A carta foi partilhada pelo CMF com a Lusa, nesta sexta-feira à noite, em resposta a um pedido de reação às declarações de Miguel Guimarães publicadas há um mês.
O assunto do reconhecimento dos médicos brasileiros regressou à agenda depois de a Lusa ter divulgado, a 16 de janeiro, vários textos sobre os clínicos estrangeiros em Portugal.
Num desses textos, o bastonário da Ordem dos Médicos, falando sobre o modelo de seleção de candidatos estrangeiros a exercer Medicina em Portugal, deu como exemplo o Brasil, com “os piores e os melhores cursos de Medicina”, onde “abrir uma escola médica (…) é muito fácil” e onde “a maior parte dos médicos brasileiros [não está inscrita] na Ordem dos Médicos”.
As declarações motivaram queixas e pedidos de esclarecimento por parte de médicos brasileiros em Portugal, confirmou à Lusa, na altura, uma fonte do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, assinalando que o bastonário referiu “indicações não verdadeiras” sobre os cursos de Medicina no Brasil.
Na sequência das declarações, a Lusa enviou um ’email’ ao CMF, que agora respondeu, comunicando ter recebido “nesta semana uma carta assinada pelo bastonário da Ordem dos Médicos de Portugal”.
Com o “esclarecimento” do assunto, a carta, consultada pela Lusa e disponível no Portal Médico brasileiro, data de 14 de fevereiro.
Na carta, dirigida ao presidente do CFM, Guimarães nega qualquer “afirmação depreciativa” e saúda “todos os médicos brasileiros que durante esta pandemia e perante todas as contrariedades sanitárias, políticas e sociais, souberam fazer das suas competências, conhecimento e elevado sentido de responsabilidade, solidariedade e humanismo, a resposta adequada às necessidades das pessoas em sofrimento, honrando a sua missão de cuidar, tratar e proteger os doentes, salvando milhares de vidas”.
O bastonário reconhece que “é inegável que Portugal tem uma relação de excelência com médicos de muitos países”, entre os quais “se destacam os brasileiros”.
Sublinhando “elevada consideração e respeito” pelo CFM, assinala que “o Brasil é o segundo país com maior representatividade” de médicos estrangeiros em Portugal.
Quem se candidata a exercer Medicina em Portugal tem, no mínimo, um ano civil inteiro pela frente, para cumprir dois requisitos exigidos para a inscrição na Ordem dos Médicos: ver reconhecido o curso/grau por qualquer uma das oito Escolas Médicas portuguesas e demonstrar que sabe comunicar em português.
Para quem venha de fora da União Europeia, o reconhecimento é condicionado pelas entidades que regulam a atividade médica, passando por uma avaliação de conhecimentos académicos, clínicos e linguísticos, assegurados, primeiro, pelas Escolas Médicas portuguesas e, depois, pela Ordem dos Médicos, com uma prova de comunicação médica.
Portugal aprovou, nos últimos três anos, 42,2% dos pedidos de candidatos a médicos oriundos de países estrangeiros, três quartos dos quais brasileiros, segundo dados oficiais.
Na carta enviada ao CMF, Miguel Guimarães explica que, para responder à Lusa sobre a taxa de aprovação dos médicos brasileiros, se socorreu “de muitos dados emanados por instituições brasileiras, que corroboram as preocupações com a assimetria a que se assiste no Brasil (…), que podem justificar que as equivalências não sejam tão elevadas”.
O bastonário enumera uma série de “indicadores” das entidades médicas e educativas do Brasil para sustentar a “assimetria”. Por exemplo, o estudo “Radiografia das Escolas Médicas Brasileiras 2020” “mostrou que 92% das instituições de ensino superior que oferecem vagas para Medicina não cumprem pelo menos um dos três parâmetros considerados essenciais para o funcionamento dos cursos”.
O próprio CFM tem “denunciado que a falta de locais de prática clínica é resultado da abertura desenfreada de escolas médicas nos últimos dez anos”, recorda.
“A taxa de reprovação de perto de 65% destes candidatos junto das universidades portuguesas poderá ser explicada por um conjunto de problemas já identificados pelas instituições brasileiras congéneres, que vão desde a duração do curso, aos programas formativos, passando pela falta de acesso a uma prática clínica suficientemente diversificada e diferenciada. Problemas esses que sei que têm estado empenhados em resolver”, escreve Miguel Guimarães.
“A qualidade da Medicina é um dossiê que não conhece fronteiras ou nacionalidades, e que deve ser uma preocupação de todas as estruturas ligadas à saúde”, conclui, “certo de que” o CMF e a Ordem “estão juntos neste caminho”.
NR/HN/LUSA
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