Porque é que a pandemia de COVID terminou tão abruptamente?

6 de Outubro 2024

Uma nova análise sugere que uma queda dramática nas mortes por COVID-19 entre 2022 e 2023 pode ser atribuída a uma transição de fase abrupta na estrutura molecular da proteína spike (também conhecida como proteína S. É uma estrutura que se projeta da superfície de alguns vírus, incluindo o SARS-CoV-2, o vírus responsável pela COVID-19.

Esta proteína desempenha um papel crucial na capacidade do vírus de infetar as células hospedeiras e, consequentemente, na sua patogenicidade) do vírus. Esta descoberta, publicada na revista EPJ B por Marcelo Moret do CIMATEC no Brasil e James Phillips da Universidade Rutgers, em Nova Jersey, oferece uma visão importante sobre como a pandemia terminou tão rapidamente e pode ajudar-nos a preparar para futuras pandemias.
Durante o inverno de 2020 e 2021, os EUA viram as mortes por COVID-19 atingirem 250.000. No ano seguinte, este número aumentou em um terço para 330.000. Mas de agosto de 2022 a março de 2023, o número de mortes relacionadas com a COVID-19 caiu abruptamente para apenas 80.000, terminando abruptamente a pandemia de COVID. Este declínio dramático não pode ser atribuído apenas às vacinas, que já estavam amplamente disponíveis desde a primavera de 2021.
A proteína spike se projeta das superfícies de vírus como o da COVID-19 e facilita a entrada nas células hospedeiras, ligando-se a recetores específicos nas membranas celulares. À medida que o vírus sofre mutações, essas proteínas podem mudar rapidamente: melhorando a capacidade do vírus de se ligar aos recetores, mas, em alguns casos, tornando-o menos letal.

No seu estudo, Moret e Phillips examinaram a ligação entre mutações e taxas de mortalidade. Foi assim que descobriram que uma transição de fase na estrutura molecular da proteína spike – comparável às transições entre fases da matéria na física – poderia ser diretamente responsável pela queda súbita de fatalidades. Esta transição de fase ocorreu em novas estirpes da variante Ómicron que surgiram em 2023, que apresentavam apenas 5 mutações adicionais em relação à variante Ómicron original.
O estudo da dupla de investigadores sugere que esta transição alterou os mecanismos de ligação do vírus no trato respiratório superior – as passagens que conectam o nariz, a boca e a garganta – tornando as infeções graves menos prováveis. Esta descoberta não só melhora a nossa compreensão da evolução da contagiosidade da COVID-19, mas também oferece lições valiosas para nos prepararmos para futuras pandemias.
A transição de fase na proteína spike pode ter ocorrido devido a uma combinação específica de mutações que alteraram a conformação da proteína. Essas alterações na estrutura podem ter afetado a capacidade do vírus de se ligar aos recetores celulares e de entrar nas células, resultando em infeções menos graves.
Além disso, a descoberta destaca a importância de monitorizar de perto as mutações virais e a sua relação com a gravidade da doença. Compreender como as mudanças na estrutura das proteínas virais podem afetar a patogenicidade pode ajudar os cientistas a prever a trajetória de uma pandemia e a desenvolver estratégias de mitigação mais eficazes.
No entanto, os investigadores salientam que são necessárias mais pesquisas para solidificar estas teorias e fornecer informações mais profundas sobre como as futuras pandemias podem evoluir. Estudos adicionais sobre a estrutura molecular da proteína spike e a sua interação com as células hospedeiras podem revelar mais detalhes sobre os mecanismos subjacentes a esta transição de fase e as suas implicações para a transmissão e gravidade da doença.

Bibliografia: M A Moret, J C Phillips, Why and How Did the COVID Pandemic End Abruptly? Eur. Phys. J. B 97:123 (2024). https://doi.org/10.1140/epjb/s10051-024-00733-0
HN/Alphagalileo

 

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