Rita Matos: TestConnect ajuda empresas e instituições a retomar atividade facilitando o acesso à testagem preventiva à Covid-19

03/26/2021
Através de uma rede de 77 laboratórios de testagem e uma empresa de Higiene e Segurança no Trabalho, a TestConnect –www.testconnect.pt – está disponível para dar resposta a pedidos de testes à Covid-19 em Portugal, ajudando empresas e instituições a retomar atividade. A mentora e voluntária Rita Matos falou-nos do desenvolvimento do projeto e do que ainda falta alcançar.

A plataforma – www.testconnect.pt foi desenvolvida por engenheiros de software e designers digitais voluntários entre maio e novembro de 2020. Hoje, o voluntariado continua a sustentar o projeto, que conta com profissionais de várias áreas que acreditam que a testagem preventiva e regular é a melhor forma de controlar a pandemia de Covid-19. Através de uma rede de 77 laboratórios de testagem e uma empresa de Higiene e Segurança no Trabalho, a TestConnect está disponível para dar resposta a pedidos de testes à Covid-19 em Portugal, ajudando empresas e instituições a retomar atividade. A mentora e voluntária Rita Matos falou-nos do desenvolvimento do projeto e do que ainda falta alcançar.

 

HealthNews (HN)- Como funciona a TestConnect?
Rita Matos (RM)- A TestConnect, enquanto plataforma, funciona de forma muito simples. O registo no site é rápido e é gratuito para qualquer empresa e para qualquer instituição. O objetivo é agilizar o processo de testagem da Covid-19, mas promovê-la de forma planeada, com períodos regulares. O acompanhamento na testagem é realizado por laboratórios – laboratórios que os portugueses conhecem – e algumas outras entidades certificadas pela DGS, que primam por estarem próximos das pessoas e próximos das empresas.

Processa-se da seguinte maneira: após o primeiro login, o utilizador associa a empresa ao seu perfil, preenchendo os campos do formulário, e, de seguida, faz o pedido de acompanhamento na plataforma. Deverá, então, esperar que um laboratório da mesma região visualize o pedido e entre em contacto. O laboratório propõe um plano de testagem que vai ao encontro das necessidades específicas da organização requisitante.

HN- A plataforma foi criada com que propósito?
RM-
 Na fase em que a plataforma foi criada, o objetivo era essencialmente simplificar o processo de testagem, reduzir o tempo de acesso aos testes e dar visibilidade às entidades que os realizam.

O projeto era já uma realidade quando decidimos que estava na hora de desenvolver a plataforma. A ação dos voluntários no terreno acontecia através do contacto (por telefone, email) com instituições que prestam cuidados de saúde a idosos, onde as consequências da pandemia mais se faziam sentir. Sensibilizávamos para a importância do diagnóstico atempado dos casos positivos, de forma a evitar os contágios. E então, contactávamos os laboratórios nas imediações e propúnhamos o acompanhamento das instituições para a realização de testes semanais/quinzenais. Desta forma, fomos estabelecendo parcerias com alguns laboratórios e procurámos alargar a rede, de forma a chegar a mais instituições, noutros locais.

HN- Quais foram ou são os principais desafios do projeto?
RM-
 Em cenário de pandemia, a única constante é a mudança. Esse foi um ensinamento que cedo retirámos da nossa experiência.

Durante a fase de terreno do projeto, os desafios sucediam-se uns aos outros. Se hoje estamos em confinamento, amanhã, tendo o vírus dado sinais de tréguas, as autoridades de saúde dão luz verde à reabertura das visitas nos lares, no mesmo dia em que abrem as escolas e restaurantes.

Estávamos em maio de 2020, o projeto tinha pouco mais de um mês, e tínhamos então recebido cerca de 150 pedidos de ajuda de IPSS e ERPI. Fazer contactos, ouvir, interpretar as dores das instituições leva tempo; educar para a prevenção, também. O contexto político e social não ajudava. As informações contradiziam-se sobre as medidas de controlo da infeção, sobre a pertinência de realizar testes para evitar a sua evolução, ou mesmo sobre o entendimento de que era pertinente utilizar testes. Era grande a descrença, e a investigação, insuficiente.

Foi preciso sermos persistentes. Avançámos com o grosso do desenvolvimento da plataforma durante um período calmo, numa altura em que os portugueses baixavam também a guarda. O Verão ajudou-nos a ganhar perspetiva, e aproveitámos para fortalecer algumas parcerias. Em novembro, já tínhamos um primeiro produto viável da plataforma. Por outras palavras, um protótipo, que apesar de tudo era funcional – servia o propósito. Esse mês e os que se seguiram foram negros para as instituições que prestam cuidados a idosos. Por isso, pusemos a plataforma online, ainda que um bocado tosca no início. Fomos depois aprimorando, acrescentámos funcionalidades e melhorámos a experiência.

No entanto, a noção de que a testagem preventiva seria uma resposta eficaz para controlar os contágios em espaços de exposição social começou a ser mais ostentada pelos peritos a partir do início deste ano; pela DGS, em meados de fevereiro. Ainda assim, no período de dezembro, janeiro e fevereiro, quase quadruplicaram o número de mortes a lamentar, se comparado com o restante tempo de pandemia.

