de “garantir” um acesso rápido às vacinas e condições de combate à Covid-19, para “mitigar os efeitos de calamidade pública” da pandemia.
LUSA/HN
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