“Infelizmente, pudemos verificar que pelo menos 87% dos idosos encontram-se numa situação de pobreza”, afirmou, aos jornalistas, a porta-voz da ONG, que há 15 anos desenvolve projetos para populações vulneráveis, como mulheres e idosos.
Para Francelia Ruiz, este é “um fenómeno multidimensional” em que “várias coisas confluem”, levando este grupo populacional a enfrentar uma “situação de especial vulnerabilidade e risco no contexto venezuelano”, de acordo com uma investigação da ONG.
A atribuição de uma pensão, “aparentemente, a única política de atenção abrangente para os idosos” na Venezuela, “não tem o poder aquisitivo para satisfazer as necessidades mais básicas de alimentação e medicamentos, mas também para pagar habitação, recreação e condições de vida mínimas para o bem-estar deste grupo”, explicou.
Ruiz precisou ainda que um outro fator importante é o isolamento, consequência do fenómeno migratório venezuelano, uma vez que a maior parte da população migrante e produtiva é jovem.
“Muitos idosos ficaram numa situação de solidão e, noutros casos mais alarmantes, numa situação de abandono, sem um grupo de referência que os possa apoiar em caso de emergência (…) sem meios para receber ajuda, além da que podem proporcionar a si próprios”, disse a responsável.
Em muitos casos, estes idosos ficaram a cargo de outros idosos, de pessoas com deficiência, ou crianças e adolescentes, o que torna muito mais difícil subsistir em termos de qualidade, explicou.
A Convite indicou que há ainda restrições no acesso aos serviços de saúde, num país em que o sistema público de saúde “está deteriorado e devastado”, as pessoas têm medo de ir aos hospitais e “apenas 2% dos anciãos tem uma apólice de seguro de saúde privado”.
Além disso, “em termos de políticas sociais, os idosos dependem da atribuição dos bónus oferecidos através do sistema de Pátria, que são discricionários, porque não se conhece qual a política e metodologia de atribuição, se as pessoas recebem por ter sido registadas por um estudo socioeconómico”.
Francelia Ruiz apontou ainda a existência de uma “dependência que tem um elevado grau de controlo político”, a das “caixas CLAP” [alimentos subsidiados pelo Estado], que contêm principalmente hidratos de carbono, dificultando uma dieta que satisfaça as necessidades proteicas e nutricionais dos anciãos.
A Convite denunciou que 74% da população idosa ativa está fora da economia formal, do mercado laboral formal, com os homens a exercer ofícios de pedreiros ou eletricistas, de taxista no caso de terem um veículo, mas com implicações em termos de segurança.
“No caso das mulheres idosas, enfrentam encargos desproporcionados na prestação de serviços domésticos, em casas de família, a lavar e passar roupa ou cuidar de crianças (…), aceitando pagamento de uma remuneração muito baixa ou serviços a troco de um frango ou um [pacote] de arroz, para assegurar a própria sobrevivência”, explicou.
Sobre as remessas que os anciãos recebem dos familiares emigrados, precisou que ao longo de 2019 e em princípios de 2020 foram um contributo significativo, que caiu devido à pandemia da covid-19.
“Muitas pessoas no estrangeiro viram os seus rendimentos reduzidos, perderam os seus empregos e muitas tiveram de regressar ao país e isso significou que o peso das remessas foi reduzido, o que teve impacto na possibilidade de os idosos adquirirem serviços básicos fundamentais”, explicou.
Os últimos dados de organizações internacionais, incluindo a ONU, indicam que pelo menos seis milhões de venezuelanos abandonaram o país desde 2015.
LUSA/HN
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