Uma equipa multidisciplinar composta por investigadores da University of Southern California (USC), do Microsoft AI for Good Research Lab, da Amref Health Africa e do Ministério da Saúde do Quénia desenvolveu um modelo de inteligência artificial (IA) capaz de prever com elevada precisão a desnutrição aguda infantil até seis meses antes de ocorrer. O sistema, testado em mais de 17 mil unidades de saúde quenianas, utiliza dados clínicos recolhidos pelo sistema nacional DHIS2 e integra imagens de satélite sobre vegetação e produtividade agrícola, permitindo identificar zonas e períodos de risco com antecedência sem precedentes.
A iniciativa é liderada por Laura Ferguson, diretora de investigação do USC Institute on Inequalities in Global Health, e conta com a colaboração de Bistra Dilkina, professora associada de ciência computacional e co-diretora do USC Center for AI in Society. O desenvolvimento contou ainda com o contributo de Girmaw Abebe Tadesse, principal cientista do Microsoft AI for Good Lab, e de Samuel Mburu, responsável pela transformação digital na Amref Health Africa, entre outros especialistas.
O modelo atingiu 89% de precisão nas previsões a um mês e 86% a seis meses, superando significativamente as abordagens tradicionais baseadas apenas em tendências históricas. Esta inovação permite antecipar flutuações e surtos inesperados de desnutrição, fenómeno que afeta cerca de 5% das crianças quenianas e constitui uma emergência de saúde pública, segundo o inquérito demográfico de 2022.
Laura Ferguson sublinha que “a ferramenta foi desenhada para prever a desnutrição a nível regional e apoiar estratégias preventivas e de tratamento mais eficazes”. Já Bistra Dilkina destaca que “este modelo é revolucionário, pois permite capturar relações complexas entre múltiplas variáveis, melhorando substancialmente a capacidade de previsão”.
O sistema pode ser adaptado a mais de 125 países que utilizam o DHIS2, incluindo cerca de 80 nações de baixo e médio rendimento onde a desnutrição infantil continua a ser uma das principais causas de mortalidade. Samuel Mburu reforça a importância de alinhar esforços entre saúde, agricultura e gestão de desastres, defendendo também o investimento contínuo em infraestruturas digitais e formação.
Apesar dos avanços, especialistas alertam para limitações na qualidade dos dados clínicos, já que a monitorização da desnutrição infantil depende da existência de tratamento nas unidades de saúde. Ainda assim, a integração de dados de vegetação e saúde pública representa um salto qualitativo na capacidade de resposta a uma crise que, só no Quénia, afeta centenas de milhares de crianças todos os anos.
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