Esta perspetiva pode potenciar a adesão ao tratamento e, consequentemente, melhorar a eficácia das intervenções e o bem-estar físico e psicológico da mulher, a nível individual e comunitário. Neste estudo foram contactadas 2578 mulheres, entre os 40 e os 65 anos, e verificou-se que 60 por cento (1.538) das mulheres questionadas apresentam incontinência urinária – perdas involuntárias de urina ao tossir/fazer esforço físico ou ao sentir uma sensação de urgência –, uma prevalência considerada “muito elevada”. Concluiu-se também que a incontinência urinária, até nas suas formas mais leves/moderadas, impacta negativamente o funcionamento sexual e a qualidade de vida da mulher na meia-idade.
Segundo o estudo, quanto mais ameaçadora as mulheres consideram a sua IU, maior o impacto negativo na qualidade de vida. Outros dados relevantes do estudo: 17,7 por cento reportou que a IU afetou a relação com o seu parceiro e 20 por cento referiram que a IU afetou a sua vida sexual.
“Já sabemos que existe uma relação bidirecional entre saúde física e saúde psicológica. Esta investigação na área da incontinência urinária salienta que a forma como se pensa a doença e o uso de estratégias de evitamento poderão aumentar o dano que os sintomas causam na nossa qualidade de vida”, refere a investigadora Marta Porto, do William James Center for Research e investigadora responsável pelo PURI-PRO (Portuguese URinary Incontinence PROject) – Symptoms impact and eHealth Intervention for Menopausal Women with Urinary Incontinence.
Concluiu-se também, com este estudo, as potencialidades de uma abordagem multidisciplinar para o doente: “As melhores práticas médicas são aquelas que têm em consideração a complexa interação de fatores fisiológicos e psicológicos. Na área da saúde feminina, além de tratarmos patologias físicas, queremos e devemos devolver a qualidade de vida às nossas doentes”, conclui a presidente da Sociedade Portuguesa de Ginecologia, Teresa Mascarenhas.
A docente e investigadora Filipa Pimenta, do William James Center for Research, partilha da mesma posição: “A contribuição da psicologia da saúde na área da incontinência urinária está à vista: é preciso investir em profissionais especialistas nas ciências comportamentais (psicólogos clínicos e da saúde), capacitados para explorar e intervir em crenças e comportamentos que as mulheres com IU apresentem e que possam ser barreiras à procura de ajuda especializada e à adesão aos tratamentos prescritos”.
O estudo foi desenvolvido pelos investigadores do William James Center for Research do Ispa, Marta Porto, Filipa Pimenta e João Marôco, e Teresa Mascarenhas, da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.
A IU tem tratamento, não é uma condição inevitável de quem teve filhos ou está a entrar em fase de menopausa e é possível recuperar o bem-estar depois do aparecimento de perdas de urina. O estudo revela que a forma como pensamos e lidamos com a doença pode influenciar a procura de tratamento e a adesão ao mesmo. Muitas das estratégias que as mulheres com IU utilizam para lidar com esta condição clínica podem provocar uma falsa sensação de controlo a curto prazo, que faz com que não procurem tratamento e, quando finalmente procuram ajuda médica, a única alternativa possível é um tratamento mais invasivo como, por exemplo, a cirurgia.
O estudo sugere que o tratamento conservador/não-invasivo da IU deverá contemplar componentes psicológicas como as crenças disfuncionais e estratégias de coping desadaptativas que, paralelamente à gravidade dos sintomas, afetam a qualidade de vida da mulher com IU na meia-idade. As políticas de saúde na área da incontinência urinária beneficiariam de uma componente multidisciplinar com médicos da especialidade e psicólogos para potenciar a adesão ao tratamento e, consequentemente, melhorar a eficácia das intervenções e o bem-estar da mulher.
Este trabalho foi financiado por fundos nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e Tecnologia, I.P., no âmbito do projeto UID/04810/2020.
PR/HN
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