Rui Cernadas Médico de Família

SNS: como chegamos a este ponto?

06/17/2024

 

Não nos faltam elementos e desilusões para análises sem fim ao SNS que se aproxima, ao que parece, também do seu “final”…

Como chegamos a este ponto com o nosso SNS?

 

Certamente que os laivos e propósitos de impulsos ideológicos, teorizados mas estatizantes, dominaram nos anos mais recentes. O final das Parcerias Público-Privadas (PPP) na Saúde, independentemente da perspectiva política, foi um desses infelizes exemplos.

O País nunca ouviu da boca dos seus governantes a explicação cabal das PPP na Saúde.

Como nunca escutou como eram muito diferentes das outras, designadamente as ligadas às auto-estradas e aos negócios que em torno delas se geraram. Como igualmente não percebeu porque a Justiça não apurou responsabilidades, se o Estado foi lesado, quer nas PPP da Saúde, quer nas ligadas às outras áreas da governação.

As diferenças ficavam provavelmente mais claras…

As PPP na Saúde foram uma abordagem inovadora que para a saúde aportou as vantagens e a eficiência da gestão privada, em serviços contratualizados para o SNS e os cidadãos, em patamares de qualidade e universalidade dos serviços prestados.

O seu fim por decisão politica e ideológica conduziu à saída imediata e perda de muitos profissionais qualificados e condenou áreas densamente povoadas à realidade, à triste realidade de ausência de resposta do SNS, a longas filas e horas de espera e a impaciência e desespero – vejam-se os casos flagrantes dos Hospitais de Braga ou Beatriz Ângelo, em Loures.

Na verdade, a função social do Estado é a disponibilização de serviços à população. No entanto, tal não implica nem obriga necessariamente a que, tais serviços sejam directamente assegurados por unidades da administração pública.

Ora as PPP da Saúde conduziram a ganhos substanciais em eficiência, rigor e maior capacidade de satisfazer as necessidades da população.

​Aliás, o Tribunal de Contas concluiu mesmo que os hospitais em PPP de Cascais, Braga, Vila Franca de Xira e Loures estavam plenamente integrados no SNS e obtiveram poupanças para o Estado, num relatório síntese e repetido sobre quatro auditorias realizadas à execução das PPP entre 2014 e 2019!

Outro ponto para reflexão tem a ver com a Lei de Bases da Saúde, publicada no reinado de António Costa e que, num país feudal, face a tantos problemas com o SNS levou à criação da Direção Executiva do SNS!

Ora isso traduz o cúmulo e a redundância suprema na maior centralização do SNS, com competências que potencialmente se sobrepõem ou entram em conflito com vários dos órgãos de governação do SNS – Administração Central do Sistemas de Saúde (ACSS), DGS ou ARS, estas últimas já extintas pelo Ministério de Manuel Pizarro sem salvaguarda prévia, informada e operacionalizada de profissionais e sobretudo responsabilidades e competências.

O imbróglio cresceu entretanto porque o Presidente da República não promulgou tal intenção, devolvendo-a ao actual Governo. E assim as ARS agonizam enquanto as ULS dançam sobre brasas por falta de conhecimento e experiência na gestão e suporte global dos Cuidados Primários!

O rumo certo será descentralizar, dar autonomia de gestão e a correspondente responsabilização às unidades de saúde. O que exige escolha criteriosa de gestores e correspondente responsabilização (também pública), conhecimento amplo do modelo e do sector, compromisso e avaliação com todas as consequências.

Mas os problemas, os recursos e as soluções podem variar de caso para caso.

Isto não aconteceu de facto e a Direcção Executiva do SNS seguiu, errada e contente, aumentando de modo cego e único o número de Unidades Locais de Saúde, num processo de centralização da gestão dos cuidados hospitalares e dos cuidados primários que não encontra evidência favorável e por igual assumiu centros hospitalares universitários e realidades geo-administrativas díspares.

Tenho noção de que esta municipalização da Saúde não promete nada de bom.

Portugal não tem qualquer tradição nem experiência de políticas municipais na saúde.

De resto conhecemos algumas situações em outros países, como na Suécia, onde existe tal histórico de gestão da Saúde pelo poder local e que acabaram por desembocar em processos de alienação e entrega de serviços públicos de saúde a entidades privadas.

Ou mais recentemente, ao nosso lado em Espanha, com os resultados desastrosos e trágicos com as “individualidades” e invenções das Comunidades Autónomas no combate à situação da pandemia SARS-CoV-2!

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