Nuno Matos, Enfermeiro Especialista em Enfermagem Comunitária

A Saúde Comunitária e a Saúde Pública são os parentes pobres do Serviço Nacional de Saúde?

06/14/2023

A importância dos enfermeiros na saúde pública foi muito notada durante a fase mais crítica da pandemia, e permitiu controlar e mitigar alguns dos riscos e efeitos da crise pandémica. Os cuidados de saúde primários e a rede de proteção que estes representam, especialmente no apoio e na prestação de cuidados de saúde aos cidadãos mais vulneráveis foi fundamental para o sucesso do Serviço Nacional de Saúde durante a crise pandémica. O trabalho, a experiência e o sacrifício dos enfermeiros permitiu obter ganhos para a sociedade, para as equipas de saúde, para o desenvolvimento das organizações de saúde nacionais e para o reconhecimento das boas práticas a nível internacional.

Uma população habituada a confiar nas equipas de família facilmente acedeu e confiou nas suas orientações, protegendo-se e acima de tudo protegendo a população mais vulnerável.

No que se refere à carreira de enfermagem, estamos desde 17 de novembro de 2021 a aguardar pela aposta e valorização profissional dos enfermeiros nos cuidados de saúde primários. Proclamou-se a abertura de concursos, o reforço dos profissionais e ao dia de hoje os resultados são escassos. Com a agravante de que neste momento a necessidade de novos enfermeiros identificada em novembro de 2021, está em muito ultrapassada.

Na minha opinião a etiologia do problema pode estar associada, em primeiro lugar, à pouca importância dada pela sociedade aos cuidados de saúde primários, que primam pela promoção da saúde e prevenção da doença, resultando numa menor visibilidade e não se notando o desinvestimento nesta área do Serviço Nacional de Saúde, em segundo, à pouca visibilidade dada aos enfermeiros que trabalham nos cuidados de saúde primários.

Por outro lado, podemos refletir sobre a importância dada aos Ensinos Clínicos de Enfermagem Comunitária no Curso de Licenciatura em Enfermagem.

Enquanto o primeiro problema está à vista de todos, o segundo, na minha humilde opinião, será a raiz da questão, senão vejamos, no que diz respeito à enfermagem desde a minha formação académica, houve sempre algum hiato entre ensinos clínicos em enfermagem nos Cuidados de Saúde Primários, e maior centralidade dos ensinos clínicos nos Cuidados de Saúde Hospitalares.

A Especialidade de Enfermagem Comunitária e de Saúde Pública, umas das mais antigas na Enfermagem, é das únicas, senão a única, que a ver pelos concursos do Serviço Nacional de Saúde, apenas tem lugar nas Unidades de Saúde Pública ou nos Cuidados de Saúde Primários, estando vedada a sua prática nas Unidades de Saúde Hospitalares pelo menos na prática.

As ferramentas de saúde pública não serão importantes e por este motivo necessárias em contextos de cuidados de saúde diferenciados? A formação de base de um enfermeiro especialista em saúde comunitária per si, não lhe dá competências para ingressar na equipa de saúde ocupacional de um qualquer serviço de saúde ou organização? Esta mesma formação de base não dá capacidade para prestar cuidados de saúde numa unidade de saúde familiar?

Se o referido não é ser parente pobre, por favor, expliquem-me o que é?

Esperar pelo resultado de um concurso desde novembro de 2021, para vagas na altura consideradas urgentes é o quê?

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