O Streptococcus pneumoniae, ou pneumococo, causa uma variedade de infeções, desde otites e sinusites até doenças mais graves, como meningite, sépsis e pneumonia. Crianças, idosos e imunocomprometidos estão entre as pessoas mais vulneráveis a estas infeções. Todos os anos, cerca de 300 mil crianças em todo o mundo perdem a vida devido a este agente patogénico.
Atualmente, conhecem-se mais de 100 variantes de S. pneumoniae, e nenhuma vacina consegue proteger-nos contra todas elas. Além disso, algumas destas bactérias já são resistentes aos antibióticos. Agora, um novo estudo publicado na revista científica Applied and Environmental Microbiology, da Sociedade Americana de Microbiologia, revela que algumas bactérias que vivem na nossa nasofaringe e orofaringe – isto é, nas regiões logo atrás da cavidade nasal e da boca, respetivamente – conseguem inibir a maioria das variantes de S. pneumoniae.
“Ao estudar a frequência de colonização por S. pneumoniae reparámos que algumas pessoas que não eram colonizadas por este agente patogénico estavam, no entanto, colonizadas por outras bactérias inofensivas, particularmente Streptococcus oralis e Streptococcus mitis”, explica Raquel Sá-Leão, responsável pelo laboratório de Microbiologia Molecular de Patogéneos Humanos no ITQB NOVA que liderou este estudo. Isto levou os investigadores a questionar se outros micróbios que residem na nossa nasofaringe e orofaringe poderiam limitar a presença de S. pneumoniae.
Para explorar esta possibilidade, a equipa avaliou a capacidade dos micróbios presentes em zaragatoas de 300 crianças e 300 adultos sem S. pneumoniae de inibir este agente patogénico.
“Da extensa lista de micróbios identificámos sete estirpes de S. oralis e S. mitis com uma forte atividade inibitória contra S. pneumoniae”, revela Sara Handem, uma das autoras do estudo, investigadora do ITQB NOVA. “Estas bactérias conseguem impedir a formação de biofilmes pneumocócicos – grupos de bactérias que se agarram à mucosa respiratória, formando uma comunidade mais resiliente ao sistema imunitário e aos antibióticos”, acrescenta.
A atividade antipneumocócica das estirpes de S. oralis e de S. mitis depende fortemente da produção de pequenas moléculas antimicrobianas chamadas bacteriocinas. “Para além de agirem contra a maioria das variantes dos pneumococos, é expectável que as bacteriocinas induzam menos resistência que os antibióticos e que sejam mais específicas atuando contra pneumococos, mas preservando a restante microbiota”, explica João Lança, também autor do estudo e investigador do ITQB NOVA.
“O nosso estudo apresenta uma estratégia promissora, tanto para complementar tratamentos já existentes, como de forma independente, de forma a reduzir a doença pneumocócica. Esta abordagem está alinhada com as recomendações da Organização Mundial da Saúde que destaca a importância de prevenir a colonização para combater a doença e a transmissão do pneumococo”, conclui Carina Valente, também autora do estudo e investigadora do ITQB NOVA.
A equipa já apresentou um pedido de patente provisório que abrange produtos farmacêuticos que contenham estas bactérias ou as suas moléculas inibidoras de pneumococos (PT119647).
Os próximos passos passarão por explorar o mecanismo de ação das bacteriocinas e avaliar a eficácia e segurança destas e dos micróbios que as produzem, utilizando modelos in vivo.
“Prevemos que os nossos resultados possam levar ao desenvolvimento de novas formulações probióticas, como sprays nasais”, conclui João Borralho, também autor do estudo e investigador do ITQB NOVA.
NR/PR/HN
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