Paulo Seabra
Doutor em Enfermagem, Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica, Professor Coordenador na Escola Superior de Enfermagem de Lisboa, Investigador no Centro de Investigação, Inovação e Desenvolvimento em Enfermagem de Lisboa (CIDNUR).

A saúde, a saúde mental e o bem-estar dos enfermeiros portugueses

03/12/2025

Quando se reflete sobre a qualidade dos cuidados de saúde e os múltiplos profissionais envolvidos, muitas vezes não se tem a devida atenção ao facto de que no âmbito das profissões de saúde, os enfermeiros representam, à escala mundial, e também em Portugal, o maior grupo profissional.  São reconhecidos os fatores que influenciam a saúde física e mental destes profissionais, nomeadamente o trabalho por turnos, o número de horas de trabalho, a dificuldade em conciliar a vida pessoal com a vida familiar (Clendon & Walker, 2013; Nasrabadi, Seif, Latifi, Rasoolzadeh, & Emami, 2009). Alguns destes fatores estão identificados como tendo impacto negativo na qualidade e segurança dos cuidados que prestam às pessoas (Schulz et al., 2011) e em alguns países estão ligados aos elevados dias de absentismo laboral e até abandono da profissão.

Em Portugal, e na linha de estudos sobre o bem-estar, o burnout e a saúde mental dos profissionais de saúde, foi realizado em 2017 por investigadores da Escola Superior de Enfermagem de Lisboa, Investigador no Centro de Investigação, Inovação e Desenvolvimento em Enfermagem de Lisboa (CIDNUR), em parceria com a Faculdade de Ciências da Saúde e de Enfermagem da Universidade Católica, um estudo que deu a conhecer que dois terços dos enfermeiros tinham uma perceção negativa da saúde mental. Destes, 22,4% relataram sintomas de depressão grave; 69,5% indicaram sintomas somáticos significativos; 76% apresentaram ansiedade e insónia; e 88,8% apresentaram algum tipo de disfunção social (Seabra et al., 2019). Depois disto surgiu a pandemia por Covid-19, que segundo alguns estudos, acentuou um vasto conjunto de stressores, com prejuízo acrescido para a saúde mental deste grupo profissional.

O estudo foi replicado em 2024 e de forma inequívoca os dados agravaram-se: três quartos (74,3%) percecionam negativamente a sua saúde mental. São mais 15,3%; 28,8% tem a perceção de sintomatologia de depressão grave (mais 6,4%); 79,4% têm perceção de sintomatologia somática (mais 9,9%); 87,4% têm perceção de ansiedade e insónia (mais 11,4%); 91,4% tem perceção de disfunção social (mais 2,6%).

Apurou-se ainda que os enfermeiros agravaram as dificuldades em relação ao sono, a fadiga e a compatibilização da vida pessoal com a profissional, com particular destaque nos mais jovens. O trabalho por turnos mantém-se associado a perceção mais negativa de saúde mental.

Estes resultados, são suficientemente relevantes e preocupantes para justificar uma atenção continuada à evolução da saúde mental dos enfermeiros portugueses, e são suficientemente relevantes para que a população tenha conhecimento. Esperam os melhores cuidados dos profissionais, que em alguns estudos têm sido destacados como um dos que as populações mais confiam. São necessárias intervenções adequadas para a promoção da saúde mental assim como a melhoria das condições de trabalho.  Este tema a todos deve preocupar.

Referências

– Seabra P, Lopes JO, Calado M, Capelas M. (2019). A national survey of the nurses’ mental health — The case of Portugal. Nursing Forum. 54: 425-433. https://doi.org/10.1111/nuf.12350

– Schulz M, Damkröger A, Voltmer E, et al. Work‐related behaviour and experience pattern in nurses: impact on physical and mental health. J Psychiatr Ment Health Nurs. 2011;18(5):411‐417. https://doi.org/10.1111/j.1365‐2850.2011.01691.x.

– Clendon, J., & Walker, L. (2013). Nurses aged over 50 years and their experiences of shift work. Journal of Nursing Management, 21(7), 903–913. http://doi.org/10.1111/jonm.12157

– Nasrabadi, A. N., Seif, H., Latifi, M., Rasoolzadeh, N., & Emami, A. (2009). Night shift work experiences among Iranian nurses: a qualitative study. International Nursing Review, 56(4), 498–503. http://doi.org/10.1111/j.1466-7657.2009.00747.x

 

 

 

 

 

 

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