Dados avançados à agência Lusa pela Clínica dos Arcos referem que, em 2023, esta unidade privada recebeu 4.547 mulheres reencaminhadas pelo Serviço Nacional de Saúde (SNS), mais 681 relativamente ao ano anterior.
Nos últimos seis anos, a referenciação de hospitais públicos para esta clínica aumentou 51,7%, passando de 2.997 mulheres em 2018, para 4.547 em 2023.
Já o número de mulheres que recorreram por iniciativa própria à Clínica dos Arcos para fazer a Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG) tem-se mantido estável em cerca de mil por ano.
Segundo o Relatório de Análise dos Registos das Interrupções da Gravidez da Direção-Geral da Saúde, em 2022, registaram-se 15.870 IVG, mais 15% face ao ano anterior.
“Em 2022, apesar de a maior parte das interrupções da gravidez por opção da mulher nas primeiras 10 semanas de gravidez continuarem a ser realizadas em instituições públicas, a percentagem registada foi de 68,6%, diminuindo ligeiramente relativamente aos anos anteriores”, lê-se no documento
Numa conferência de imprensa da UMAR em Lisboa sobre o referendo de 11 de fevereiro de 2007 pela despenalização do aborto e a aplicação da lei, a ginecologista-obstetra Maria José Alves defendeu que o SNS tem de garantir esta resposta às mulheres.
“Não vamos diabolizar aquilo que a Clínica dos Arcos faz, só que eu acho que o Serviço Nacional de Saúde tem de ser o garante das boas práticas”, além de ser “a garantia de que as mulheres, quando recorrem ao aborto, têm também serviços de contraceção” de acordo com a sua escolha para evitar outra gravidez não desejada.
Maria José Alves adiantou que “muitas vezes”, quando há carências de profissionais nos hospitais, a realização da IVG passa “para segundo plano e os médicos são destacados para outras tarefas”.
Outro problema é a objeção de consciência, disse Maria José Alves.
A especialista defende que os médicos devem declarar por escrito à direção de cada instituição se são ou não objetores de consciência para que os serviços possam saber se têm “pessoal suficiente para dar seguimento aos procedimentos que forem necessários”.
Para a médica, os hospitais que necessitam de aumentar os recursos nas consultas de IVG devem abrir um concurso para médicos que não sejam objetores de consciência.
“Às vezes as pessoas pensam que isto é discriminar os objetores de consciência, mas na realidade não é. Se as pessoas precisarem de um médico que faça ecografias”, abrem um concurso para esse perfil, exemplificou Maria José Alves na conferência de imprensa, em que estiveram também Ana campos e Idalina Rodrigues, médicas que estiveram envolvidas na luta pela despenalização do aborto.
Ana Campos defendeu, por seu turno, “a contabilização correta” de todos os objetores de consciência no SNS para que as estruturas de saúde possam responder “em tempo útil” a um direito das mulheres.
Para a especialista, “não é admissível que haja serviços inteiros com objetores de consciência”, como acontece, por exemplo, em dois hospitais em Lisboa e Vale do Tejo.
Ana Campos apelou ainda para que seja refeita a rede de referenciação, que já não existe em Portugal, para que todos os técnicos que atendem as mulheres saibam responder e indicar-lhes “o sítio devido, respeitando a individualidade de cada pessoa” e o sigilo.
Já a vice-presidente da UMAR, Idalina Rodrigues, lembrou que a despenalização do aborto até às 10 semanas no SNS foi “uma vitória” para as mulheres e “um passo de gigante na sua autonomia na saúde sexual e obstétrica”.
“Por isso, nós pensamos que não podemos deixar passar esta grande vitória, porque olhar o passado com os olhos postos no futuro permitirá às mulheres ganharem a força para seguir em frente”, declarou a médica.
LUSA/HN
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