Ao contrário das células normais, as células do cancro do pulmão têm uma particularidade negativa ao disseminarem-se para outras partes do organismo com uma evolução bastante rápida. De acordo com o diretor do Serviço de Pneumologia do Centro Hospitalar Universitário de São João, Professor Venceslau Hespanhol, “o cancro do pulmão tem como caraterística metastizar com muita frequência”, no cérebro. O especialista alerta que os doentes com CPNPC ALK+ positivo “têm uma tendência especial para metastização precoce”, defendendo, assim, a aposta em terapêuticas-alvo.
HealthNews (HN)- O cancro do pulmão continua a ser a principal causa de morte por cancro a nível mundial e nacional. O facto de a maioria dos casos serem diagnosticados tardiamente explica a gravidade do prognóstico e as elevadas taxas de mortalidade?
Venceslau Hespanhol (VH)- Provavelmente explica na maioria dos casos… Como é evidente, o tumor avançado é muito mais difícil de tratar do que um tumor numa situação mais precoce. Por outro lado, biologicamente o cancro do pulmão é muito agressivo. Há formas deste tipo de cancro com uma evolução muito rápida. Portanto, a própria natureza do tumor em si é uma característica negativa.
A razão por que há muitos cancros avançados tem a ver com o facto de se desenvolver silenciosamente durante muitos anos. O que verificamos muitas vezes é que a doença acelera a determinada altura, tornando-se mais difícil de controlar.
HN- O Cancro do pulmão de não pequenas células (CPNPC) é o tipo de cancro mais frequente, sendo que 5% dos doentes sofrem uma alteração no ADN que afeta um gene denominado cinase do linfoma anaplásico (ALK). Quando e como se deve investigar a presença de rearranjos do ALK?
VH- Fazemos essa pesquisa automaticamente a todos os doentes, mesmo aos doentes cirúrgicos que não têm histologia escamosa. É uma espécie de avaliação reflexa. Utilizamos sequenciação de nova geração em que avaliamos translocações do ALK.
HN- Tal como referiu, as evidências científicas apontam que a mutação do gene ALK parece apresentar um risco aumentado de desenvolver metástases cerebrais e hepáticas. Qual a importância da identificação de metastização cerebral do cancro do pulmão?
VH- O cancro do pulmão tem como caraterística metastizar com muita frequência para os ossos, para o cérebro e para o fígado. Quando falamos do cancro do pulmão falamos de muitas realidades diferentes…. Os doentes com ALK positivo têm uma tendência especial para metastização precoce. Estamos a falar de doentes avançados e que não podem ser tratados com tratamento local, nomeadamente com cirurgia. Por este motivo utilizamos preferencialmente tratamentos-alvo que sejam ativos, também, no sistema nervoso central.
HN- Qual o impacto que as metástases cerebrais têm na qualidade de vida e na sobrevivência dos doentes com CPNPC ALK+?
VH- As metástases cerebrais podem inviabilizar a qualidade de vida dos doentes. Nunca sabemos se as conseguimos controlar. O que se faz usualmente é radioterapia e corticoterapia, mas muitas vezes podemos não conseguir controlar as metástases e o doente acabar por falecer. Portanto, o ideal é que não se desenvolvam.
HN- Apesar dos avanços na compreensão científica do CPNPC ALK+ terem resultado num aumento do tempo de sobrevivência, não tem sido possível assegurar a cura da doença, sobretudo, porque durante o tratamento os doentes desenvolvem resistências. Do seu ponto de vista o que é necessário para conseguir melhorar a qualidade de vida dos doentes?
VH- Os tratamentos em que o perfil de tolerância é melhor e que tem mais taxa de resposta são aqueles que melhoram a qualidade de vida. O que é preciso encontrar é, nomeadamente mais tratamentos dirigidos. É preciso utilizar medicina de precisão, como são os inibidores do ALK, e melhorar ainda mais a capacidade de Imunoterapia no controlo de evolução da doença. Se conseguirmos fazer isto, muito provavelmente a qualidade de via dos doentes vai melhorar.
HN- Conhecem-se números de prevalência do cancro do pulmão de não-pequenas células ALK-positivo em Portugal?
VH- Não dispomos o número de doentes com CPNPC ALK+. Sabemos que em Portugal temos mais de cinco mil novos casos por ano de cancro do pulmão. Estes números têm vindo a aumentar.
Entrevista de Vaishaly Camões
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