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Maria Manuel Varela: “A hora de ouro é determinante no prognóstico do doente com sépsis”
O alerta é da Enfermeira Gestora da Unidade de Cuidados Intensivos do Hospital do Espirito Santo de Évora, Maria Manuel Varela. A especialista refere que por cada hora de atraso na administração de antibioterapia “apropriada a pessoas com sépsis grave ou choque séptico, há uma redução de 7,6% na probabilidade de sobrevivência”. Neste sentido, defende a importância da colaboração interdisciplinar entre médicos, enfermeiros e laboratório, pois “só dessa forma se consegue o exigido reconhecimento e tratamento correto precoce”.
HealthNews (HN)- Qual é o papel da enfermagem na gestão do doente com sépsis?
Maria Manuel Varela (MMV)- O papel da enfermagem na gestão do doente com sépsis é constante e fundamental desde a identificação de caso suspeito e/ou confirmado no Serviço de Urgência até ao internamento no Serviço de Medicina Intensiva.
A intervenção de enfermagem inicia-se de imediato no momento da triagem inicial no Serviço de Urgência, em que o enfermero efetua uma avaliação sistemática dos doentes que aí recorrem, no sentido de identificar casos suspeitos de doente com sépsis, através da aplicação de critérios de presunção de infeção.
Após a avaliação desses critérios e caso seja confirmada a suspeita de sépsis há algoritmos a cumprir escrupulosamente para dar resposta atempada e cabal à situação clÍnica do doente, pois sabemos que existe para a sépsis um conjunto de atitudes que, se realizadas numa fase precoce da doença, reduzem a morbimortalidade e têm um impacto favorável na sobrevida dos doentes.
Neste sentido, e com o objetivo de orientar a nossa pratica diária no tratamento destes doente,s a Surviving Sepsis Campaign emanou bundles de suporte, onde o enfermeiros tem um papel essencial na sua efetivação.
A primeira hora após confirmação do caso de sépsis, designada na literatura como “Golden Hour”, a hora de ouro é determinante no prognóstico destes doentes, pelo que é exigido que nessa hora sejam efetuados pelo enfermeiro procedimentos e exames microbiologicos (que incluam hemocultras) e administrados farmacos e fluidoterapia de acordo com a condição clÍnica do doente.
Saliento que por cada hora de atraso na administração de antibioterapia apropriada a pessoas com sépsis grave ou choque séptico, há uma redução de 7,6% na probabilidade de sobrevivência.
No serviço de Medicina Intensiva o enfermeiro mantém um papel ativo no que concerne ao tratamento destes doentes inserido na equipa multidisciplinar agindo de acordo com a evolução da doença e as necessidades de cuidados diários de enfermagem.
De acordo com o que mencionei julgo ser evidente que em todo o percurso do doente com sépsis no hospital, o enfermeiro é uma figura ativa com um papel de destaque na abordagem destes doentes.
HN- Qual é a sua experiência e participação na via verde da Sépsis?
MMV- No Hospital do Espirito Santo de Évora onde desempenho funções não se encontra ativa a Via Verde Sepsis, contudo com a criação do Centro de Responsabilidade Integrada do Serviço de Urgência e Medicina Intensiva no qual integro o Conselho de Gestão, e percebendo a lacuna exixtente nessa área, está planeada a sua ativação para este mês de maio.
Estamos na fase de aplicação de critérios de presunção de infeção para perceber que percentagem de doentes que acorre ao Serviço de urgência se enquadram nos critérios de ativação da via verde, para posteriormente podermos planear de forma efetiva as estratégias de intervenção de acordo com a afluência de doentes.
HN- Porque é importante a colaboração interdisciplinar e a comunicação entre os médicos, a enfermagem e o laboratório na gestão de pacientes com suspeita de sépsis?
MMV- Não só é importante como é fundamental a colaboração interdisciplinar e comunicação entre médicos, enfermeiros e laboratório pois só dessa forma se consegue o exigido reconhecimento e tratamento correto precoce, nas primeiras horas após o desenvolvimento do quadro séptico melhorando os resultados tanto a curto como a médio e a longo prazo.
Para se conseguir essa intervenção precoce é fundamental agilizar e padronizar a abordagem destes doentes, de forma a garantir uma resposta rápida e adequada que só é conseguida com o envolvimento das equipas médicas e de enfermagem e a agilidade do laboratório para disponibilizar rapidamente resultados analiticos e das culturas efetuadas que são determinantes no tratamento destes doentes.
HN- O que é uma hemocultura e qual é a sua importância na gestão de doentes com suspeita de sépsis?
MMV- A hemocultura é um exame que se baseia na determinação de microrganismos na corrente sanguínea de doentes com suspeita de um quadro infeccioso. É efetuada através do uso de meios de cultura específicos, identificando a bacteria, ou fungos causadores da patologia e concomitantemente orienta para a antibioterapia a que os mesmos são sensiveis ou resistentes.
A hemocultura na gestão da sepsis é fundamental, pois permite identificar o agente causador da doença e dirigir o tratamento adequado ao microorganismo isolado.
Deve ser realizada na primenra hora após o caso confirmado de sepsis e antes da administração do antibiótico para que este possa ser administrado na primeira hora e não atrase a primeira toma do mesmo, mesmo que posteriormente seja necessario modificar a antibioterapia instituida de acordo com o resultado da hemocultura.
HN- Como e quando deve ser feita uma hemocultura?
MMV- As hemoculturas são efetuadas quando há sinais ou sintomas que indiciem um processo infecioso. Podendo ser acompanhado por alteração de valores analiticos.
As hemoculturas devem ser efetuadas sempre de acordo com a norma institucional existente, contudo em geral, evitar colher hemoculturas isoladas, deve ser feita uma hemocultura por cada punção, usar técnica assética no processo de colheita, o volume da amostra deve ser o adequado ao frasco de colheita os quais devem ser colocados na estufa o mais rápido possível e ter em atenção a rotulagem dos frascos.
Sempre que possível fazer as colheitas antes do início da terapêutica antibiótica.
A colheita de hemoculturas não deve ser condicionada pela existência de pico febril.
Em suma, aconselho sempre a ler atentamente as normas institucionais, pois estas espelham as boas práticas e orientam de forma clara o procedimento de colheita.
HN- Que impacto tem a recolha e gestão das hemoculturas no diagnóstico de bacteremia ou septicemia?
MMV- O impacto é muito consideravel pelo que estas devem ser corretamente efetuadas para que traduzam resultados fiaveis e clinicamente relevantes. Uma recolha e gestão de hemoculturas incorreta pode ser a diferença entre instituir ou não um tratamento adequado que pode condicionar o prognóstico desse doente.
HN- Será que os enfermeiros recebem formação contínua suficiente nesta prática? Como pensa que a adoção de boas práticas na recolha e gestão das hemoculturas poderia ser melhorada?
MMV- Julgo que há lacunas na formação dos enfermeiros relativamente a essa prática.
Normalmente são emanadas normas dos grupos de coordenação regional e local do Programa de Prevenção e Controlo de Infeções e de Resistência aos Antimicrobianos que orientam as práticas nestes procedimentos, contudo reconheço que há algum desconhecimento dessas normas por parte dos profissionais de enfermagem.
Estas normas que indiciam as boas praticas em meu entender deviam integrar o plano de formação em serviço e serem divulgadas pelos gestores dos serviços e pelos elementos dinamizadores do GCL-PPCIRA .
Por último julgo que efetuar auditorias ao procedimento e aos resultados das hemoculturas é outra forma de identificar pontos de melhoria a serem discutidos em equipa multidisciplinar, numa optica de melhoria continua da qualidade.
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