Praticantes experientes de meditação conseguem desligar voluntariamente a consciência?

12 de Janeiro 2024

Estudo revela que praticantes experientes de meditação conseguem modular voluntariamente o seu estado de consciência durante a meditação, ou seja, possuem a capacidade invulgar de, sem recurso a medicamentos, induzirem um vazio momentâneo de consciência durante as sessões através da modulação em larga escala da atividade cerebral.

Em que situações pode o ser humano perder a consciência? Uma anestesia, concussão cerebral, intoxicação, epilepsia, convulsão ou outro episódio de desmaio/síncope causado pela falta de fluxo sanguíneo para o cérebro podem provocar perda total de consciência. Mas poderá a ausência de consciência ser induzida sem recurso a medicamentos? Há mais de dois mil anos, as Escrituras descreviam um evento extraordinário de cessação que podia acontecer durante o curso da prática intensiva de meditação.

Nesse evento de cessação (ou nirodha, de acordo com a terminologia budista tibetana), o praticante perde brevemente a consciência mas, quando desperta, experimenta mudanças significativas na forma como a sua mente funciona, incluindo uma sensação repentina de profunda clareza mental e percetiva.

Matthew Sacchet, juntamente com investigadores da Austrália, Países Baixos e Estados Unidos, perceberam que a ideia de um praticante de meditação ter a capacidade de “desligar” a consciência pode ter implicações relevantes para a nossa compreensão de como a cognição funciona, mas constataram também que a investigação sobre a cessação até à data apresentava várias limitações, nomeadamente pelo facto de poucos praticantes experientes conseguirem atingir o nível de meditação em que ocorrem as cessações, que também são difíceis de prever.

No artigo Investigation of advanced mindfulness meditation “cessation” experiences using EEG spectral analysis in an intensively sampled case study, publicado em novembro na revista científica Neuropsychologia, os autores revelam que, neste caso de estudo intensivo, superaram esses desafios ao recrutarem um praticante experiente que mostrou ser capaz de entrar e descrever múltiplos eventos de cessação à medida que estes surgiam ao longo de repetidas sessões de meditação.

Os investigadores recorreram a uma abordagem neurofenomenológica em que as descrições das cessações em “primeira pessoa” estão relacionadas com os dados objetivos de neuroimagem. Ou seja, o praticante experiente avaliou sistematicamente os processos mentais e fisiológicos relevantes para as cessações (contexto, entrada, evento, saída, efeitos posteriores) conforme os experienciou e essas avaliações foram usadas para agrupar e selecionar eventos para posterior análise baseada em EEG.

A análise espetral dos dados EEG relativos aos 37 eventos de cessação do participante registados em 29 sessões permitiu relacionar as interrupções com medidas objetivas e intrínsecas da atividade cerebral, associadas à consciência e ao funcionamento psicológico de alto nível. De acordo com Matthew Sacchet, investigador apoiado pela Fundação BIAL, “estes resultados fornecem provas iniciais da capacidade de praticantes experientes de meditação modularem voluntária e profundamente o seu estado de consciência e lançam as bases para mais estudos sobre estados únicos utilizando abordagens neurocientíficas e empíricas”.

Saiba mais sobre o projeto ‘Beyond “mindfulness” and toward a modern science of meditative mastery and spiritual transformation’ aqui.

Aceda a mais conteúdos da Revista HealthNews #16 aqui.

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