No dia 4 de janeiro, a plataforma TestConnect estava também preparada para receber empresas, e os voluntários de marketing e comunicação do projeto já tinham começado a revelar ao país que o âmbito da nossa resposta tinha sido alargado. O pressuposto é que as empresas com portas abertas e funcionários ao serviço são locais de potencial contágio. Onde a saúde está em risco, está também comprometida a segurança do negócio.

Estamos novamente agora a experimentar um desconfinamento, desta vez gradual. Começa, por isso, a existir maior procura da plataforma por parte de empresas com instalações abertas, outras na iminência de reabrir e que querem ter acesso a planos de testagem. Será este o momento em que a plataforma e o projeto podem ter real utilidade para massificar a testagem nas empresas.

HN- Por que é esta iniciativa importante e inovadora?
RM-
 Como vim referindo, nós disponibilizamos a solução, materializada numa plataforma, para uma necessidade que se sente e para a qual já há procura. Não sobram muitas dúvidas de que a testagem rotineira é o caminho a seguir para sermos assertivos no desconfinamento e na reabertura gradual das atividades.

Orgulho-me de constatar que o grupo que criou esta iniciativa pensou à frente do tempo. Apesar dos obstáculos e de algumas desilusões no percurso, mantivemo-nos coesos e focados. A equipa procura manter o sentido de inovação presente, estamos atentos à constante evolução da pandemia, às decisões tomadas pelo governo português, a opiniões de especialistas. Consultamos os nossos parceiros, e outros “amigos” do projeto, entendidos na matéria. Empenhamo-nos na nossa estratégia de comunicação, para sensibilizar mais e melhor. Desenvolvemos também com frequência novas funcionalidades na plataforma. Temos flexibilidade para o fazer, o que pode ser paradoxal, já que a equipa do projeto é composta por voluntários. E não tivemos financiamento, nem qualquer tipo de apoio. Mas, provavelmente, o maior obstáculo de uma iniciativa financiada não estaria no arranque, mas em cada incremento.

Ainda que o início tenha sido tumultuoso, ao fim de um ano de caminho, certamente teremos descoberto a fórmula responsável por conferir solidez e confiança no trabalho que desenvolvemos juntos. Temos no projeto gente muito competente. Uma junção improvável, quando o grupo surge com uma maioria de profissionais de saúde e investigadores e evolui com a participação de engenheiros informáticos, designers, especialistas de marketing e comunicação. A TestConnect poderia ser, metaforicamente, uma manta de retalhos, mas faz falta um abrigo quando o vento se levanta no deserto.

HN- Existem projetos semelhantes com bons resultados noutros países?
RM- 
Existem várias iniciativas que assentam na testagem regular um pouco por todo o mundo. Quando o projeto nasceu, em março de 2020, apoiámo-nos em exemplos de sucesso. Em diversas localidades, a testagem massiva permitiu rapidamente recuperar o controlo da evolução dos casos de infeção por Covid-19. Em Portugal, temos o exemplo dos Açores, que mantiveram um rastreamento persistente e números sempre baixos de novas infeções. Em países nórdicos, como a Islândia, o bom exemplo é dado desde uma fase precoce da pandemia. Recentemente, constatámos que o Reino Unido testa cerca de cinco a sete vezes mais que nós e que a Áustria tem uma estratégia de testagem mais consistente nas escolas.

Poderão existir, noutros países, websites ou plataformas online que facilitem a testagem. Mas não preciso de fazer qualquer pesquisa rápida no Google para afirmar que o DNA da TestConnect é único. A TestConnect é diferenciadora porque: reúne num único local os principais laboratórios que fazem o diagnóstico da Covid-19; é de simples utilização, é gratuita e permite encontrar a resposta que as empresas procuram, em qualquer parte do país; são os laboratórios que acompanham as empresas na realização dos testes; é uma plataforma colaborativa. Quer isto dizer que, na prática, todas as empresas que se registam estão a proporcionar o acesso facilitado à testagem. É desta forma possível a combinação de testes de elevada fiabilidade a um preço acessível.

HN- Têm ainda planos por concretizar?
RM- 
Sem dúvida. Aquilo que fizemos até hoje enquanto equipa foi muito positivo, e a prova disso é podermos assumir publicamente esta plataforma como aquilo que lutámos para que fosse. Contamos com parcerias com entidades e laboratórios portugueses que acreditam na forma como o projeto está pensado, que confiam no nosso trabalho. É uma confiança mútua. Será agora preciso conseguir que o projeto cumpra o propósito de massificar efetivamente a testagem nas empresas. Catalisar este comportamento, torná-lo normal, rotineiro, para permitir que, de forma conjunta, mais empresas tenham acesso facilitado aos testes. E acelerar, por parte dos nossos parceiros, a aquisição e utilização de testes promissores, fáceis de administrar, com resultados rápidos e precisos. Nós continuamos a trabalhar em novas parcerias, a entrar em contacto com associações. O trabalho de sensibilização será sempre necessário.

A medicina, no geral, e a medicina no trabalho têm evoluído no bom sentido, mas historicamente não somos um país que aposta o suficiente no diagnóstico precoce e na prevenção. Considero, por isso, que o sucesso desta iniciativa começa porque mais decisores estão a encarnar um espírito semelhante ao que os nossos voluntários tiveram. Construir a mudança, e não só esperá-la. Encontrar força na força dos outros. Saber que toda a solução tem que começar em algum lugar. O que é preciso é pôr a máquina a funcionar.

 

E a máquina está a funcionar em www.testconnect.pt.

 

Entrevista HN/RA

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