“Portugal não pode fechar. Não podemos neste momento não ter respostas para as outras doenças e, neste caso, para as pessoas que vivem com o VIH [vírus da imunodeficiência humana]. Temos de ter soluções para as pessoas que vivem com outras infeções e temos de nos organizar com as pessoas que estão no terreno, a sociedade civil e os ‘pensadores’. Mais do que os custos, são os ganhos de saúde que importam”, afirma, em entrevista à Lusa, no dia em que a instituição cumpre 30 anos.
Para Maria Eugénia Saraiva, a imposição de medidas de cariz mais autoritário ou repressivo pelo Governo para o controlo da pandemia pode mesmo acabar por ter um efeito inverso àquilo que é pretendido, apelando à defesa de uma ‘vacina da tolerância’ e a um “diálogo efetivo” e com “objetivos mensuráveis” entre os diferentes intervenientes.
“É importante alertar que o proibicionismo e o autoritarismo face ao que estamos a viver não é o caminho para muitas destas pessoas. A resposta, muitas vezes, é contrária àquilo que nós pensamos que poderá ser o caminho. Cada vez mais, temos de estar ligados para percebermos como é que poderemos ultrapassar todos estes obstáculos e que não nos parece que terá um termo tão rápido quanto seria desejável”, explica a psicóloga clínica e presidente da organização desde 2006.
A chegada da pandemia em Portugal em março impôs “reajustamentos” à LPCS, que nunca parou a atividade. Aliás, Maria Eugénia Saraiva garante que a organização se mostrou “bastante ativa” na apresentação de “respostas sociais”, com o levantamento de medicamentos desde as farmácias comunitárias ou a realização de compras de bens essenciais de supermercado para apoiar utentes.
“Com o adiamento de consultas ou de realização de análises, a LPCS teve de alargar o horário da Linha SOS Vida. Houve também um aumento das necessidades de apoio social e psicológico; as pessoas responderam ao isolamento físico e esqueceram-se de que o isolamento social é diferente. As imensas chamadas que surgiram com dúvidas em relação ao VIH e à covid-19 serviram, muitas vezes, apenas para falar com a psicóloga e para desabafar”, acrescenta.
Sem deixar de traçar “um paralelismo” entre o VIH de há 30 anos e a atual pandemia de covid-19, a líder da LPCS defende que o papel da organização passa por “responder dentro das suas hipóteses” a todas as pessoas, nomeadamente aos mais “vulneráveis e fragilizados”.
Ato contínuo, Maria Eugénia Saraiva alerta o ministério da Saúde para o risco de negligenciar a assistência a outros doentes e para uma degradação generalizada da saúde mental.
“O VIH é também uma preocupação que merece atenção, independentemente da covid-19. Temos feito acompanhamento diário de todos os utentes que são da LPCS, mesmo aqueles que surgiram de novo ou que nunca a tinham contactado. E reatámos rastreios, que são importantes”, notou, relevando também o aumento nas “necessidades de apoio social e psicológico” e a tentativa de “manter as pessoas em tratamento e com acesso a medicação”.
“Muitas pessoas já perderam os seus empregos e outras vão perder. É uma preocupação, na medida em que estar doente fisicamente é também estar doente mentalmente; nesse sentido, promovemos a prevenção da doença e a promoção da saúde”, sentencia.
Portugal contabiliza pelo menos 2.276 mortos associados à covid-19 em 112.440 casos confirmados de infeção, segundo o último boletim da Direção-Geral da Saúde (DGS).
NR/HN/LUSA
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