O próximo mês de maio é ditado pelas eleições para a Assembleia da República. As eleições são a seiva da democracia, pelo que os custos financeiros imputáveis configuram um investimento, ao invés de uma despesa fútil.
Relativamente aos sistemas de saúde, a tradicional priorização dos cuidados curativos resulta, não só, do imperativo ético de intervir perante situações de doença aguda ou agudizada, mas também dos ciclos político-governativos vigentes, incompatíveis com resultados alcançáveis a longo prazo.
Os cuidados curativos permitem o fácil estabelecimento do nexo de causalidade entre a intervenção e o desfecho. Pelo contrário, os cuidados preventivos (de proteção e promoção da saúde) apresentam uma dilação temporal, no respeitante ao resultado pretendido, obnubiladora desta associação; acresce a multifatorialidade etiológica da doença crónica, traduzida numa complexa teia de causalidade.
Mesmo a vacinação, uma das maiores conquistas da Saúde Pública Global, apresenta constrangimentos valorativos: enquanto o tratamento da doença se traduz em ganhos facilmente percecionáveis (“estava mal, fiquei bem”), a prevenção primária mantém o estado de ausência de doença (“estava bem, mantenho-me bem”).
Há quase duzentos anos que o nosso País dispõe de uma rede de serviços operativos de saúde pública. Estes serviços são liderados por médicos que detêm o poder de intervenção, delegado pelo Estado (“delegados de saúde”), na defesa da saúde das populações.
À tradicional desvalorização político-governativa da missão dos serviços de saúde pública – organizados, nos termos da legislação vigente, a nível nacional (Direção-Geral da Saúde/DGS), regional e local – acresce a disrupção sistémica decorrente da alegada “maior reforma de sempre” do SNS.
A extinção das administrações regionais de saúde (ARS) levou ao colapso do nível regional dos serviços operativos de saúde pública. Estes encontravam-se sediados nos departamentos de saúde pública daqueles institutos públicos do Ministério da Saúde.
Tratou-se de um processo particularmente doloroso – irreversivelmente iniciado, em meados de 2022, pelo Governo António Costa. Os “cacos” das ARS foram dispersos pelos diversos serviços centrais do Ministério da Saúde, sendo que os respetivos departamentos de saúde pública foram integrados na DGS.
Perante o arrastamento da publicação da nova lei orgânica da DGS, no âmbito de um processo que vem sendo caraterizado pelo secretismo, a questão que se coloca tem a ver com o nível operativo regional dos serviços de saúde pública continentais: manter-se-á com capacidades próprias, que permitam uma efetiva intervenção regional (“delegação regional de saúde”); ou será reduzido a um mero apêndice do nível nacional, em jeito de extensão regional (“delegação regional”)?
O momento é de reflexão político-eleitoral. O futuro da proteção da saúde da população portuguesa depende da decisão que vier a ser sufragada eleitoralmente.
Uma coisa é certa: a Saúde Pública, enquanto esforço organizado em prol da saúde das populações, é de todos e para todos!
Não posso estar mais de acordo com o Dr. Lúcio Menezes de Almeida. A menorização dos Cuidados Primários e sobretudo da Saúde Pública na orgânica flutuante que foi criada há dois anos e mantida em banho maria neste último ano tem que ser fortemente rebatida. O mesmo com a necessidade premente de ter uma estrutura regional mínima não apenas para planeamento mas também para coordenação da gestão. Espero que o debate eleitoral faça acordar as consciências.