HealthNews (HN) – O que torna os jovens influenciadores tão importantes na mudança de comportamentos de saúde?
Leonor Quelhas Pinto (LQP) – A importância dos jovens, enquanto influenciadores na mudança de comportamentos de saúde, reside na sua capacidade de mobilização das suas comunidades e redes sociais. São agentes dinâmicos, capazes de moldar atitudes, hábitos e referências entre os seus pares. Esta capacidade representa, simultaneamente, uma mais-valia e uma grande responsabilidade, podendo também acarretar riscos, nomeadamente na disseminação de desinformação.
No contexto da saúde, a voz dos jovens tem um impacto particular. A proximidade geracional, a linguagem comum e a autenticidade das suas experiências tornam-nos veículos ideais para transmitir mensagens de promoção da saúde de forma eficaz. Quando um jovem partilha comportamentos saudáveis e atitudes positivas em relação à sua saúde, fá-lo não como uma autoridade distante, mas como um par — o que facilita a adesão dos demais.
Em particular no contexto digital, os jovens dominam, sendo utilizadores ativos das redes sociais, onde constroem comunidades, influenciam narrativas e participam no debate público. Esta competência digital transforma-os em aliados estratégicos para campanhas e projetos de promoção da saúde, sobretudo aqueles que ambicionam ter impacto junto das gerações mais novas.
HN – Que exemplos concretos temos, em Portugal ou no estrangeiro, de jovens a influenciar positivamente a saúde das suas comunidades?
LQP – Existem inúmeros exemplos, tanto em Portugal como no estrangeiro, de jovens que, com espírito crítico, capacidade de liderança e consciência cívica, contribuem de forma positiva para a saúde das suas comunidades. Estes jovens destacam-se pela capacidade única de identificar desafios emergentes e propor soluções inovadoras, sustentadas por um profundo sentido de responsabilidade social e compromisso com o bem-estar comum.
A juventude, reconhecida pela sua energia transformadora e perspetivas únicas, tem vindo a demonstrar uma postura cívica ativa, participando em projectos comunitários, campanhas de sensibilização e iniciativas de promoção de estilos de vida saudável. Estes esforços refletem um compromisso em responder aos problemas de saúde atuais, através de soluções concretas, baseadas em evidência e orientadas para o futuro.
Para além disso, os jovens assumem um papel fundamental na construção de políticas públicas mais justas e eficazes, trazendo para o debate público questões relevantes e propondo abordagens sustentáveis e inclusivas. A sua capacidade de mobilização e inovação torna-os agentes de mudança, capazes de influenciar positivamente as comunidades em que se inserem.
A sua participação ativa permite que as políticas públicas beneficiem de perspetivas inovadoras e assegurem a sua relevância numa sociedade em constante mutação.
Desta forma, o contributo da juventude para a saúde comunitária é um exemplo claro do seu poder transformador. Mais do que simples participantes, os jovens são protagonistas de ações concretas, que não só inspiram como impulsionam mudanças reais, garantindo que o futuro da saúde seja construído com a sua voz e orientado para as suas necessidades.
HN – A DGS tem atualmente programas ou iniciativas específicas dirigidas aos jovens para a promoção da saúde?
LQP – A participação dos jovens nos processos de promoção da saúde é fundamental para a construção de uma cidadania ativa e participativa. Enquanto agentes de mudança social, os jovens possuem a capacidade de multiplicar boas práticas nas suas redes sociais e comunitárias, reforçando o impacto das políticas públicas e garantindo a sua adaptação contínua às transformações sociais e demográficas.
Neste sentido, a Direção-Geral da Saúde (DGS), consciente da importância da participação jovem nos desafios emergentes de Saúde Pública, tem vindo a promover iniciativas específicas que potenciam o seu papel enquanto influenciadores sociais.
Um exemplo disso é o evento “Promoção da Saúde: Jovens como Influenciadores do Futuro”, desenvolvido em parceria com o Conselho Nacional de Juventude. Esta iniciativa convocou os jovens a assumirem um papel determinante na adoção e promoção de comportamentos saudáveis, cuja influência tem o potencial de se prolongar ao longo da vida e beneficiar as gerações futuras. Importa referir que este processo de co-construção com jovens materializou-se num White Paper, um documento estratégico que reflete as suas perspetivas e propostas para um futuro mais saudável e inclusivo.
Além disso, a DGS, em colaboração com o Fórum Nacional de Estudantes de Saúde, organizou um Hackathon de Estudantes de Saúde, focado no desenvolvimento de projetos inovadores de promoção da saúde. Esta iniciativa não só incentiva a criatividade e o espírito crítico dos estudantes, como também impulsiona soluções concretas e sustentáveis para os desafios de Saúde Pública.
Importa, de igual forma, destacar o Programa Nacional de Saúde Escolar, atualmente em processo de revisão, que está a ser repensado com base em processos de auscultação inclusivos, onde a participação ativa dos jovens é valorizada. Esta abordagem visa assegurar que as estratégias desenvolvidas sejam eficazes e ajustadas às verdadeiras necessidades, refletindo uma visão partilhada e construída em conjunto para responder aos desafios em saúde.
Deste modo, a DGS demonstra um claro compromisso em envolver os jovens nas decisões que moldam o futuro da saúde, reconhecendo neles o potencial para influenciar positivamente as suas comunidades e fortalecer as políticas de saúde.
HN – Que estratégias considera fundamentais para capacitar e motivar os jovens para serem agentes de promoção da saúde?
LQP – Capacitar os jovens para este papel implica, em primeiro lugar, reconhecê-los como parceiros legítimos no processo. Uma estratégia verdadeiramente eficaz deve começar por escutar as suas preocupações, experiências e ideias, e envolvê-los desde o desenho até à implementação das iniciativas.
É essencial oferecer-lhes formação prática, acessível e apelativa, com recurso a metodologias participativas, onde o diálogo, a criatividade e a colaboração estejam presentes. As ações de capacitação devem valorizar a promoção de Literacia em Saúde, o pensamento crítico e a liderança jovem, proporcionando-lhes ferramentas para intervir de forma autónoma e responsável.
De igual modo, torna-se crucial criar ambientes inclusivos e seguros, onde os jovens sintam liberdade para se expressarem, experimentarem e aprenderem com os erros. O apoio de mentores e facilitadores, a par de oportunidades reais para liderarem projetos, aumenta a sua motivação e sentido de pertença.
A utilização estratégica das redes sociais como instrumento de influência positiva é também uma via incontornável. Os jovens devem ser incentivados a u lizar estas plataformas para disseminar boas práticas, desmistificar mitos e gerar consciência crítica, através de conteúdos produzidos por e para jovens.
HN – Que desafios e obstáculos antecipa para o reforço deste papel dos jovens?
LQP – Um dos principais desafios prende-se com o idadismo, ou seja, a tendência de desvalorizar ou infantilizar a participação dos jovens, não reconhecendo plenamente a sua capacidade de intervenção. Este preconceito, muitas vezes inconsciente, ainda persiste em diversas instituições e constitui um entrave sério ao empoderamento juvenil.
Outro obstáculo relevante consiste na falta de continuidade e sustentabilidade dos projectos. Muitas iniciativas dependem de financiamentos pontuais, carecendo de visão estratégica e a longo prazo. Esta instabilidade fragiliza o envolvimento dos jovens, que necessitam de sentir que o seu investimento pessoal é valorizado e terá um impacto duradouro.
Adicionalmente, as desigualdades socioeconómicas e territoriais condicionam o acesso dos jovens a oportunidades de participação. Jovens em contextos vulneráveis enfrentam barreiras acrescidas, como acesso limitado à informação ou a espaços de decisão.
Por fim, num ambiente digital de sobrecarga informativa, torna-se difícil destacar mensagens de saúde entre tantos estímulos. Sem uma comunicação estratégica e envolvente, as mensagens podem passar despercebidas ou perder relevância.
HN – Que mensagem gostaria de deixar aos jovens que querem ser protagonistas na construção de um futuro mais saudável?
LQP – A minha mensagem é clara: o vosso papel é essencial e insubstituível. A promoção da saúde precisa de novas vozes, novas ideias e novas formas de agir — e ninguém melhor do que nós, jovens, para liderar esse caminho.
Sejam curiosos, proativos e irreverentes. Informem-se, questionem, partilhem e inspirem. Cada ação, por mais pequena que pareça, pode ser o início de uma grande transformação. Acreditem no vosso poder de influência. O futuro constrói-se com convicção, e é no presente que se começam a mudar mentalidades.
Lembrem-se: acreditar na mudança é o primeiro passo — e ao tomarem essa iniciativa, estarão a abrir caminho para um mundo mais saudável, justo e inclusivo.
HN – E que conselho deixaria às instituições que pretendem apoiar e trabalhar com os jovens nesta área?
LQP – Às instituições, deixo um apelo claro: não trabalhem apenas para os jovens, trabalhem com os jovens. O seu envolvimento deve ser genuíno, estruturado e continuo. É essencial criar espaços de participação efetiva, onde os jovens possam contribuir com as suas ideias, liderar iniciativas e ser reconhecidos pelo seu impacto.
É igualmente importante investir na formação de técnicos e equipas multidisciplinares, para que saibam como facilitar processos participativos, comunicar eficazmente com a juventude e criar contextos inclusivos e motivadores.
Outro aspecto fundamental é assegurar a sustentabilidade dos projectos. Isso implica garantir financiamento estável, estruturas de apoio duradouras e uma visão estratégica que vá além de campanhas pontuais. A consistência gera confiança — e a confiança é a base para uma colaboração frutuosa com os jovens.
Por fim, convoco as instituições a valorizarem a pluralidade da juventude: ouvir diferentes vozes, de diferentes contextos, é o caminho para respostas verdadeiramente eficazes e representativas. Só assim será possível construir, com os jovens, uma sociedade mais equitativa e promotora da saúde para todos.
entrevista de Antónia Lisboa
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